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segunda-feira, 13 de dezembro de 2004

Normalidades democráticas

Há quatro meses apenas, o Senhor Presidente da República, com muitas ou poucas mas com dúvidas, no exercício da ampla faculdade discricionária que constitucionalmente detém, achou que a personagem que a maioria parlamentar lhe estava a propor para substituir aquele que, virtualmente à frente do Governo, se encontrava (há muito?) em trânsito para Bruxelas, era sim senhor competente para o exercício do cargo de chefe do Executivo. E nomeou-o. O próprio, então ocupado com a Câmara de Lisboa, também achou que tinha propensão para o ser. E aceitou o encargo jurando cumprir com lealdade as funções em que foi inopinadamente investido. Acharam também que sim os pelos vistos essenciais e omnicientes empresários, designadamente os do sector financeiro que sentenciaram que era fundamental para o Pais garantir a continuidade dessa coisa considerada de comum essencial para o desenvolvimento de qualquer nação e que dá pelo estafado nome de estabilidade. Apesar de acharem que não a maioria dos conselheiros de Estado e os muitos e muito sábios, omnipresentes, isentos e oraculares analistas e comentadores da nossa praça. E achou também que não, naturalmente, todo o arco formado pelos partidos da oposição. Até o Dr. Manuel Monteiro, esse líder tão representantivo e proporcionadamente procurado pela comunicação social, achou que não. A decisão do Senhor Presidente, fez partir, amargurado, o líder do principal partido da oposição que assim se terá visto desqualificado como putativo candidato a chefe do Governo.
Quatro mesitos volvidos - quatro! - o Senhor Presidente passou a achar que não. E com ele todos os que antes acharam que sim. Com excepção, claro está, dos partidos da maioria. Acham agora que o primeiro-ministro e os ministros que o Presidente nomeou e que à sua frente juraram a pés juntos que cumpririam com lealdade as funções que lhes eram ali confiadas - apesar de ser visivel que alguns não sabiam bem que funções lhes estavam a ser confiadas, logo, sobre o que estavam a jurar... - , mostraram em plena acção que ele, Presidente, estava redondamente enganado quando achou que sim. E vai de antecipar o fim da legislatura e convocar o Povo, suspeitando que o Povo, como ele, também se enganou quando fez nascer esta maioria. E que o primeiro-ministro e os ministros só fizeram mer, perdão, disparates. Por isso devem ser rapidamente alternados. Não inspiram confiança e atentam contra a estabilidade.
Agora, mesmo sendo assim, nada obsta a que o parlamento moribundo aprove o orçamento onde repousa o essencial das políticas governamentais. E é conveniente que, apesar de incompetente e dado ao disparate, o Governo conduza o País até eleições. Em plenitude de funções, como convém à estabilidade.
Mas o primeiro-ministro acha que não. Que o juramento que fez há quatro meses não o obriga a tanto. E demite-se com o governo. Fica em gestão dois meses, governando incompetente mas limitadamente.
Quem é o maluco que diz que não funcionam as instituições e que se recomenda mais uma revisão da Constituição? Quem tem o topete de dizer que não se assegurou em dez escassos dias a normalidade democrática? É preciso ter lata...

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