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quarta-feira, 18 de janeiro de 2006

Índice Robin Hood

O estudo recentemente publicado sobre as desigualdades dos rendimentos, entre os mais ricos e os mais pobres, nos diferentes países da União Europeia, coloca Portugal numa situação verdadeiramente desconfortável já que o fosso ricos-pobres está a alargar-se de ano para ano. Se somarmos estes dados aos cerca de 2 milhões de portugueses que têm um rendimento inferior a 350 euros por mês ficamos com uma ideia muito precisa do que está a acontecer na nossa sociedade.
As implicações destes dados traduzem-se a diferentes níveis, dos quais destacamos a saúde.
A emergência da epidemiologia social, há alguns anos, permitiu analisar a saúde e a doença numa perspectiva diferente da habitual. As comunidades mais ricas são geralmente mais saudáveis. Todos concordarão com esta afirmação. No entanto as razões prendem-se não com o facto de haver diferenças no acesso aos cuidados de saúde ou na qualidade dos tratamentos, mas sim com os comportamentos e estilos de vida dos mais pobres. Estes são mais obesos, bebem mais, fumam mais, vivem em áreas mais violentas e poluídas, têm menos acesso aos confortos, sentem mais na pele o facto de não terem os mesmos níveis de bem-estar dos mais favorecidos, sendo, inclusive, massacrados com os estereótipos das individualidades de referência social, enfim são de facto mais pobres e fazem-nos sentir isso mesmo, o que é manifestamente mau. Deste modo, sempre que o gradiente socio-económico aumenta é de esperar agravamento do estado de saúde dos menos favorecidos (medido pelo índice Robin Hood). Não é por acaso que a esperança de vida é mais baixa e que a mortalidade por diversas doenças, desde as cardiovasculares passando pelas tumorais atingem valores elevados nesta importante fatia da comunidade. Ora aumentando o gradiente socio-económico em Portugal é de esperar um agravamento da saúde dos nossos compatriotas. Os mais favorecidos conseguem controlar melhor os factores de risco que põem em causa a sua saúde, assim como conseguem manter os factores que a promovem. Nos pobres é precisamente o contrário. Como estes estão a aumentar – o conceito de pobreza relativa é muito importante – e os seus rendimentos estão a diminuir face aos que ganham mais, então é de esperar um agravamento do estado de saúde do país. O problema de acesso aos cuidados de saúde, assim como a realização de exames, mesmos os mais sofisticados, não vão resolver o problema, além de constituírem um factor de agravamento em matéria de financiamento da saúde, que já é muito preocupante.
Em termos sociais o investimento público do qual resulte bem-estar para todos, mas sobretudo para os mais desfavorecidos permitindo-lhes mais rendimentos e aquisição de comportamentos mais saudáveis diminui de uma forma acelerada à medida que os mais favorecidos se afastam dos mais pobres. Aqueles desviam os seus rendimentos para o seu próprio bem-estar: seguros de saúde, condomínios fechados, escolas privadas, águas engarrafadas, enfim todo um conjunto de conforto virado para o seu próprio bem-estar deixando de investir no bem comum. Esta recusa de investimento começa a verificar-se em muitos países em que o status socio-económico se vai alargando. Portugal face aos últimos dados comporta-se como um desses países em que o fosso se alarga de ano para ano. Sendo assim, é de prever um agravamento substancial do estado de saúde que não se conseguirá travar com as medidas de apoio e cobertura médicas ciclicamente anunciadas. Longe disso, se quisermos dar saúde aos portugueses a solução passa não só por um acesso universal aos cuidados – que já é um dado adquirido – mas sim através de uma diminuição das desigualdades dos rendimentos, um maior investimento público nos instrumentos sociais, assim como um controlo dos agentes stressógenos de origem social que fazem sentir mais pobres os que efectivamente já o são.
Aumentando os rendimentos de um povo permitiria de uma cajadada eliminar ou reduzir um sem número de doenças que nos atormentam a toda a hora.

9 comentários:

Tonibler disse...

Tenho tanto para discordar que o convido a ir ao Tonibler para ler (daqui a um bocado porque é muito...)

Carlos Monteiro disse...

Já está ou não Toni? É que já lá vai quase uma hora...

Elisiário Figueiredo disse...

Completamente de acordo, este post não vinha mais a propósito, acabei de chegar das urgências de um Hospital SA onde estive 8 horas, deu para ver de tudo, percorri duas especialidades deu para reparar que aquele hospital, que já foi publico, se transformou em algo que eu não entendo, mas enfim, dá lucro é o que interessa......

Tonibler disse...

Camarada Elisário,

Não existem Hospitais SA. O que existem são Hospitais EP, porque o patrão daquilo continua a ser o meu amigo e continua a ser um mãos largas...

Elisiário Figueiredo disse...

Tonibler

SA ou EP, o que você quiser, mudou-se o nome a é a mesma!

Tonibler disse...

Elisário,

Os SA funcionam. Os SA mesmo, aqueles em que o patrão não sou eu e que funcionam em Badajoz e em Vigo.

Carlos Monteiro disse...

Ou ali na CUF. Claro que funcionam. Eu até sei quanto custa para os por a funcionar!

Elisiário Figueiredo disse...

Nunca pensei que uma gafe minha, SA/EP, pusesse os amigos a discutir o acessório deixando para trás aquilo que na realidade Massano Cardoso transmite neste post.

Anthrax disse...

Estão a ver porque é que bom ter um seguro de saúde... assim podemos ir à CUF e ser bem atendidos. É claro que se tem de pagar uma taxa, mas não se podem fazer omoletes sem partir ovos, não é?

A parte que ainda não percebi é porque é que tenho de continuar a pagar para o sistema de saúde do Estado...

De resto eu até estou parcialmente de acordo com o Prof. MC. É função do estado olhar pelos desfavorecidos (que à velocidade a que isto está a andar qualquer dia somos todos), não é a minha. E neste momento o meu indíce de confiança no estado (e nas suas funções) é = a 0, por isso não acho que lhe deva alguma coisa. Se o estado não respeita os seus cidadãos, porque deverão estes respeitar o estado?

Todas as políticas que o estado tem seguido, apostam na destruição total da classe média, apostam na destruição total das PME's. Não têm uma estratégia para o futuro que seja construtiva, têm um discurso apocalíptico e desmotivam as pessoas ao ponto de se tornarem apáticas. As pessoas não querem saber da política e muito menos dos políticos.

Ontem quis ir jantar ao Hard Rock e fiquei deveras chocado com o que vi. Dos 2 lados da av. da Liberdade - e ao longo da mesma - estavam os "mitrinhas" (a.k.a "agarradinhos", tá a ver Prof, ora aqui estão dois rótulos), de 5 em 5 metros a arrumar carros. Eu achei este cenário aterrador. Da mesma maneira que é aterrador, o cenário ao qual tem de assistir cada vez que se vai ao cinema, ao Monumental, à noite.

E atenção, não digo que são cenários aterradores no sentido em que aquelas pessoas não têm o direito de existir. O cenário é aterrador porque eles são imensos. Há cada vez mais gente nas ruas e não se vê nada a ser feito para contrariar a tendência. Logo, onde é que está o estado e o que é que "ele" anda a fazer com o dinheiro dos meus impostos? Porque acção social não é de certeza.

A sério, eu qualquer dia mudo-me.