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quinta-feira, 19 de maio de 2005

Os maus resultados de Matemática e de Português

Com os exames em curso, lá volta o tema.
Fui, já lá vão bastantes anos, professor de cálculo financeiro, disciplina que exige uma sólida preparação matemática.
Verificando as dificuldades dos alunos, procurei saber as causas.
A Matemática, na sua formulação algébrica, é uma linguagem simbólica: traduz-se em transformar a linguagem corrente em símbolos e, depois, operar com eles.
A transformação em símbolos algébricos da linguagem corrente, oral ou escrita, por exemplo, na equacionação de um problema, não é possível, se o aluno não compreender essa mesma linguagem, isto é, se não a souber decompor e distinguir nos seus diversos elementos.
Sem isso, nunca conseguirá navegar na matemática.
Concluí assim que a principal dificuldade dos alunos advinha, pasme-se, de não saberem ou dominarem mal o português!...
Por isso, ao propor, oralmente ou por escrito, qualquer exercício, a primeira coisa que passei a exigir aos alunos era aquilo que, no tempo em que aprendi, se chamava divisão das orações.(Agora, se esta prática não for ainda anti-pedagógica, terá, pela certa, nome bem mais complexo!...)
Dividida a oração, obrigava os alunos a saberem onde estava o sujeito, o predicado, os complementos, etc, etc. (Julgo que a esses conceitos correspondem agora outras palavras, como sintagma verbal para o predicado, entre muitas igualmente eruditas!...)
Chegados a este ponto, mandava traduzir em símbolos matemáticos as diversas orações, ligando os elementos conhecidos com aqueles que se pretendia conhecer, as incógnitas.
A colocação de um problema em equação, por exemplo, tornava-se assim razoavelmente simples.
Às regras da operativa matemática dava semelhante tratamento.
Confesso que os resultados me espantaram!...
O problema não estava na Matemática, mas no Português.
Por isso, não me causa qualquer espanto que os maus resultados de matemática andem associados aos de português.
Sendo inevitável que assim seja, aqui deixo uma leve sugestão: aponte-se para o que é básico e ensine-se bem português, para que os alunos comecem por saber e compreender português, para poderem compreender e saber matemática!...

2 comentários:

Isa Maria disse...

Interessante a sua lição, Sr.Professor. Tivesse tido um profesor como você, que se interessa pelas dificuldades dos alunos, e não teria tido, concerteza, as dificuldades que tive a matemática, nalgumas matérias.

Massano Cardoso disse...

A sua análise fez-me recordar um episódio com um aluno meu, já lá vão alguns anos. Regia então, também, uma disciplina do 1º ano da licenciatura em Medicina. Ao ler o ponto de exame do aluno fiquei em estado de choque. Não percebia nada do que lá estava e eram algumas páginas. Como não compreendia o raio da escrita (a grafia era legível), levei o aluno à oral. Fiz-lhe as mesmas perguntas do ponto teórico. E o aluno, com um à vontade de espantar, falou, falou e até nem falou mal. Perguntei-lhe se ele sabia o que tinha escrito. Confrontei-o com a disparidade entre a expressão oral e a escrita. Perguntei-lhe se tinha tido, no secundário, a disciplina de português e quais os autores portugueses que tinha lido. Respondeu que tinha tido “Português”, mas, no tocante a ler autores portugueses não tinha tido oportunidade, a não ser alguns trechos de colectâneas… Depois de mais umas perguntas, terminei o exame dizendo ao aluno que tinha passado. Quando ia a sair, voltou-se e fez a seguinte pergunta: - Senhor professor! Podia indicar-me um autor português para começar a ler? Fiquei estupefacto pela pergunta formulada de forma sincera. Respondi-lhe: - Olhe, comece pelo Júlio Dinis. Foi por onde eu comecei. Respondeu-me: – Muito obrigado! E de imediato abandonou a sala de exame.
Ah! As aulas não eram de matemática, eram de medicina.