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domingo, 12 de novembro de 2006

“Forma de valorizar o serviço de quem o usa”! …

Tenho seguido com alguma atenção a problemática das taxas “penalizadoras” aos que necessitam de hospitalização ou tenham de se sujeitar a cirurgia ambulatória. Diz o ministro, para justificar a medida, que é uma “forma de valorizar o serviço de quem o usa”. A taxa de cinco euros por dia “não paga três quartos sequer de uma só refeição no hospital”. De facto, a receita a arrecadar não deverá ultrapassar os nove milhões de euros o que, na sua douta perspectiva, é suficiente para tratar dois mil novos casos de cancro por ano. Por outro lado, o senhor ministro garante que 5,5 milhões de portugueses estarão isentos das referidas taxas.
O debate que se tem observado a este propósito define dois tipos de condutas: os que vêem nestas medidas um atentado ao estado social, com as consequências daí decorrentes, e os que, numa visão liberal, apontam para a necessidade de co-financiamento do SNS, porque só há duas maneiras de resolver o problema: ou “corta-se no serviço ou as pessoas têm que começar a pagar”.
Na minha opinião, não concordo com a visão dicotómica dos que defendem uma co-comparticipação do financiamento do SNS por parte dos cidadãos que aufiram determinados rendimentos, como alguém já afirmou, por exemplo, acima dos 500 euros. A frase “o que são 35 euros para alguém que ganhe 500 euros mensais”? Respondo: - Corresponde a muito, porque uma enorme fatia de portugueses recebe valores dessa ordem de grandeza e que, ao tornarem-se doentes, vão receber ainda menos, sem falar das grandes dificuldades em sobreviver com aqueles quantitativos, contribuindo desta feita par um mal-estar e tristeza que se propagam a uma velocidade impensável, alargando as assimetrias sociais.
Não vejo como o senhor ministro da saúde vai proceder relativamente aos 5,5 milhões de portugueses, que estarão isentos das referidas taxas, quanto à melhor maneira de valorizarem os serviços que usam! Será que já os valorizam? Não creio! Quanto às alternativas de “ou pagam mais ou corta-se na prestação dos serviços”, visão radicalista, podemos contrapor com outra solução que passa pela prevenção e educação na área da saúde. Não podemos ignorar que oitenta por cento da patologia humana resulta de “erros comportamentais e agressões ambientais”. Sendo assim, uma política dirigida para estas áreas, faz todo o sentido. Claro que os resultados não surgem em quatro anos, mas que dão resultados, lá isso dão.
Não consigo compreender a justificação do senhor ministro, segundo a qual aqueles sete a nove milhões de euros vão ser muito úteis para tratar dois mil novos casos de cancro! Meu Deus! Seria melhor que deitasse cá para fora, por exemplo, a “lei do tabaco” e não se rendesse às pressões dos interesses instalados, porque desta forma evitaria milhares de cancros e não teria que gastar dinheiro no tratamento. “À borla, ou grátis, como dizem os gatos fedorentos”…
A saúde vai converter-se na mais rentável área de negócio deste país, contrariando uma das últimas fronteiras do estado social. Tudo é passível de negócio, infelizmente, até a própria vida…

5 comentários:

Carlos Monteiro disse...

Isto é um grande post caro Professor. E de cada vez que me lembro da entrevista do ministro na RTP, qual pedinte, a dizer "eu só quero que contribuam com qualquer coisinha!" lembro-me da minha condição de contribuinte e dá-me vontade de lhes pedir também "eu só quero que haja qualquer coisinha que eu não tenha que pagar duas vezes!".

RuiVasco disse...

Caro prof Massano:
( aproveitando o seu post para um assunto diferente - ligado à saude e menos administrativo!)

Os seus ultimos posts sobre as doenças cerebrais e a o mal de Alzheimer parecem ter surtido efeito, ou então tem grande influências nos OCS!!!!
Amanha à noite a RTP fará um grande debate, pelos menos será um alerta para estas questoes, no seu programa Pros e Contras- As doenças emergentes, com a presença de diversos medicos e doentes. O 4R já marca a agenda politica, ou pelo menos a televisiva? Espero que seja um espaço para tomada de consciencia de temas que o preocupam, e a todos nós, e que o prof. aqui tem trazido com frequencia! Fico contente!)
Sem querer desvalorizar a questão, confesso que gostava mesmo era ver toda a gente, todo o mundo, principalmente as crianças e os mais velhos, com saúde, mesmo que tivesse de pagar mais 2 ou 3 euros...penalizadores ou moderadores! ( menos que um pacote de cigarros, e há quem fume 3 por dia!)

Massano Cardoso disse...

Caro RuiVasco

São muitos e variados os assuntos que merecem atenção por parte dos responsáveis. Fico satisfeito pela sua abordagem. Não me parece que o 4R tenha tido alguma influência, como é óbvio, na agenda em curso, mas não deixaremos de os abordar ou dar algum contributo, até, porque sendo um excelente espaço de reflexão, tem com alvo pessoas interessadas que podem amplificar a sua análise.

Quanto ao resto, a situação é complexa porque pode “degenerar” em situações nada agradáveis para a população. O problema de solidariedade é outro assunto que não pode ser confundido com princípios inerentes ao estado social.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Professor Massano Cardoso,

Parabéns pelo seu "post".
No domínio da saúde, como aliás em muitos outros, o País tem sido fustigado com o anúncio avulso de medidas, com justificações e objectivos avulso, destituídos muitas das vezes de consistência política e económica, e desinseridos de uma articulação com outros domínios políticos, como por exemplo o sistema fiscal.
O Ministro da Saúde nomeou ainda em 2005, se a memória não me falha, uma Comissão independente com a missão de reflectir sobre o modelo de financiamento do sistema público de saúde.
Penso, portanto, que a introdução das taxas "penalizadoras" deveria ter aguardado pelo resultado dos estudos da Comissão. É incompreensível o seu avanço. Mas a "tesouraria" poderá ser uma boa explicação.
Não se chega a perceber para que servem as taxas moderadoras: se são para moderar o recurso aos cuidados de saúde, se são para moderar os orçamentos dos hospitais, se...
Alguns princípios nos devem preocupar:
1º Que o sistema público de saúde deve ser eficiente, os custos de funcionamento e de investimento e a qualidade do serviço devem ser objecto de avaliação e efectivamente controlados.
2º Que todos os cidadãos devem ter acesso em tempo e em qualidade a serviços de saúde, seja por recurso a unidades do Estado, seja através de serviços privados, devidamente "regulados" pelo Estado.
3º Que o sistema fiscal e o sistema "utilizador-pagador" se conjuguem de modo a que o preço não seja pago duas vezes.
4º Que as pessoas carenciadas e pobres e de fracos recursos não sejam impedidas de recorrer aos cuidados de saúde porque não têm rendimento para os pagar.
Assim como a doença é universal – não escolhe quando nem como, não distingue entre ricos e pobres – a prestação de cuidados de saúde deve ser garantidamente universal.
Compete ao Estado encontrar o modelo de acesso e de financiamento que melhore assegure a prestação desses cuidados, tendo presente a preocupação da sustentabilidade social e económica de longo prazo.

Tonibler disse...

Não concordo nada com estas misturas "unânimes" entre a contribuição do utilizador e do contribuinte.

Se tem que haver dinheiro é para a saúde, para a educação e para a segurança/defesa. Para o resto, haverá ou não. Portanto, o ministro não me venha com "conversas da treta". Se não há dinheiro para internamentos, vendam-se os carros dos ministérios, corte-se nos salários, venda-se os edifícios, fechem-se as direcções gerais, etc... No dia em que os meus impostos não chegam para salvar vidas que podem ser salvas é hora de começar a fechar.