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terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

“A Vida Sexual”

Há dias, após ter participado num júri na Universidade do Porto, tirei o resto da tarde para vasculhar nalguns alfarrabistas e livrarias que, diga-se em abono da verdade, são de muita boa qualidade naquela cidade. O dia cinzento e chuvoso reforçou ainda mais o convite. Comprei mais uns bons exemplares. Um deles, “A Vida Sexual”, da autoria do prémio Nobel Egas Moniz, segunda edição, em muito bom estado, de 1904, foi uma das preciosidades. Nem hesitei, claro. Ao lê-lo – convém relembrar que na altura o escritor deveria rondar os trinta anos – fiquei deliciado com a qualidade e profundidade com que Egas Moniz se dedicou a tão interessante tema. É óbvio que algumas passagens transpiram um pouco do pensamento da época, mas, mesmo assim, descontando certos pormenores, o autor faz uma descrição e análise em linguagem escorreita e cativante, até para um leigo.
Associei a minha aquisição à notícia de hoje, no D.N., segundo a qual a “Educação Sexual continua ainda longe das escolas”. Continua e vai continuar!
Ao longo das últimas décadas tem sido feito muito esforço nesta matéria, mas a prática revela-se quase sempre inconclusiva. Ou seja, boas vontades não faltam, materializá-las é que se torna complicado.
Durante a minha passagem pela AR fui envolvido nesta temática e tentei, porque pensava que era óbvio, dar um contributo para resolver tão importante problema. Depressa verifiquei que não era simples, muito pelo contrário. Forças doutrinárias não “permitem” nem “toleram” que este assunto seja abordado. Na própria lei de bases da educação, que foi aprovada e depois vetada pelo Presidente Jorge Sampaio, um famoso artigo deu água pelas barbas, porque contemplava que as crianças e jovens deveriam ter educação sexual, embora com a ressalva, obedecendo a convenções internacionais, de que assistia o direito aos pais a recusa da mesma. Mas os opositores (internos da coligação, não a oposição propriamente dita) admitiam que fosse facultativa, ou seja, seriam os pais a requerer a educação sexual para os seus filhos. Foi muito dura a luta, com peripécias de vária ordem. Acabou por vencer a posição inicial, mas, posteriormente, o veto presidencial acabou por ajudar os opositores.
Recordo-me de um dia, no final da reunião com várias associações de pais, onde fui criticado de forma inesperada e despudorada, um dos responsáveis ter dito o seguinte: - Sabe senhor professor (até dispensou o tratamento de deputado a que tinha direito), nestas coisas de sexo só o pai é que deve falar com o filho e a mãe com a filha!
Existem fortes movimentos doutrinários e filosóficos que têm como objectivo impedir a educação sexual nas escolas. É um facto. Tive a oportunidade de o verificar. Lamentável, porque traduz uma total falta de tolerância.
Ao ler “A Vida Sexual”, logo nas primeiras páginas, ao falar de crenças e do seu papel, é possível verificar que as suas influências ainda se fazem sentir, apesar de toda a evolução entretanto verificada. O autor cita S. Paulo e São Jerónimo. Segundo o primeiro, “as mulheres devem ser submetidas aos maridos, a mulher deve temer o homem”, já São Jerónimo, mais atrevido, afirmou o seguinte: “a mulher é a porta de Satanás e o caminho da injustiça”! Quanto à frase de Proudhon: “chez les âmes d´élite, l´amour n´a pas d´organes”, Egas Moniz considera-a, e muito bem, falsa.
Lidar com a sexualidade é um tremendo incómodo para muitos. Convém relembrar que os dois motores da vida são precisamente a alimentação e a sexualidade. As regras a seguir deverão ser as mais adequadas à nossa condição de humanos, sem que ocorram “castrações” ou “jejuns” despropositados....

1 comentário:

Sandra disse...

Caro amigo,
Lendo por acaso este seu blog, apercebi-me de que tinha na sua posse um livro que procuro hà algum tempo. Poderia indicar-me por favor o sitio onde o comprou? No caso de estar interessado em vendê-lo, é favor indicar-me o preço.
Com os melhores cumprimentos.

sandrafontinha@hotmail.com