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quinta-feira, 6 de julho de 2006

“Tudo deve ser comido no respectivo tempo”


O homem, e a mulher, é preciso ter cuidado com a língua nos dias que correm, passam a maior parte da vida num estado de excepção, ou seja num progressivo envelhecimento. Se olharmos para as outras espécies verificamos que a partir do momento em que se reproduzem “deixam” de ter utilidade. De um modo geral predomina a sobrevivência da espécie face ao indivíduo. No nosso caso ninguém quer desperdiçar esta fase, pelo contrário, queremos viver cada vez mais e melhor. Acontece que o homem precisa de códigos próprios para poder sobreviver e explorar o máximo possível da longevidade, que, como todos sabemos, se acompanha da perda de algumas qualidades e potencialidades. Os códigos de conduta são importantes, sem sombra de dúvida. A vivência das virtudes é uma das consequências. Acontece que à medida que vamos ficando mais velhos, mais nos arrependemos de não termos tirado mais “prazer” da vida. A palavra prazer foi colocada entre aspas por motivos óbvios, já que tem um alcance muito vasto.
Um estudo recente revela que a escolha do trabalho (o dito trabalho excessivo, louco, praticado por muitos) ao contrário da opção pela diversão leva, mais tarde, ao arrependimento por não ter sido aproveitada em tempo oportuno. Esta conclusão fez-me recordar a avó da minha mulher que dizia o seguinte: “Tudo deve ser comido no respectivo tempo”. Sábia senhora! Paralelamente, o sentimento de culpa por ter caído em tentação vai diminuindo à medida que o ser humano envelhece. É certo que a rendição aos desejos pode ser prejudicial e perigosa para a saúde e bem-estar, mas o excesso de controlo e de hipermetropia podem ser fontes de problemas a longo prazo. Quanto mais velhos menor o sentimento de culpa relativo às faltas cometidas em jovem. Muitos acabam por considerar ridículas as formas como entretanto se comportaram ou, então, esqueceram-se completamente. Ainda de acordo com o estudo, à medida que envelhecemos acabamos por “sentir saudades dos prazeres adiados”.
É curiosa a conclusão dos autores: “A curto prazo, o arrependimento pelo vício é maior que pela moral, mas a longo prazo a virtude causa mais arrependimento”.
Passar a maior parte da vida em permanente dieta e não tocar na sobremesa, ou adiar permanentemente a tal ambicionada viagem, constituem alguns exemplos, para não falar da tão famosa crise da meia-idade. Mas isso é uma outra história, embora este estudo não deixe de dar um contributo…

6 comentários:

Anónimo disse...

Muito interessante esta abordagem.
A dificuldade por vezes está em conciliar, no momento próprio, a possibilidade com o desejo.
Na idade em que mais se ambiciona, freneticamente, experimentar um pouco de tudo, é também, via de regra, quando se abatem sobre nós três fortes condicionamentos:
- a tutela parental;
- a escassez de meios; e, mais vagamente,
- a responsabilidade pelos estudos.
Mas, o prazer, o que nos dá prazer afinal?
Viajar, ler, exercitar o corpo (em sentido lato, incluindo o desporto), assistir a um espectáculo, praticar voluntariado, partilhar afectos …
Bem, aqui a resposta é definitivamente unipessoal. Não há experiências hedonistas universais. Haverá porventura tendências, modas, influências culturais e geracionais, etc.
Hoje, para os mais jovens, cada vez mais o prazer tem uma conotação radical, no sentido de estimular a adrenalina até ao limite. Este é um prazer intenso mas efémero.
O ser humano, porém, quanto mais tem mais deseja ter. A insatisfação (ou a ambição) é uma qualidade inerente à condição humana (e não necessariamente má se não se sobrepuser, em excesso, à vontade e à realidade).
Por isso, em meu entender, o verdadeiro desafio da vida é o jogo dos equilíbrios.
Saber tirar partido das situações possíveis, saborear os momentos simples e, acima de tudo, partilhar a alegria de viver com os que nos cercam, é o clímax do prazer, o auge de uma existência plena. Será assim tão difícil? É, se o futuro que não existe valer sempre mais do que o passado que se teve e o presente que se vive. Frequentemente o prazer (no sentido da alegria de viver) está ali tão perto, tão à mão de semear, que o nosso olhar distante não o consegue captar. Por isso, o sentido da atenção, o olhar desperto, é a qualidade que merece um treino mais intensivo, sob pena dos “prazeres” nos roçarem a pele sem que nós sintamos o mais ligeiro odor, ou uma pequena brisa que seja.

Massano Cardoso disse...

Caro Félix Esménio

Um excelente comentário. Valeu a pena escrever a nota para podermos apreciar a sua reflexão.

Carlos Monteiro disse...

baah...

RuiVasco disse...

Não haverá uma forma mais simples de olhar esta questão?
Saber e viver a vida em cada momento. Com o melhor que, em cada momento, a vida nos oferece?
Porque hei-de hoje olhar para o passado, desculpando ou culpabilizando-me pelo que fiz ou não? Porque hei-de ocupar-me e preocupar-me com o que hei-de fazer no tempo que há-de vir, perdendo assim, tantas vezes, o tempo de viver o presente?
Porque hei-de considerar efémero um prazer de alguém só porque ele, hoje, é feliz fazendo-o!
Porque hei-de estar sempre a fugir ao positivo que cada tempo tem, pensando no negativo que isso, porventura, vai provocar no tempo que vem e não sei se o terei?
Porque não hei-de apenas precupar-me em viver os valores melhores que herdei e fazer testamento deles aos que aqui deixarei? Para que os vivam no seu tempo e à moda do seu tempo! Isso sim, vale a pena: cultivar os valores de cada tempo e ensinar os próximos a adaptá-los aos seus tempos! Sei lá se é viajar, ler...comer? Cada tempo trará sua resposta. E nada assim será fora de tempo!
Vivamos cada momento.

E exercitar o corpo, Esménio, segundo a sua opinião unipessoal, claro! No sentido lato! Para alem do desporto...que acho é mais de sentido restrito! As nossas concordâncias, de que lhe falhei noutro post e noutro tempo, aproximam-se!

Massano Cardoso disse...

Mais dois excelentes comentários. O do RuiVasco e do cmonteiro! Continuem...

Anthrax disse...

«Carpe Diem»

Sabe o que é que eu acho fabuloso nos seus posts caro professor?

O facto de me fazerem sentir bem, mesmo que não tenha comentários para fazer (até porque falar, só por falar é, na minha óptica, uma grande asneira).

Bem haja.