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domingo, 30 de setembro de 2007

Misteriosa calmaria


O fim-de-semana tinha tudo para agitar os media e a blogosfera.

No mundo da política, a notícia do Sol que, desafiando a lei, publica transcrições de escutas feitas na investigação do chamado processo Portucale que comprometem o actual Primeiro-Ministro, o Dr. Paulo Portas e outra figura do PP, o actual ministro da Administração Interna, Dr. Rui Pereira (putativo e então preferido candidato a PGR) e um assessor do anterior Presidente da República, numa conspiração palaciana, com umas lojas pelo meio, para acabar com o mandato do então Procurador-Geral da República, o agora mais descansado Juiz Conselheiro Souto Moura. O assunto - que eu pensei que iria constituir uma bomba - não mereceu mais do que muito cautelosas referências aqui e ali, com a excepção desta nota blogosférica.
A rendição do Dr. Mendes pelo Dr. Menezes está a provocar, surpreendentemente, mais silêncios do que pronúncias.
E até os derbies futebolistas de ontem no Porto e em Lisboa não despertam as habituais paixões.

Curioso. Sobretudo quando tudo acontece num fim-de-semana chuvoso, sempre propício ao exercício de teclado...

sábado, 29 de setembro de 2007

Um comentário que diz tudo!...

A propósito da diminuição dos impostos e do seu contínuo adiar até à criação de condições mais "favoráveis", regista-se o comentário de Ccz ao post do M. Frasquilho Uma história que tem tudo para acabar mal :
"...E então Deus (que é eterno) escondeu a face entre mãos, em forma de concha, começou a chorar e disse: "Oh! Nunca verei esse dia!"..."
CCZ

Assistência religiosa nos hospitais

"...Resumindo, este governo está nítidamente empenhado em nos retirar os proventos, a saúde, a educação e, por fim, nem nos deixa morrer em paz...".
Bartolomeu, em comentário ao post Requerimento

Parabéns!...



114 anos de vida gloriosa! Parabéns pelo aniversário!

sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Requerimento

Segundo noticiado, o Governo pretende burocratizar a assistência religiosa nos Hospitais e os doentes que a pretenderem terão que requerer a assistência religiosa, não o podendo fazer através de médicos ou enfermeiros. Aqui deixo uma ajuda aos doentes internados nos hospitais públicos, de forma a cumprirem as regras ministerialmente estabelecidas.
Requerimento
Exmo Senhor Presidente do Conselho de Administração do Hospital João Semana:

João Enfermo, de 90 anos de idade, Nº Contribuinte 111111111, Utente do Serviço Nacional de Saúde nº 0000000, portador do BI 01010101 do A.I. de Lisboa, nascido a 00/00/00, no lugar de A, freguesia de B, concelho de C, filho de Francisco Enfermo e de Joana Enferma, doente no Serviço de Gastro do Hospital João Semana, padecendo das doenças discriminadas em Anexo, conforme Certidão passada pelo Centro de Saúde e confirmada pelos Serviços Hospitalares a que V.Excia dignamente preside, com o devido selo branco aposto pela Secretaria, estando em seu perfeito juízo, como atestado pelo Serviço de Psiquiatria do Hospital, também conforme certificado anexo junto, vem, nos termos da lei, requerer a V. Excia se digne conferir-lhe o privilégio de assistência religiosa. Mais atesta que o faz no pleno uso das suas faculdades, não pressionado pela família, médicos ou enfermeiros.
Respeitosamente,
Pede deferimento em tempo útil
A Bem da Nação e do Estado burocrata e laico
28.09.07
João Enfermo
(Enviado, com 2 Anexos, por carta registada com aviso de recepção)

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Uma história que tem tudo para acabar mal

De acordo com o reporte dos défices excessivos hoje dado a conhecer pelo INE, o défice público de 2007 deverá situar-se em 3.3% do PIB. Até aqui, nenhuma novidade: o Governo já em Março passado tinha actualizado a projecção do défice para este ano, dos anteriores 3.7%. Só que, como o défice de 2006 foi de 3.9% (em vez dos 4.6% previstos originalmente), feitas as contas, o défice de 2007 devia ter sido reduzido para 3%...

Mas há mais: em relação ao reporte dos défices excessivos anterior, o défice de 2007 é reduzido em EUR 563.3 milhões. O que é positivo.

Mas destes reportes é possível extrair muito pouca informação: temos os valores do défice global das Administrações Públicas, e dos subsectores da Administração Central, Administração Local e Segurança Social, a dívida pública, o PIB, os juros da divida pública e o investimento público.
Nada sobre os valores das outras parcelas da despesa pública, nem qualquer informação sobre a receita.

Porém, há um dado que é indesmentível: projecta-se, agora, que o investimento público caia 7.3% em 2007 face a 2006, depois de quedas de 2.3% e 18.3% em 2005 e 2006. E pior: que desça EUR 329.4 milhões face ao valor anteriormente projectado!... Ou seja, mais de metade da queda do défice vai dever-se a um mais um corte brutal do investimento público.

E, de acordo com os dados que a Execução Orçamental do subsector Estado até Agosto deste ano revelou – e que tão bem o António Pinho Cardão já comentou – é lícito pensar-se que o remanescente da descida do défice será conseguido à custa da evolução da receita, pois previa-se que as receitas correntes do Estado aumentassem 1.6% – e elas estão a aumentar 10.4%; e previa também o Governo que as receitas totais do Estado crescessem 1.6% – e elas estão a crescer 10.1%.

Quanto à contribuição da despesa corrente primária, ela será nula… se não mesmo negativa para a redução do défice, pois quando se previa que a despesa corrente primária aumentasse 3.1% (o que já não era notável para o que precisávamos…), ela está a aumentar 3.7%, com as despesas com o pessoal e a aquisição de bens e serviços a crescerem muito acima do previsto…

Ou seja: a receita e o (corte) no investimento público serão os responsáveis pela redução do défice. A forma errada de proceder. Uma história em tudo parecida, ainda que numa escala inferior, ao que se passou ao tempo dos governos de Guterres. E, por isso, uma história que tem tudo para acabar mal.

Para mal dos nossos pecados.

Uma grande lição...

... a de Santana Lopes, ontem, na SIC Notícias ao abandonar a entrevista para a qual tinha sido convidado, na qual comentaria o actual estado de coisas no PSD, após ser interrompido para introduzir as imagens da chegada de Mourinho a Lisboa.
Ao contrário do que as explicações de Ricardo Costa e este comunicado querem fazer crer, estou certo que poucas serão as vezes em que, no futuro, isto voltará a acontecer. Na SIC ou em qualquer outra estação de televisão.
A creditar a Santana Lopes, com inteira justiça. E a fazer corar de vergonha figuras muito importantes da nossa vida política que, no passado, em situações similares, suportaram com naturalidade e sorriso nos lábios o desrespeito e a falta de consideração destes "critérios editoriais".

TAP contra Portela+1? A que propósito?

Li ontem notícia segundo a qual a TAP teria vindo agora ao terreno, pela voz do seu Presidente executivo, para “rejeitar" a solução "Portela + 1”.
Cabe aqui perguntar: mas quem encomendou este “sermão” ao Presidente executivo da TAP?
Que especial autoridade tem o Presidente executivo da TAP para vir rejeitar esta solução?
Porquê esta tomada de posição nesta altura em que o assunto parecia meio adormecido?
Será que vai ser reeditada toda a polémica em torno do malfadado projecto da OTA, que se considerava aparentemente (ou prematuramente) enterrado?
Tudo isto soa mal, conviria que fosse urgentemente esclarecido o que significa e que propósitos serve esta tomada de posição de um executivo da TAP em matéria que claramente transcende as suas funções.
Que o executivo da TAP tenha uma opinião pessoal sobre a matéria, com certeza, está no seu pleno direito.
Agora vir afirmar publicamente – e nesta altura - a rejeição do modelo "Portela+1" é que já me parece manifestamente um excesso de protagonismo dificilmente explicável...
Faria mais sentido – embora sem deixar de ser excessivo – que uma posição numa matéria desta natureza fosse tomada pelo Presidente não-executivo ou Chairman da TAP.
As perspectivas menos animadoras que neste momento podem vir a por em causa os cenários macro “cor de rosa” que até há pouco se alimentavam, serão susceptíveis de provocar um volte-face, inesperado para muitos, neste tormentoso dossier?
Pode estar a gerar-se por aí um estado de espírito propício ao lançamento forçado de obras públicas - obras e mais obras, novos “investimentos”, custem o que custarem...

O controle da receita!...

Noticiava ontem o DN que o Governo ia aumentar novamente para o ano os impostos sobre os combustíveis, uma das formas mais anestesiantes e fáceis de fazer receita. O preço do petróleo explicará os aumentos e a componente fiscal fica esquecida.
A necessidade crescente de mais receita é o maior desmentido à diminuição da despesa.
Não controlando a despesa pública, ao contrário do que propala e era seu dever e compromisso, o Governo mostra saber controlar muito bem a receita. Atirando, mais uma vez, para os cidadãos o ónus de financiar os erros e desperdícios que activamente promove.
Como de costume, brilhantes comentadores, professores e economistas darão o devido suporte à decisão governamental.

Passa ao outro senão chumbas...

Muitas e muitas coisas se têm visto e ouvido neste (mais um!) período de eleições no PSD.
A propósito disto, e também porque morreu hoje Magalhães Mota, protagonista de muitas lutas pela democracia e de outras tantas disputas dentro do então PPD, tive ocasião de, com alguns amigos, desfiar a memória de alguns factos políticos em que os dois maiores partidos protagonizaram a vida nacional e do que aconteceu quando cada um deles esteve na oposição. Apesar de não tendo tido tempo para precisar datas, vale a pena fazer aqui um pequeno voo rasante sobre esses acontecimentos.
Em 1986, Mário Soares deixou de ser Secretário Geral do PS, candidatou-se à Presidência da República e sucedeu-lhe Vítor Constâncio. Estava o PSD no poder depois de conquistada a 1ª maioria absoluta e as críticas permanentes acabaram por derrubar o líder da oposição, acusado de pouco eficaz e cinzentão, apesar da sua indiscutível preparação intelectual. Sucedeu-lhe Jorge Sampaio, que conheceu também as maiores dificuldades e que acabou por se candidatar à Câmara de Lisboa, sendo líder do PS. Já Guterres protagonizava as críticas internas, afirmando vezes sem conta que era ele a pessoa mais preparada para dirigir os destinos do partido e liderar a oposição à maioria laranja. No entanto, a turbulência interna não acalmou nem a sua verve reconhecida lhe grangeou fama de grande eficácia na oposição. Foi o tempo das Presidências Abertas e por fim da convocação do “Portugal que Futuro?.”
As eleições de 1995 deram a vitória por maioria simples ao PS e Guterres é nomeado 1º Ministro, iniciando-se um período de oposição do PSD.
Fernando Nogueira, várias vezes ministro e homem de grande respeitabilidade política, foi eleito líder mas, em pouco tempo, a insatisfação interna o acusava de fraco protagonismo, num tempo em que a "Razão e o Coração" socialistas davam pouca margem a propostas tentadoras por parte da alternativa ao poder. Marcelo Rebelo de Sousa sucede-lhe na liderança. Mas, apesar das duas vitórias nos referendos, acabou por desistir perante o fracasso, dentro do próprio partido e apesar de confirmada em dois congressos, da ideia de uma nova AD como alternativa para derrotar Guterres.
Durão Barroso eleito novo lider, teve sempre péssimas perspectivas como hipotético 1º Ministrro, “perdia” sempre os debates com Guterres e a guerrilha interna estava instalada, sempre com grandes emoções nos congressos. Ficou célebre a frase “Sei que vou ser 1º Ministro, só não sei quando”. Mas o Governo socialista demitiu-se na sequência da derrota nas autárquicas, e são convocadas eleições antecipadas, cerca de dois anos decorridos do 2º mandato.
Eleito 1º Ministro, o PSD volta ao poder, agora com Ferro Rodrigues a protagonizar a oposição socialista. Era opinião corrente e motivo de acesos comentários que o novo Secretário Geral “perdia” sempre os debates com o 1º Ministro Durão Barroso e que a oposição não era capaz de se afirmar mesmo perante um Governo que avançava medidas de sentido contrário às que Guterres prodigalizara. Mas, decorridos pouco mais de 2 anos de mandato, Durão Barroso assume a presidência da União Europeia e Santana Lopes lidera um Governo que só dura seis meses. O PS ganha as eleições de 2004 com maioria absoluta, pouco tempo depois da eleição do novo Secretário Geral José Sócrates.
Tudo visto, e depois de passados os turbulentos períodos de consolidação da democracia, quem é que se lembra de um líder da oposição ter conseguido afirmar-se como tal em pouco tempo, distinguindo-se pela eficácia fulminante, pelo brilho fulgurante na actuação, reconhecido e aplaudido unanimemente pelos seus militantes enquanto esperam impacientes que se abra um novo ciclo para a alternativa democrática? Ao que parece, os lideres partidários, enquanto na oposição, parecem um joguete daquela interminável brincadeira de crianças “passa ao outro senão chumbas”…

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Parabéns ao Fátima!...



O Fátima eliminou o F.C.Porto da Taça da Liga. Mereceu indiscutivelmente a vitória: jogou melhor e com mais vontade e determinação. Palavra de portista isento!...
Os parabéns ao Fátima!...

Chocante!

Certas afirmações por parte de autoridades religiosas são duplamente chocantes, pelos seus conteúdos e por virem de onde vêm.
Há alguns anos, dirigentes muçulmanos da Nigéria “denunciavam” que a vacina antio-polio estava contaminada com substâncias susceptíveis de provocar infertilidade nas meninas, inserindo-se numa estratégia ocidental para “destruir” a sua civilização.
A luta contra a poliomielite, a segunda doença em vias de erradicação à escala planetária, sofreu um forte revês e um atraso considerável, originando sofrimento e morte em muitas crianças. Recentemente foi reactivado o programa.
Agora, surge mais uma que deixa qualquer um, sobretudo os profissionais de saúde, de boca aberta. O Arcebispo de Maputo, D. Francisco Chimoio, acaba de afirmar que alguns preservativos de origem europeia estariam contaminados com o HIV, assim como certos medicamentos anti-retrovirais, com o objectivo de liquidar o mais rapidamente possível os africanos. Nem mais!
Quinhentas pessoas são infectadas diariamente pelo vírus. No cômputo global a prevalência naquele país é da ordem dos 16%!
O facto da Igreja Católica não aprovar o uso de preservativos, defendendo outras medidas, como a abstinência sexual, não legitima que um destacado membro da sua cúria aponte para uma conspiração desta natureza à Europa, configurando algo muito difícil de compreender e de aceitar.
Os religiosos muçulmanos nigerianos apontavam o dedo aos americanos como sendo os responsáveis por uma campanha de esterilização em massa. D. Chimoio vem agora apontar o seu a dois países europeus (não os cita) como mentores de um acto criminoso capaz de fazer inveja à brutal e obscena criatividade de um Josef Mengele!
Mas o que é se passa na cabeça destas pessoas?
Chocante!

"Amargos de boca"

O meu entendimento da justiça é baseado, sobretudo, na “evidência e no bom-senso”. Não sou perito em leis. No entanto, ao longo da vida acabei por verificar que a justiça, ao funcionar de acordo com os seus doutos e superiores códigos, consegue transmitir sensações capazes de provocar amargos de boca. No mínimo!
Dois casos, hoje relatados, despertaram-me esta sensação.
Um homem contratou dois indivíduos para assassinar a mulher. Acontece que o primeiro pagamento, 2.500 euros de um total de 10.000, não foi concretizado por falta de cobertura! O Tribunal de Relação indeferiu o pedido do Ministério Público para prender o “candidato a assassino”. Segundo os doutos juízes instigar um crime não é punível. Só quando é executado ou tiver um início é que é objecto de castigo.
Tentei ver se na notícia havia ou não qualquer referência a eventual castigo por ter passado um cheque careca. Mas não vi nada. Será que neste caso os cheques carecas são perdoados?! Já não digo nada! Às tantas são. Será porque o trabalho não foi consumado?!
A segunda notícia também diz respeito ao Tribunal de Relação ao decidir entregar a Esmeralda ao pai biológico, depois de verificadas certas condições.
Naturalmente que a decisão dos senhores doutores juízes foi tomada com base na lei. Não duvido. Mas que causa um certo amargo de boca, ai isso provoca. Eu senti esse amargo, assim como a decisão sobre o “candidato” a matador.
Provavelmente sofro de alguma forma de dislexia jurídica que não se coaduna com a “evidência e o bom-senso”.

A voz da blogosfera

A enorme contradição entre os objectivos do Governo expressos no Orçamento de Estado para 2007 e as realizações expressas no Relatório da Execução Orçamental de Agosto tem sido branqueada pelo executivo e pela generalidade dos comentadores. Referi essa contradição no meu post de anteontem, A grande mistificação das contas públicas.
Contrariamente ao que se passa na comunicação social, a blogosfera tem estado atenta ao assunto. Vi que ilustres blogs e bloguistas fizeram o favor de transcrever ou citar o texto em causa.
Ao A Arte de Fuga, Avenida Central, Blasfémias, Bloguítica, Caldeirão de Bolsa, Detrás do Reposteiro, Fliscorno, Fórum Defesa, Lusitânea, O Andarilho, O Insurgente, os meus agradecimentos e os do 4R.

Homenagem

A notícia veio-me como vêm normalmente estas notícias. "Sabes quem morreu?".

Morreu Joaquim Jorge Magalhães Mota.

Desapareceu alguém que, entre muitas outras coisas, me ensinou pelo seu exemplo quanto valem a serenidade e a ponderação.

Há muito tempo que não me encontrava com ele. Apesar disso foi alguém que, mesmo afastado, nunca deixou de me vir à memória nalguns momentos da minha vida, mais tensos, em que dizia com os meus botões, recordando sucessos partilhados: "como é que neste caso reagiria o Mota?"

A minha homenagem a mais um Homem que o País não soube aproveitar devidamente.

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Pela Liberalização Total dos Horários do Comércio

Foi hoje entregue, na Assembleia da República, uma petição com mais de 250 mil assinaturas, defendendo o fim das limitações legais ao horário de funcionamento das grandes superfícies aos domingos e feriados de tarde, impostas desde 1996.

Sou totalmente favorável a esta petição – e tal não resulta do seu elevado número de subscritores. Aliás, nunca percebi as vantagens de limitar os horários de funcionamento – até porque, segundo a Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição (APED), se a autorização em questão for concedida, serão criados cerca de 4 mil novos empregos. E o preço médio do cabaz de compras diminuirá. Já são argumentos relevantes, numa altura em que os tempos não estão fáceis (há vários anos…), nem se vislumbram grandes melhorias num horizonte próximo.

Mas o ponto que para mim é fundamente é outro: na verdade, sempre tive a opinião que é o próprio dono que tem que decidir se tem o seu estabelecimento comercial aberto ou fechado. Porque, obviamente, se algum quiser estar aberto entre a meia-noite e as 7 da manhã, por exemplo… deve poder fazê-lo – isto é, não vislumbro uma única razão por que tal não possa suceder!... Ou melhor, vislumbro sim, mas não é do ponto de vista legal: se não existirem consumidores suficientes que justifiquem essa decisão, garanto que esse horário será, certamente, abandonado.

Obviamente, esta situação é válida seja lá qual for a natureza ou a dimensão do estabelecimento em questão, isto é, tanto serve para o grande supermercado, como para a mercearia da esquina do bairro. Que, naturalmente, deve procurar os argumentos necessários para não perder – e até mesmo seduzir – os seus clientes, de forma a que eles sejam fiéis.

Como o Professor Ernâni Lopes ainda recentemente afirmava, basta ir à Ásia para perceber este fenómeno: os horários são ditados pelos consumidores. Ou então, repare-se no que sucede na zona mais central de Nova Iorque (Times Square), em que muitas lojas estão todos os dias abertas para lá da meia-noite. Os clientes assim o exigem… Ou ainda o que sucede no centro de Londres, por exemplo em Leicester Square ou Picadilly Circus, em que a maior parte dos estabelecimentos aí existentes tem horários alargados à Sexta e ao Sábado, entrando pela noite dentro. Porquê? Certamente não foi por que os donos disso se lembraram como forma de passar o tempo... Ou porque, num gesto de boa vontade, quiseram combater o desemprego e contrataram mais funcionários... Não: mais uma vez, a procura assim o ditou.

É, pois, tempo de, em Portugal, nos deixarmos de preconceitos ultrapassados e de nos adaptarmos aos tempos que vivemos. E de não cercear a liberdade de iniciativa económica nem diminuir a liberdade individual do consumidor.

Espero, assim, que esta petição produza resultados práticos. Na parte que me toca, e enquanto Deputado do PSD, tudo farei para que assim seja. Porque tenho a firme convicção que todos saímos a ganhar.

O estado a que chegaram as “bocas” dos portugueses…

A saúde oral continua excluída do Serviço Nacional de Saúde (SNS). É assim mesmo. É uma situação incompreensível!?
O estudo recentemente divulgado pela Sociedade Portuguesa de Estomatologia e Medicina Dentária sobre o estado da saúde dentária dos portugueses é alarmante. Os resultados envergonham qualquer país desenvolvido. Se não vejamos: cerca de 99% das crianças portuguesas entre os 8 e 17 anos de idade têm problemas dentários e na sua maioria com cáries ou falta de dentes. Apenas metade das que revelaram sintomas de infecções, dores ou sensibilidade foram ao médico para consulta ou tratamento. No grupo etário dos 0 a 7 anos 65% apresentam problemas. Quanto aos adultos, o estudo revela que apenas 1,5% apresenta dentição saudável, sendo os principais problemas os dentes cariados e obturados e a falta de dentes. Apenas 42% dos adultos com sintomas de dores, sensibilidade ou infecções procuraram tratamento médico. Estes resultados confirmam o 23º lugar que Portugal ocupa na Europa no que diz respeito à higiene oral.
Os níveis de doenças dentárias e gengivais são muito altos porque é manifestamente insuficiente a assistência médica dentária, quer a preventiva quer a correctiva. O que se constata é que a população não tem capacidade para pagar uma consulta de medicina dentária.
A ausência de cobertura de cuidados de saúde oral pelo SNS é responsável pelo estado gritante a que chegaram as “bocas” dos portugueses. Para este quadro negro contribui também a ausência de hábitos em matéria de higiene oral. Hábitos que deveriam ser incutidos logo na infância, ajudando a prevenir os problemas dentários.
A situação descrita tem implicações graves a diversos níveis. A questão não se resume apenas a bocas cariadas e desdentadas. A falta de saúde oral tem repercussões muito negativas a outros níveis, porventura menos evidentes para o comum dos cidadãos, designadamente na transmissão de doenças, no desenvolvimento de infecções, na falta de auto-estima e na dificuldade na interacção social. A boca e os dentes funcionam como uma espécie de cartão de visita que pode constituir um factor de exclusão social. Aspectos que são, pelos vistos, desvalorizados pelas nossas autoridades públicas. Ter uma boca sã é ainda considerado um luxo em Portugal!
A realidade parece não deixar dúvidas que temos na saúde oral um problema de saúde pública.
Mas os nossos governantes é que não entendem assim. Pelos vistos continua tudo na mesma ou pior. Enfim, mais um défice, mais um problema, mais um contraste...Tão desenvolvidos numas coisas e tão subdesenvolvidos noutras!

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

A grande mistificação das contas públicas!...

A forma transparente de aferir o cumprimento dos objectivos do Governo, em termos de contas públicas, seria a apresentação dos valores da execução orçamental comparativamente aos valores orçamentados. Todavia, os valores continuam a ser apresentados comparativamente com o ano anterior. Assim, custa mais a perceber se os objectivos estão a ser ou não cumpridos, e onde se situam os principais desvios. Um analista exterior tem dificuldades em fazê-lo, tanto mais que não é total a correspondência entre os mapas do orçamento e os da execução orçamental. Com os elementos ao dispor, e ressalvando alguns ajustamentos derivados da distinção entre contabilidade pública e nacional, em relação ao mês de Agosto e ao Sub-Sector Estado(não inclui Administração Regional e Local, Segurança Social e Fundos e Serviços Autónomos), a situação é a seguinte:
1. Era previsto que as despesas com o pessoal aumentassem 0,25%. Estão a aumentar 3,4%.
2. Era previsto que as aquisições de bens e serviços correntes aumentassem 3,5%. Estão a aumentar 10,2%.
3. Era previsto que as despesas correntes aumentassem 1,2%. Estão a aumentar 4,5%.
4. Era previsto que as despesas de capital aumentassem 2,1%. Estão a diminuir 2,9%.
5. Era previsto que a despesa total aumentasse 1,2%. Está a aumentar 3,9%.
6. Era previsto que a receita dos impostos aumentasse 4,9%. Está a aumentar 8,6%.
7. Era previsto que as receitas correntes aumentassem 1,6%. Estão a aumentar 10,4%.
8. Era previsto que as Receitas totais aumentassem 1,6%. Estão a aumentar 10,1%.
A situação explicita a enorme mistificação que o governo tem vindo a fazer, afirmando o controle das finanças públicas e do défice, pela compressão da despesa. Não é verdade. O governo não está a controlar nada. Quem tem acudido ao défice é o contribuinte, através do aumento dos impostos. No caso, para o dobro do previsto!...

A energia de Soares

O Dr. Mário Soares foi a Belém convidar o Sr. Presidente da República para um colóquio sobre energia.
Interrogam-se sobre o que tem a ver o Dr. Mário Soares com a temática da energia?
A crer nesta notícia a paixão do Dr. Soares pelo tema deriva, afinal, da sua intervenção num negócio da GALP por conta da amizade com Hugo Chavez, que, como toda a gente sabe, é um daqueles democratas bactereologicamente puros, porém incompreendido.

Pode não ser verdade, mas não seria estranho que o fosse...

Sarkozy entala BCE?

Na última 5ª Feira, o mesmo dia em que o FED baixou as suas principais taxas em 0,5 pontos percentuais, o Presidente Francês lançou um duro ataque ao BCE.
Sarkozy enalteceu a postura do FED – capaz de responder em tempo aos sinais da economia – e lamentou que o BCE não seja capaz de uma decisão semelhante, contribuindo com a sua rigidez para “afundar” a economia europeia.
Sarkozy é tudo menos um inocente, estas declarações têm intencionalidade bem precisa.
É visível que Sarkozy não gosta do BCE nem de Trichet, nomeado pela influência de seu antecessor Chirac.
E já percebeu que o BCE é muito avesso a sugestões ou recomendações dos políticos quanto às decisões de sua competência: quanto mais eles sugerirem uma descida das taxas menos o BCE estará inclinado a tomar essa decisão.
Sarkozy, com esta postura de hostilidade pública ao BCE, cobre-se contra resultados menos bons da economia francesa - onde nem tudo corre bem ao que parece.
A eventual teimosia do BCE em baixar as taxas proporciona-lhe um bom álibi para esse eventual mau desempenho da economia francesa.
O BCE, por sua vez, parece amarrado a um fantasma – dos riscos de inflação – que tarda em manifestar-se: desde Outubro de 2006 a inflação na zona Euro mantém-se abaixo de 2%, tendo mesmo atingido em Agosto o valor mais baixo deste período, 1,7%.
Dificilmente se entende assim esta atávica apreensão do BCE com os riscos de inflação.
Pelo contrário, começam a emergir sinais de abrandamento da actividade económica na Europa, em especial na zona Euro.
Ao mesmo tempo, a taxa de câmbio €/USD tem evidenciado uma forte apreciação, em especial na sequência da decisão do FED, levantando receios de um maior abrandamento económico na Europa do Euro e reduzindo ainda mais os riscos de inflação.
Neste contexto, é realmente difícil perceber o persistente receio do BCE em relação aquele fantasma.
Sarkozy sente-se assim à vontade para entalar o BCE...Será que, atormentado pelo tal fantasma, este vai continuar a servir o jogo do Presidente?

domingo, 23 de setembro de 2007

Santana: novamente a vitimização!...

Em declarações ao DN, Santana Lopes retomou o tema recorrente da vitimização. Queixa-se agora que a Oposição e o PSD não reagem com a energia suficiente quando Sócrates ataca o seu Governo. Tudo bem!...
Um líder tem que ser ou, no mínimo, parecer forte e imperturbável. Por isso, não consigo perceber como é que uma pessoa que permanentemente atribui a si próprio o papel de vítima tem pretensões a ser líder do que quer que seja!...

Esqueçamos por momentos o Outono "político"...

Bem-vindo Outono! Cá estamos de novo na sua companhia. Chegou de mansinho e aos poucos irá entrando devagarinho…É melhor assim. Mais um ciclo se completou. Sinto no meu imaginário do tempo que é no Outono que se inicia a “volta ao mundo”, quero dizer que se inicia a viagem das quatro estações que nos levará no final ao Verão. Para outros não haverá propriamente uma viagem. Para outros, ainda, a viagem terá o seu ponto de partida numa outra qualquer estação. Sinto que é no Outono que o ciclo “recomeça”. Olho para o Outono recordando os meus anos de juventude, associando-lhe o regresso a casa e às aulas, o reencontro com os colegas da escola e com as amigas e a retoma do contacto com os vizinhos e com o movimento do bairro, depois do período das então chamadas “férias grandes” que terminava com um mês e meio bem passado na casa que temos na Beira. Era um período do ano vivido no campo, em contacto com a natureza, junto das gentes da nossa aldeia, em que se multiplicavam os passeios por lugares escondidos e esquecidos, não falhavam as visitas às feiras locais e regionais, as festas padroeiras das aldeias e vilas circundantes eram motivo de romaria familiar, não faltavam os piqueniques e os banhos nos açudes do rio, o pão de forno de lenha com marmelada e a limonada fresca faziam a chamada obrigatória para os lanches debaixo do caramanchão dos jardins lá de casa, seguidos de uma espécie de sesta que fazíamos à sombra dos plátanos e outras infinitas coisas que aconteciam repetida e variadamente todos os anos.
Gosto do Outono. A tristeza e a depressão que muitos dizem sentir nesta estação não me atingem particularmente. Sinto que há uma mudança significativa do clima, com consequências importantes nos hábitos e nas vontades e, talvez, nos estados de espírito.
Nesta época a natureza também tem o seu encanto. Gosto dos perfumes da época, de sentir o cheiro húmido da terra, das árvores e das folhas, de olhar o cheiro que paira no ar mesmo na cidade. Gosto de reparar nas árvores que dia após dia se vão despindo porque gosto de ver o tapete colorido que as folhas formam. Gosto das cores quentes dessas folhas: dos amarelos, dos vermelhos, dos castanhos e dos laranjas. Gosto da chegada das temperaturas amenas, das aragens frescas da manhã e do cair da noite. Gosto do frio quente do sol. Gosto de vestir os primeiros casacos de malha, macios e aconchegantes. Gosto do Verão de S. Martinho, das castanhas e da água-pé. Gosto de fazer compotas, marmelada e geleias, de as guardar e etiquetar para depois saborear ao longo do ano. Gosto da jardinagem, de planear e plantar os arbustos e as árvores da próxima Primavera.
E depois, o Outono convida-nos ao recolhimento. Podemos ficar em casa mais tempo nos fins-de-semana e à noite que ninguém repara, porque o tempo frio e a chuva são uma boa desculpa. É um tempo em que podemos repousar mais sossegadamente.
Gosto de muitas outras coisas do Outono. Não gosto, é verdade, de outras. Mas estas desvalorizo-as, centrando as minhas atenções nas vantagens que o Outono tem para nos dar.

sábado, 22 de setembro de 2007

Serviço Público de não-notícias!...

Pelo terceiro dia consecutivo, o Telejornal das 20 horas do Serviço Público de Televisão abriu com a demissão de Mourinho.
Sete longuíssimos minutos, incluindo ligação a Londres, com uma não-notícia!...
Para quê pagar um serviço de notícias não-noticioso?

Este é um homem providencial

A notícia não é que o autonominado Zé, vereador do ambiente e sustentáculo da governação lisboeta, descobriu uma maneira de as pessoas circularem na cidade sem recurso a uma viatura. Não. A notícia do dia da confusão em que todos os anos se transforma o chamado dia sem carros, é que o Zé descobriu - eureka! - que ninguém se consegue mexer na capital que não seja de automóvel (de preferência todo-o-terreno atento o estado das ruas).
Serve este post para partilhar com quem por aqui passeia, o quanto me congratulo por existirem no meu País visionários como o Zé. Que vêem através do mais denso nevoeiro intelectual a que só escapam os seguidores do farol que é o Dr. Louçã, e alcançam o que não está à mão e à vista de nós outros, míopes cidadãos.
Abençoado sejas Zé, porque, fiel às expectativas que a tua inteligência fez nascer desde o primeiro momento em que se nos revelou, nos apontas o caminho. E abençoada comunicação social que nos confirma todos os dias que o Zé, usando das invulgares capacidades sensoriais e cognitivas - escravizadas ao interesse geral e nunca aos diabólicos interesses privados -, faz efectivamente falta!

Exposição Alfredo Keil


Em Colares, continua a Exposição Comemorativa de Alfredo Keil. Na antiga Adega Visconde de Salreu. Até ao dia 7 de Outubro.
Desiludido por muitas iniciativas do género, em que o que o objecto ou o sujeito da exposição se perdem e o que avulta é a idiossincrasia do comissário, só hoje lá estive. Confesso que foi uma agradável surpresa.
A Exposição permite conhecer o homem e o artista, pintor, poeta, maestro, compositor, muito para além do seu trabalho mais divulgado, a partitura de A Portuguesa. O homem, através das cartas para a família e amigos; o artista, através da exposição de parte da sua obra.
Rico, empobreceu com a produção e montagem das suas óperas. É notável o trabalho que desenvolveu, desde a composição à direcção, ao desenho dos adereços e das marcações em palco, à supervisão dos cenários e à própria compra de objectos de cena.
Nacionalista, nunca perdoou que A Portuguesa, escrita como reacção ao Ultimato Inglês, fosse usurpada por Afonso Costa e outros como um símbolo da luta contra a monarquia.
Notável a selecção de testemunhos, nomeadamente os quadros, das colecções da família Keil do Amaral e de outras colecções privadas e públicas.
Com Alfredo Keil revive-se o nascimento da Praia das Maçãs e uma das suas mais tocantes tradições, a Procissão da Praia.
À saída de Colares, na estrada para a Praia das Maçãs, até 7 de Outubro.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

"Hush Puppies”

Certos acontecimentos, atitudes ou comportamentos comportam-se como verdadeiros vírus ou bactérias. Para provocarem um efeito em larga escala deverão respeitar certas regras. Em primeiro lugar têm de ser contagiosos. Quase que poderíamos perguntar o que não é contagioso? No entanto não basta ter este atributo. Muitos germes, apesar de possuírem esta característica, mesmo assim, não provocam epidemias. É preciso mais alguma coisa como pequeninas causas que podem provocar grandes efeitos e que estes ocorram num determinado momento crítico. Esta análise aplica-se tanto a uma doença infecciosa como a um determinado fenómeno social.
No livro, The Tipping Point, Malcolm Gladwell inicia a abordagem ao tema, contando a história do calçado "Hush Puppies” que, estando fora de moda, ia levando quase à desistência dos empresários, quando, subitamente, ocorreu uma explosão inexplicável. Meia dúzia de rapazes de bairros problemáticos lembraram-se de as utilizar por esse motivo. O que é certo é que foi rapidamente transformada numa nova fashion, ampliada pelo pessoal da haute couture, provocando uma "epidemia" deste tipo de calçado. Tudo isto na base de uma transmissão oral.
O autor conta igualmente a história, segundo a qual a criminalidade e o número de assassínios diminuíram de uma forma impensável na cidade de Nova Iorque num curto período de tempo. Claro que as interpretações foram as mais diversas entre as quais se destacam um melhor policiamento, a diminuição do consumo de droga e o envelhecimento da população, entre outras. Mas estas medidas, após análise adequada, revelaram ser muito pequenas para justificar tamanhos efeitos. O que aconteceu de facto foi que certos grupos de risco mudaram de comportamento e esta mudança propagou-se a outros bandos como se tivessem sido atingidos por um verdadeiro vírus anti-crime.
A abordagem deste tema fez-me pensar, por que é que o actual governo, e respectivo partido que o apoia, continuam na mó de cima, não obstante o aumento do desemprego, a falta de esperança dos mais jovens, o drama da educação, as borradas na escolha da localização do novo aeroporto, os encerramentos na área da saúde, as dificuldades sentidas pelos mais desfavorecidos, os episódios meio-patéticos ao redor das habilitações do senhor primeiro-ministro, os vetos presidenciais de alguns diplomas, só para citar alguns. Não me venham com a conversa de que o povo concorda com estas medidas, porque "sabe" o que é melhor para o país!
O descontentamento generalizado contrasta com a aceitação do poder. É contagioso? É evidente que sim! Chega para provocar a queda do Governo? Pelos vistos não! Mas comporta-se como um vírus, que anda por aí. Não confundir com o outro que, também, anda por aí! Aparentemente já deverá ter perdido a contagiosidade, mas nunca se deve menosprezar nenhum vírus, porque pode a qualquer momento sofrer uma mutação e, então, é um desastre. O melhor é vacinarmo-nos, se houver vacina, claro.
Posto isto, poderemos afirmar que o vírus do descontentamento anda à solta e quando for atingido o tal “ponto dramático”, que pode ser daqui a pouco ou muito tempo – o melhor é utilizar a frase tipo do Director-geral de Saúde relativamente à ocorrência da pandemia da gripe das aves: "seis meses a seis anos” – a manifestação epidémica de repúdio terá, inexoravelmente, lugar, contribuindo para o efeito aquelas "pequeninas" causas já enunciadas e que no fundo não se esquecem, a não ser que a oposição tenha, paradoxalmente, um efeito neutralizante do fenómeno "Hush Puppies"!
Em matérias de modas nunca se sabe qual vai ser o dia da amanhã, nem quando vai ocorrer o tipping point...

Muito critério jornalístico II

No post anterior, o Ferreira de Almeida salientou a “reprise” de hoje do tema Mourinho, no telejornal das 20 horas da RTP, Serviço Público de Televisão, como notícia de abertura e duração de 15 minutos. Também ontem me tinha referido ao assunto. O grotesco da situação é que a notícia não ficou por aí e é isso que justifica que volte à matéria.
De facto, o tema transformou-se em telenovela, com vários episódios ao longo do principal telejornal da RTP, serviço público, de hoje.
Capítulo 1- notícia de abertura-15 minutos
Capítulo 2- chamada de atenção para entrevista no fim do telejornal
Capítulo 3- passagem de extracto da entrevista antes do intervalo
Capítulo 4- chamada de atenção para entrevista no fim do telejornal
Capítulo 5-logo na reabertura do telejornal, nova passagem de extracto da entrevista
Capítulo 6- chamada de atenção para entrevista no fim do telejornal
A partir daqui, recebi um telefonema e deixei de ver e ouvir
Ter-se-á seguido, no mínimo como capítulo 7, se outros extractos não fizeram parte da informação, a entrevista de fundo!...
Entretanto, o debate hoje na Assembleia da República foi remetido para as 20 h 45 m, no meio dos extractos da entrevista do Mourinho.
Continuo a dizer: belo serviço público de televisão, este que pagamos. E cheio de critério jornalístico!...

Mais serviço público

Mourinho foi dispensado do Chelsea há dois dias.
Ontem o canal 1 da RTP dedicou-lhe 17 minutos no telejornal de serviço público.
Hoje não se passou nada, absolutamente nada, com Mourinho.
Mesmo assim a RTP consumiu 15 minutos do seu principal telejornal, incluindo um patético directo de Londres.
Tudo normal.

Bem visto!

A propósito da distribuição pelo Governo de telemóveis a idosos, um dos dirigentes do Movimento de Utentes dos serviços de saúde observou:
«Não apoiam, nem na compra de óculos nem na compra de dentaduras, e depois vêm dar telemóveis a quem não tem óculos para ver».

Organizem-se!...

Entre a presença de G. Brown e Mugabe na Cimeira da UE com África, o governo português, e até escrevo governo com letra minúscula, o governo português escolheu o corrupto ditador Mugabe. Ao mesmo tempo, vai dizendo que preferia Brown.
Vá lá a gente entendê-los!...Então preferem um e escolhem o outro?
Organizem-se, respeitem o cidadão e deixem-se de hipocrisias saloias!...

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Muito critério jornalístico!...

RTP, Canal 1- Telejornal das 20 horas, o principal telejornal da estação.
Notícia de abertura -A demissão de Mourinho. Notícia transcendente, como tal aprofundada, em Lisboa e Londres, por 17 longos minutos.
Logo a seguir: Castigo da UEFA a Scolari. Notícia relevantíssima, como tal enquadrada em longuíssimos 4 minutos.
Creio que houve mais uma pequena notícia antes do intervalo e o anúncio de reportagens sobre jogos da Taças Europeias.
Por mim, já não tive paciência para ouvir mais.
Belo serviço comercial de televisão, este que pagamos, a título de serviço público. E cheio de critério jornalístico!...

Cristiano Ronaldo, Rui Costa e… Simão Sabrosa

Não, desta vez não vou escrever sobre economia, e muito menos sobre impostos!...

Ontem tivemos oportunidade de apreciar um momento sublime num Estádio de Futebol – a prova de que também é possível haver momentos muito bonitos (é disso que se trata) e não apenas a agressividade, a violência verbal e os insultos a que, com regularidade, vamos assistindo. E porque muito apreciei o que aconteceu, não quis deixar de partilhar com os leitores da Quarta República.

O “meu” Sporting perdeu ontem, em casa, com o Manchester United para a Liga dos Campeões da UEFA por 1-0. Um belo jogo, cujo resultado mais certo era o empate. Mas quem falha geralmente é penalizado – ainda para mais quando se joga contra um dos melhores clubes do mundo – e, portanto, quando não há “casos” nem influências externas ao jogo jogado, está tudo certo.

Quis o destino que o golo com que o Manchester United venceu fosse apontado por Cristiano Ronaldo – que, somo se sabe, para além de ser um dos melhores jogadores do mundo, e também dos mais bem pagos, foi formado nas escolas do Sporting, de onde se transferiu, há 4 anos, para terras de Sua Majestade Isabel II.

Quando Ronaldo marcou o golo – um belo golo, por sinal – não só não celebrou como, juntando as mãos e apontando-as na direcção dos adeptos do Sporting, pediu desculpa pelo que acabara de fazer.

No mesmo instante, os adeptos do Sporting, que tinham acabado de ver o seu clube do coração sofrer um golo, retribuíram com palmas, reconhecendo a beleza do lance, o génio de Ronaldo, e aceitando o facto de que a sua tarefa hoje é… ajudar o melhor que puder a sua entidade empregadora, mesmo quando isso implica… marcar ao Sporting!...

Mais tarde, quando ainda durante o jogo Ronaldo foi substituído, foi arrepiante e emocionante ver um estádio inteiro, na sua esmagadora maioria vestido de verde-e-branco, a atribuir-lhe, de pé, a ovação da noite.

Creio que o reconhecimento de Ronaldo relativamente ao clube que o formou e de onde saiu para Inglaterra prova bem a sua dimensão e formação como homem – e o público percebeu bem isso. E proporcionou-lhe um dos momentos mais bonitos a que já assisti num estádio de futebol.

Fez-me lembrar o que se passou há uns anos com outro grande ser humano (e, claro, escusado será dizer, grande jogador), Rui Costa, que, quando marcou em pleno Estádio da Luz um golo pela Fiorentina contra o “seu” Benfica, teve a mesma reacção de Ronaldo e, mais tarde, classificou aquele como o pior golo da sua vida. Revelador. Aliás, não foi à toa que jogando agora no Benfica, Rui Costa foi, ainda na passada terça-feira, homenageado por parte dos adeptos do Milan AC, no jogo Milan-Benfica (pois Rui Costa ainda jogou 5 épocas no Milan). Quando foi substituído e o estádio se levantou para o aplaudir, sentiu-se que não era apenas ao futebolista que se prestava tributo – era também às suas qualidades humanas.

Infelizmente, os exemplos no sentido oposto também acontecem – e assumem uma dimensão maior quando são protagonizados por “estrelas”. Como aconteceu com as declarações de Simão Sabrosa, quando ingressou no Benfica em 2001 (vindo do Barcelona), e referiu, entre outras “pérolas”, algo parecido com o seguinte (não me recordo exactamente dos termos): nada lhe daria tanta alegria como ir a Alvalade e marcar ao Sporting. O ponto é que Simão tinha sido formado nas escolas leoninas, onde passou largos anos da sua juventude e, quando foi transferido para o Barcelona, tinha dito – e bem, na altura: devo tudo ao “meu” Sporting…

Como diz o povo, mudam-se os tempos, mudam-se as vontades…

Mas creio que é revelador de uma enorme diferença entre Cristiano Ronaldo e Rui Costa, por um lado, e Simão Sabrosa, por outro.

Os primeiros contribuirão para a ocorrência de momentos sublimes e mágicos nos estádios e fora deles (como o de ontem em Alvalade), para além dos pormenores técnicos do jogo, com que habitualmente nos deliciam. São referências e exemplos a seguir pela sociedade. E concorrerão para enobrecer o futebol que, às vezes (tantas vezes…), tão mal visto e mal tratado é.

Já do segundo, infelizmente, não será exagero afirmar que apenas poderemos esperar bons momentos futebolísticos…

Crise financeira: implicações mais sérias (II)

Admito que alguns leitores mais generosos como Pinho Cardão ainda se recordem do POST que aqui editei há precisamente uma semana com este mesmo título.
Pois bem, o FED baixou a sua taxa principal em 0,5%, a 18 do corrente, como nesse POST era previsto.
E agora o USD está em queda acentuada, um dos riscos assinalados nesse mesmo texto, à boleia de Martin Wolf colunista habitual do Financial Times: encontra-se ao nível mais baixo de sempre em relação ao Euro, valendo 1€ quase 1,41 USD a esta hora.
Tenho a percepção de que os mercados esperam novas descidas de taxas nos USA com o objectivo de manter a economia americana a flutuar, contrariando os efeitos recessivos da crise generalizada e profunda do mercado imobiliário.
Por isso a quebra acentuada do câmbio USD/€, uma vez que na Europa não existem (para já) quaisquer sinais de que o BCE possa seguir o FED: bem pelo contrário, o que o BCE ainda tem em agenda é uma possível subida das taxas em Outubro – hipótese inverosímil nas actuais circunstâncias.
Creio mesmo que o BCE terá de se preparar para uma inversão de marcha pois começam a multiplicar-se os indicadores de desaceleração da economia europeia e os próprios governos de alguns países já admitiram essa desaceleração em 2007 e em 2008 sobretudo (com excepção da “economia de aço” lusa, pois claro).
Curiosamente o Secretario Geral da OCDE acaba de declarar que uma eventual descida das taxas do BCE "iria na boa direcção"...Calculo a aflição que este statement estará causando em Frankfurt por esta hora...
Entretanto, a acentuada descida do USD pode suscitar problemas tais como a subida das taxas de longo prazo das dívidas americanas, que não dependem do FED, contrariando os efeitos pretendidos, por exemplo encarecendo os custos de investimento e exigindo retornos (TIR) mais elevados dos novos projectos.
Mas não só: uma quebra mais acentuada do USD reflectir-se-á num abrandamento das exportações da zona Euro, contribuindo para reduzir as perspectivas de crescimento dos países membros (sempre com a notável excepção acima referida)
Em suma, tal como terminei o POST de há uma semana, um tema apaixonante a justificar atenção permanente.

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Défice público: a propaganda e a lógica

Acompanhem-me neste difícil e elaborado silogismo:
Premissa maior: O défice é o resultado da soma algébrica das receitas com as despesas.
Premissa menor: Segundo o Governo, a despesa tem vindo a baixar em 2007; segundo as estsatísticas, as receitas têm vindo a subir.
Conclusão lógica: A melhoria do défice consistirá no resultado combinado da soma do aumento da receita com a diminuição da despesa.
Se não é assim, a lógica é uma batata, ou as premissas estão erradas.
Testemos a robustez do raciocínio
Segundo a Síntese da Execução Orçamental, referente a Agosto, o défice do Sub-Sector Estado(não inclui a Segurança Social, Fundos Autónomos e Autarquias) diminuiu, em relação ao período homólogo de 2006, em 1, 5 milhões de euros. No mesmo período, as receitas totais aumentaram 2,2 milhões de euros (e as receitas fiscais 1,7 milhões de euros).
Ora acontece que a diminuição do défice(1, 5 milhões de euros) foi menor do que o aumento das receitas (2,2 milhões de euros). E esse menos foram 700 mil euros. Para onde é que eles foram?
Claro, clarinho, que foram suportar o aumento das despesas. De facto, estas aumentaram 707 mil euros!...
Conclusão real: o governo não fala verdade: a despesa pública tem vindo a aumentar.
O Governo pode saber muito de propaganda, mas não sabe nada de lógica e de filosofia e muito menos sabe da nobre arte de fazer contas.
E nós a pagarmos essa ignorância, através de mais e mais impostos. Agora, mais 8%!...
Nota: Onde se lê milhão de euros, deve ler-se mil mihões. E onde se lê 707.000 euros deve ler-se 707 milhões de euros.

Quilograma emagreceu!


Conta-nos o DN de hoje que o quilograma padrão, guardado há 118 anos numa redoma de vidro em Sèvres, no Gabinete Internacional de Pesos e Medidas, apresenta a misteriosa diferença de 50 microgramas em relação aos seus sósias espalhados pelo mundo. Os cientistas arrepelam os cabelos com este mistério, porque todos os protótipos existentes são iguaizinhos e guardados nas mesmas condições. A grande dúvida, legítima, é se foi este que emagreceu ou se os outros todos que engordaram insidiosamente ao longo destes 118 anos de clausura.
Nem a redoma lhes vale, as imprevisíveis variações de peso já atingem o próprio quilograma-padrão…Já não há valores seguros!

Jejuns

Afirmar que fazemos parte da primeira ou da segunda geração que não passa fome traduz uma realidade aplicada apenas ao mundo ocidental. A fome foi - embora, infelizmente, continua ainda em muitas partes do globo - um dos principais, senão mesmo o principal determinante de adaptação do homem ao meio ambiente. Tanto é assim, que a nossa fisiologia, assim como a de outras espécies, estão preparadas para viverem na penúria e não na abundância, estando esta última na base de muitos e graves problemas que afectam a nossa saúde. Também é conhecida as privações extremas de alimentos, que ocorriam com maior ou menor periodicidade, revelando a essência da mais pura animalidade humana ao não se coibir de práticas horríveis.
Se a produção de alimentos não era suficiente para prever os períodos de carência, a sazonabilidade dos mesmos contribuía para os agravar. Em determinados momentos do ano, a falta de mantimentos coincidia com o período do desenvolvimento das culturas, facto que, segundo alguns autores, poderia estar na origem de algumas formas de jejuns.
Fazer jejum não é muito convidativo. Só através da “força” religiosa é que é possível impô-lo. De facto, rara é a religião que não exige certas medidas purificadoras, nas quais está perfeitamente contemplado. Deste modo, evitam-se conflitos e, ao mesmo tempo, não deixa de ter um efeito positivo na saúde. Há elementos que revelam que a alternância da abundância com a penúria origina importantes modificações metabólicas. Estes “choques” podem ser salutares, ao contrário da fome permanente, como é óbvio, e da ininterrupta abundância.
Os portugueses eram muito dados aos jejuns. Não os “obrigatórios”, por falta de alimentos, mas os determinados pela religião. Apesar de hoje terem perdido muitas das tradições, mesmo assim, continuam a ser o povo da Europa que mais peixe consome. Já consumiram mais, sem sombra de dúvida. As épocas em que não se podia comer carne eram numerosas, e nem numa vulgar sexta-feira se podia comer. Recordo perfeitamente essa época em que a minha avô cumpria escrupulosamente as determinações. Acontecia que algumas pessoas, devido a doença, eram aconselhadas a comer carne por imposição médica. Neste caso, os mais velhos aceitavam violar as regras, mas com alguma relutância, e se o dia fosse mesmo santo não a comiam mesmo, uns ovitos e vá lá!
O jejum, desde que não seja prolongado, nem muito restrito, não faz mal, até pode ser muito útil.
Não estou a ver os publicitários a fazer reclames a esta prática! Onde é que iam buscar clientes? O governo também não o faz, porque está entretido com outros tipos de jejuns!
Desde que uma pessoa seja saudável, nada impede a sua prática. Mas não é preciso ser extremista. Os muçulmanos fazem-no durante o Ramadão e não vem mal ao mundo. A imposição levada ao extremo, como aconteceu com o presidente turco que teve a “infelicidade” de beber um copo de água durante o dia, com as câmaras da TV a testemunhar a falta, vai obrigá-lo a fazer um dia extra para compensar a distracção! Mas o pior são os doentes, caso, por exemplo, dos diabéticos que obedecem a esta regra, embora estejam dispensados de a cumprir. Um estudo recente revela sérios problemas, sobretudo nos que tomam insulina, os quais podem confrontar-se com graves crises de hipoglicémia. O facto desta doença estar a aumentar, também, nos povos muçulmanos, vem levantar algumas interrogações sobre como tratar e evitar as descompensações. Neste caso, o jejum pode ser perigoso e não se limita somente à diabetes.
Um convite à prática do jejum pode ser benéfico, desde que o indivíduo não apresente contra-indicações. Mas pode ser perigoso se for “aceite” por doentes que não deviam.
Desaparecidas, praticamente, as razões religiosas, que as impunham nesta parte do globo, também, não vejo quaisquer possibilidades em as manter ou promover. Brilhantes nutricionistas, e outros profissionais, estão mais preocupados em alardear os vários tipos de dietas, desde a mediterrânica até à paleolítica(!), passando por outras verdadeiramente mirabolantes, do que propriamente focar alguma atenção nesta técnica. Não esquecer que muitos consideram-na mesmo despropositada e contrária aos desejos dos seres humanos, excepto em situações médicas muito restritas, caso de uma operação, por exemplo. Passar um ou dois dias, de tempos a tempos, a comer frugalmente poderia ser uma solução para alguns problemas. O mais difícil é dar-lhe corpo! Falta de suporte sociológico face à mais poderosa força que nos move: o medo da fome.

O ser e o parecer: uma história!...

Aqui há uns vinte e tal anos, ao fim da tarde, e quando podia, ia buscar os meus filhos ao colégio. O carro da empresa a que tinha direito, como administrador, era muito grande e muito velho, que a empresa estava mal, os tempos tinham que ser de austeridade e havia que dar o exemplo. Carros novos só foram comprados no segundo ano de resultados positivos.
Lá meti os dois miúdos no carro e rumámos a casa. Esgotado o relato das aventuras do dia, a conversa deve ter naturalmente esmorecido, até chegarmos à garagem. Arrumado o carro, a ordem normal: vá, meninos, vamos lá sair!... Em vez da algazarra da saída, só ouvi silêncio, estranhei e olhei para trás. Não estavam lá!...
Nervoso, chamei por eles, saí do carro, abri a porta traseira e comecei a ver se não estariam deitados no chão. Nada!...Até com a mão procurei debaixo dos bancos!... Sem pinga de sangue, pensava como podia ter perdido os miúdos no percurso. Continuei a procurar em vão. As mochilas estavam lá, mas como poderiam eles ter saído do carro? Em grande tensão, olhava à volta, a ver se não estariam já na garagem. Pareceu-me, então, ter ouvido um riso abafado.De dentro do carro, não podia ser. Então, de onde? Mas seguiu-se o silêncio mais absoluto.
Chamei novamente por eles, esperançado em vê-los na garagem. Lembrei-me que, na entrada, tinha parado um momento, enquanto outro carro fazia uma manobra. Podiam aí ter saído, sem eu dar conta... E quando, em grande nervosismo e até desespero, e sem saber o que fazer, ia fechar o carro, pois aí já nada mais havia a verificar, nem a vasculhar, ouvi umas risadas nítidas. Eram eles!... Debrucei-me novamente sobre os bancos. Mas onde estavam, que não os via?
De repente, vejo uma cabeça a espreitar ao nível do banco traseiro, vinda de trás, em grande risota e dizendo olá pai, em ar de enorme divertimento!...
Tendo descoberto um buraco no tecido do encosto do banco traseiro, normalmente tapado pelo descanso do braço, infiltraram-se por ele até ao porta-bagagens, com o efeito já relatado.
Um deles até se feriu na manobra e deixou um pouco de sangue no porta-bagagens e porventura no carro. E cabelos, deveria ser um manancial!...
O que, agora, seria um festival para cães pisteiros e farejadores de ADN. Eu seria certamente arguído, com provas abundantes e evidentes, de maltratar os filhos, transportando-os, como mercadoria, no porta-bagagens!...As provas eram explícitas e a conclusão imediata e fácil!...

terça-feira, 18 de setembro de 2007

BCE baixa taxa para 3,6%?

O Banco Central da China subiu ontem a sua taxa de juro principal para 7,29%.
Essa subida foi ditada pela necessidade de contrariar as fortes pressões inflacionistas que se vêm registando nos últimos meses, sobretudo nos preços dos bens alimentares – a inflação em Agosto ficou acima de 6,5%, o que traduz uma clara aceleração dos preços.
O dado mais curioso nesta subida da taxa é de que se mantém a divisibilidade por 9 do valor da taxa. Com efeito, vê-se de imediato que 7,29 é divisível por 9.
Ao atentar neste facto, a que já aqui aludi em post de há alguns meses, não posso deixar de pensar no juízo que os Chineses farão da taxa de juro de 4% que o BCE mantém desde Junho último.
É que o algarismo 4 é detestado pelos chineses, que o associam à ideia de morte, evitam-no sempre que podem.
Como tb aqui disse, há na China muitos edifícios, até hotéis, que não têm 4º andar, passam directamente do 3º para o 5º - provavelmente o 4º andar estaria sempre vazio, se existisse...
Então os chineses deverão pensar que a insistência do BCE em manter a taxa nos 4% significa uma opção pela ruína da economia europeia...
Será que os Chineses têm razão? Não seria aconselhável o BCE descer, logo que possível, a sua taxa pelo menos para 3,6%?
A economia europeia agradecia e os Chineses considerá-la-iam certamente, uma decisão muito sensata...

Prós e Contras: mais Prós do que Contras...

Gostei da primeira parte do debate de ontem dos Prós e Contras dedicado ao tema “O que muda na Educação?”. Foi uma conversa elevada, o que vem sendo raro nos tempos que correm. Gostei porque foi uma daquelas raras ocasiões em que se gerou um consenso interessado em torno da necessidade de a educação investir na via profissional. Agradou-me também o entendimento por parte dos intervenientes de que o ensino profissional deve ser entendido como um caminho para combater o insucesso e o abandono escolar e como uma alternativa de qualificação dos jovens à tentativa cega de obtenção do título de “doutor”.
Verifiquei também a aceitação geral de que o modelo do ensino profissional não está isento de riscos, na medida em que o seu sucesso está muito ligado ao contexto profissional e empresarial local. Contudo, entre a qualificação e as oportunidades dadas aos jovens e a empregabilidade estabelece-se uma relação de reciprocidade causa-efeito que pode beneficiar a criação de actividades económicas potenciadoras de emprego qualificado. Mas a manifestação pública da evidência de riscos por parte da própria Ministra da Educação é, também, algo a que já não estamos habituados. É um bom sinal; é uma expressão de consciência política de que a medida pode falhar nos objectivos pretendidos e que, por isso mesmo, deve ser acompanhada e se necessário aperfeiçoada para que não produza mais um “elefante branco”.
Escrevi, recentemente, aqui no 4R um texto sobre a educação com o título “Ensino: igualdade de oportunidades com respeito pelas desigualdades... “. Transcrevo uma parte desse texto que enquadra o debate da primeira parte dos Prós e Contras. Penso que estamos no caminho certo e que devemos dar o benefício da dúvida a mais esta aposta na educação técnico-profissional.
*
“Devemos proporcionar a todos os jovens, de forma arrojada, sem medos nem complexos, o conhecimento de que necessitam para crescerem e se realizarem, através de um ensino diversificado e de qualidade que os alunos poderão frequentar a partir do 5º ano de escolaridade. É neste nível que – antes de atingirem o 9º ano de escolaridade – os alunos devem ser ajudados e orientados no sentido de lhes ser fornecido um projecto escolar e profissional, de acordo com as suas aptidões, apetências e capacidades intelectuais. É nesta fase que é útil explorar entre dois caminhos distintos: a via universitária e a via técnico-profissional. Esta é uma prática do sistema educativo de alguns países europeus, que por sinal apresentam taxas baixas de insucesso escolar.
Os alunos não ficarão traumatizados, antes pelo contrário, ficarão felizes e realizados e muito gratos – e o País também – por lhes ser dada a possibilidade de uma escolha efectiva e séria de oportunidades. É aqui que a igualdade de oportunidades encontra a sua melhor forma de concretização. A ideia que se instalou de que só há igualdade num País de “doutores” deu um péssimo resultado! Um erro que origina as piores das desigualdades!”
Para ler mais:

O insuportável preço da mediocridade


Com alguma ingenuidade - reconheço-o hoje - julguei ser possível dar conteúdo à ideia de "serviço público de televisão", única ideia que justifica a propriedade pública dos dois canais televisivos (já que a razão da neutralidade informativa a ninguém hoje convence e a garantia de pluralismo não é dever exclusivo das televisões públicas).
Há dias li, julgo que num dos jornais diários, que nos últimos 5 anos a RTP recebeu do Estado qualquer coisa como 1,2 mil milhões de euros .
Este número é o resultado de sucessivos aumentos no esforço que cada português faz para garantir a existência de uma televisão pública. Neste período (cinco anos) terá aumentado a taxa do audiovisual mais de 40%! E as indemnizações compensatórias, dinheiro alocado no Orçamento do Estado para remunerar o "serviço público" que teoricamente imporía sérias limitações à obtenção de proveitos, subiram mais de 50%!
Apesar destes aumentos a RTP continua a somar passivos.
Tenho hoje as mais profundas dúvidas sobre as vantagens do sector público português albergar uma televisão, com um canal público que seja. Não tanto pelo esforço que a todos exige ou porque as finanças públicas continuam de rastos. Mas sobretudo pelo que o Pinho Cardão testemunhou (desabafou?) aqui. Esperar-se-ia que o enorme custo de manter a RTP nas mãos do Estado tivesse como contrapartida uma programação melhor. Uma informação que não se pautasse pelo espectáculo pífio e deprimente, pelo sensionalismo e o imediatismo. Que fosse veículo de elevação do nível cultural dos portugueses.
Nada, porém, distancia a RTP (a 1, já que a 2, justiça seja feita, exibe alguma programação de qualidade) da SIC ou da TVI, em especial no que diz respeito à informação. As mesmas aberturas dos espaços informativos - sempre o que de pior tem a sociedade - , os mesmos alinhamentos, o mesmo padrão de entretenimento chocho, e sobretudo o mesmo alheamento de temas fundamentais para o nosso futuro colectivo e para a compreensão do mundo actual. A mesma aposta no telelixo, salvaguardadas excepções de raro bom gosto ou de elevado profissionalismo - que é justo reconhecer que o há na TV pública. A dificuldade de resistir ao voyeurismo dominante.

1200 milhões de euros seria, em qualquer circunstância, um montante astronómico face ao muito que há que fazer com os poucos recursos públicos. Mas assume uma proporção indecente em face da mediocridade que todo este dinheiro compra.

segunda-feira, 17 de setembro de 2007

A loucura da montanha russa em que vivemos...

A loucura colectiva em torno do caso da pequena Maddie não é um fenómeno único ou isolado. Mas em lugar de pararmos para pensarmos o que vai mal neste mundo apelidado de “moderno”, o que vemos é a alimentação de histerias colectivas em torno de circos de emoções e mediáticos. Um fenómeno assustador, impróprio para cardíacos, do tipo montanha russa!
Por isso, a propósito do caso Maddie pensei em partilhar uma reflexão que admito um pouco “teológica”, que foi suficientemente “louca” para parar e pensar por breves minutos.
Vivemos uma época em que o mundo parece enlouquecer, em que o quotidiano assume uma velocidade vertiginosa, em que as incompreensões e o egoísmo se tornaram traços banais, em que a inveja e a competição conduzem os homens por caminhos perigosos, em que a coesão das células familiares e dos grupos e comunidades locais vão dando lugar a uma cada vez mais impressionante dispersão familiar e social. É uma época em que os homens se tornam mais solitários e talvez mais perdidos, em que escasseia o tempo para pensar, em que os valores e as referências se estão a desvanecer, em que a verdade é cada vez mais a mentira, em que a tolerância deu lugar a uma ambição desmedida e em que os homens querem viver mais depressa a vida. É também uma época fascinante pelo progresso derivado das descobertas científicas e dos avanços tecnológicos, mas também aterradora se olharmos para os milhões de pessoas vítimas da violência causada pelas guerras e pelo poder ou pelas brutais desigualdades naquilo que são as condições mais elementares de uma vida digna.
Por tudo isto, e muito mais que poderíamos escrever para além desta pequena amostra que os meus olhos observam, a verdade é que muitas pessoas sentem a necessidade de parar, pensar, reflectir e escutar na mira de encontrarem alguma serenidade, tranquilidade e resposta para as suas interrogações no meio deste mundo turbulento. No fundo, as pessoas procuram na “espiritualidade” um contraponto ao “material” que perseguimos e que nos persegue na complexa sociedade em que nos inserimos, cheia de contradições e dificuldades.
Refiro-me àquela espiritualidade que nos ensina a sermos pessoas mais afectuosas, mais calorosas, mais compreensivas e mais tolerantes. A intensidade desta procura apresenta-se naturalmente com múltiplas matizes, sendo que parece razoável aceitar que há medida que vamos avançando na idade a força desta espiritualidade vai estando mais vezes presente e vai ocupando aos poucos parte do lugar do “material”. Também é natural que assim seja porque afinal a experiência da vida, a maturidade e o conhecimento acumulado permitem-nos observar a vida, a nossa e a dos outros, com mais paixão mas com aquele distanciamento que a sabedoria e os sentimentos mais nobres deixam que aconteça.
A responsabilidade dos mais velhos é, nestas circunstâncias, ainda maior. Ensinar aos mais novos essa espiritualidade significa transmitir-lhes a mensagem de que os valores são importantes. As gerações mais velhas poderiam ter um papel importante na “terapia” da loucura do mundo em que vivemos!

domingo, 16 de setembro de 2007

As velhas do soalheiro

As velhas do soalheiro passavam horas a fio a falar da vida alheia: de um ponto faziam um conto, que era ampliado ao sabor da imaginação e da capacidade de maledicência. As alcoviteiras passavam as histórias de povoado para povoado e às tantas o enredo já nada tinha a ver com o facto inicial.
Nesta era tecnológica, nada mudou. Ou melhor, o processo tornou-se mais sofisticado. As velhas do soalheiro, antes sentadas à porta e falando em segredo, passeiam-se agora de microfone em punho. Uma conta, outra compõe, uma amplia, outra recria, uma inventa, outra produz novos enredos da história. A primeira cita a sexta, a segunda, a quarta e a terceira, a sexta, vendo-se cada qual obrigada, para a coisa não perder interesse, em juntar-lhe mais um picante, quanto mais macabro e fantasioso, melhor, e que de imediato é reproduzido pelas outras. Antes limitadas à rua da aldeia, agora plantam-se em sítios estratégicos, em Leicester ou na Praia da Luz, de forma a cuscarem o que se passa ou não passa e a fazerem o relato, logo difundido urbi et orbi em tempo real.
As novas velhas do soalheiro não hesitam em contratar alcoviteiras imaginosas que possam dar novos palpites e alimentar a coscuvilhice, quando a matéria começa a escassear. E um novo élan nasce, pela reprodução dos novos factos assim fabricados.
As vítimas são espiolhadas, mal tratadas, massacradas. A sua vida publicitada, a sua intimidade revelada. Tornaram-se mero objecto ao serviço das velhas do soalheiro.
O caso da família Mc Cann é exemplar. Hoje li que a filha não aparece, porque a mandaram incinerar!...

A Dama Pé-de-Cabra


“Vós os que não credes em bruxas, nem em almas penadas, nem em tropelias de Satanás, assentai-vos aqui ao lar, bem juntos ao pé de mim, e contar-vos-ei a história de D. Diogo Lopes, senhor de Biscaia.
E não me digam no fim: - "não pode ser." - Pois eu sei cá inventar coisas destas? Se a conto, é porque a li num livro muito velho. E o autor do livro velho leu-a algures ou ouviu-a contar, que é o mesmo, a algum jogral em seus cantares.
É uma tradição veneranda; e quem descrê das tradições lá irá para onde o pague. (...)

D. Diogo Lopes era um infatigável monteiro: neves da serra no inverno, sóis dos estevais no verão, noites e madrugadas, disso se ria ele.
(...)Levantou os olhos para uma penha que lhe ficava fronteira: sobre ela estava assentada uma formosa dama: era a dama quem cantava.
(...) Só quando, à noite, no seu castelo, pôde considerar miudamente as formas nuas da airosa dama, notou que tinha os pés forcados como os de cabra.
(...) O barão olhou para ela: viu-a com os olhos brilhantes, as faces negras, a boca torcida e os cabelos eriçados.
E a mão da dama era preta e luzidia, como o pêlo da podenga, e as unhas tinham-se-lhe estendido bem meio palmo e recurvado em garras. (...)

A Dama Pé-de-Cabra, Romance de um Jogral”, Alexandre Herculano


É muito interessante verificar como as mais sólidas conquistas civilizacionais se evaporam num repente à primeira oportunidade. Corrijo: não é interessante, é assustador.
Desde tempos imemoriais e nos mais diversos contextos sociais e religiosos, a figura da mulher apareceu associada a poderes ocultos, pactos demoníacos, artificios suspeitos para conseguirem o que pretendem sem perder a aparência frágil e secundária do seu papel na sociedade.
A força do homem é glorificada, as suas fraquezas atribuidas a conjunturas que passam à história como reforço do seu heroismo mal compreendido ou vítima de forças adversas. As mulheres, pelo contrário, quando saem da obscuridade, logo se procuram razões suspeitas, passos falsos, infidelidades, poder de sedução ou mesmo centelhas demoníacas que, por mais que se faça, sempre lá estarão escondidas, quem sabe se numa permanente desconfiança do estranho poder de gerar vida. Ao longo dos tempos, e não vale a pena estar aqui a citar exemplos, filmes, livros e episódios históricos de caça às bruxas e fogueiras, muitas das adversidades foram atribuidas a estas germinações femininas, a alma sempre hipotecada ao diabo de forma explícita ou inconsciente.
A facilidade com que o caso McKann se centrou na mulher tem reflexos deste imaginário, criando insidiosamente a ideia de que nela é que está o mistério, que o marido é apenas o manipulado neste horror, tudo associado ao ar loirinho e limpo, que não trocou as roupas por farrapos negros, não rapou o cabelo no seu desgosto, ná, tudo aquilo evidencia um poder oculto que é preciso deslindar.
Vamos então agora caçar-lhe o diário. Ah, o diário!, essa tentação de espreitar o pensamento mais íntimo, o mesmo é dizer que está lá o inconfessável. Sim, diz o imaginário colectivo, se alguém – sempre uma mulher – escreve um diário, é porque tem consigo própria conversas que não pode ter com mais ninguém. E também porque não as consegue calar, tão fortes serão os seus impulsos. Um diário é a confissão de que há uma personagem oculta, logo, há algo a esconder, logo, há culpa concerteza. Vamos então abrir esse segredo e lê-lo com os nossos olhos, nós que sabemos agora que nada daquilo é inocente...
Suspeito que o que vier a público do dito diário conterá tudo menos “confissões” de mortes e tramas mórbidas, mas vamos certamente espreitar dúvidas, emoções, amarguras e alegrias que vão ser lidas como provas irrefutáveis de que a criatura não é tão inocente como parece, pois se disse isto e aquilo, pois se pensou tal e tal, como se atreve? Quem faz um cesto, faz um cento, está à vista. Nem nos lembramos que só um tonto é que deixaria esses registos à mão de semear, se estivesse lá o segredo já não haveria diário de certeza absoluta. Não interessa, todos sabemos que o que faz crescer água na boca é a espreitadela à intimidade, é a entrega à voracidade das multidões de uma pessoa desprotegida, “eis a culpada!”, vamos despi-la e vêr nas suas formas simples o ferrete de Belzebu.
Até hoje, como se vê e por incrivel que pareça, as mulheres são vistas com os seus pezinhos de cabra, o sinal do domínio do Maldito, como a lenda portuguesa glosada por Alexandre Herculano mas que corria de aldeia em aldeia contada pelo jograis da Idade Média.
Não há discurso de igualdade, de dignidade, de progresso, que apague esta crença de tempos imemoriais. Será que a civilização nunca deixará de ser uma fina camada de verniz?

sábado, 15 de setembro de 2007

Piolhos

"Oh, praga infame!
Oh, repugnante enfermidade!
Que torna os orgulhosos reis mais repulsivos do que mendigos (Envoltos em trapos, sacudindo as costas,
Atormentados por chagas piolhentas).
Tantas, que nem adianta esfregar,
Ou trocar camisas e lençóis de cama
Pois, como nas nascentes, a água segue a correnteza,
Enxame segue enxame, nascem os devoradores
Da própria carne frutífera, que (até a chegada da Morte)
Faz de si mesma um execrável festim."

De vez em quando, sou confrontado com situações pouco vulgares, mas que há alguns anos eram frequentes, caso dos piolhos.
Um jovem, todo aperaltado, apareceu-me com queixas de comichão intensa a nível da região púbica. Pelo interrogatório suspeitei que estaria face a um problema de pediculose púbica. Mas eis que, para minha grande surpresa, o jovem saca de uma pequena caixa de plástico. Ao abri-la disse: - Oh senhor doutor são assim, muitos e pequeninos! O fundo da caixa estava cheio de antipáticos e horríveis parasitas provocando intensa repugnância. – Oh homem feche lá a caixa, antes que algum salte! Expliquei-lhe o que eram e como se adquiriam. Ficou de boca aberta, dando a entender que, sendo assim, já sabia onde os tinha apanhado. Complementei a lição de parasitologia com as respectivas medidas terapêuticas. Nunca tinha ouvido falar em piolhos e quejandos!
Esta pequena história fez-me recordar alguns aspectos da história dos piolhos.
Guillame de Salluste, huguenote francês do século XVI, escreveu a obra “La Semaine” sobre a criação do mundo. “Piolhos, o castigo de Deus”, constitui um dos capítulos. Acreditava-se então que o mal dos piolhos,“ a mais horrível das doenças”, era um castigo de Deus aos tiranos, sacrílegos e inimigos da religião. Na antiguidade, Aristóteles foi um dos primeiros a referir-se a este mal, mas tinha outra interpretação para as causas, atribuindo-a ao excesso de humidade e à temperatura morna do corpo.
A história da medicina revela que se tratava de um verdadeira doença democrática, não poupando a realeza ou as classes mais baixas, cujos corpos serviam de pasto a milhares e milhares de piolhos. Apesar dos dramas, estes insectos repugnantes desenvolveram um papel muito importante na evolução da espécie humana. Como é sabido, os seres humanos, ao contrário dos seus primos antropóides, são desprovidos de pelos. O que levou ao desaparecimento deste revestimento tão característico das outras espécies? Segundo alguns autores, foi a necessidade de libertar as mãos para outras tarefas que não fosse o catar! Talvez sim, talvez não.
É curioso verificar que, nos antropóides, o acto de catar é uma forma de socialização, diminuindo a agressividade entre os membros, além de ajudar a estabelecer verdadeiras hierarquias. Ao perdermos os pelos, diminuímos os alimentos de tão repelente bicharada e, consequentemente, as mãos libertaram-se para permitir a humanização. Claro que os piolhos, mesmo assim, não abandonaram as suas “pastagens” preferidas, até porque o cabelo não desapareceu (apesar dos carecas), nem os pelos púbicos.
Os autores portugueses, quando queriam dar uma imagem social de repugnância, utilizavam a expressão “piolheira”. Fialho de Almeida e Raul Brandão utilizaram-na nas críticas e obras. Este último, nas suas Memórias, descreve que, em Junho de 1903, passou uma noite em casa do Columbano com o Rafael Bordalo Pinheiro. Conta que o artista das “Caldas” ouviu da boca do rei, em Paris, a seguinte expressão: - "Isto aqui é uma terra, lá é uma piolheira". Claro que uma expressão real desta natureza propagou-se de tal modo que ainda hoje é referenciada amiúde pelos nossos concidadãos, quando querem expressar de forma ultra-rápida a sua indignação e revolta. Presumo que não haja palavra tão rica e expressiva como esta: “piolheira”. E, com certificado real!
Os piolhos ainda andam por aí, banqueteando-se à maneira. Mas também não deixa de ser curioso que o acto ancestral de catar ainda permaneça na imaginação de muitos seres humanos, os quais não abdicam de continuar a usar esta técnica primitiva face a criativas “comichões”! Uns verdadeiros “chatos”…

Alice no jogo de espelhos


Eu, que sempre fui uma grande fã de contos infantis, banda desenhada, e todo o tipo de histórias de encantar, nunca consegui gostar da Alice no País das Maravilhas. Confesso mesmo que não li o livro de fio a pavio, sempre desisti a meio, e evitei cobardemente inclui-lo no reportorio das histórias que desfiava para entreter ou adormecer as crianças. Quando penso nisso, acho que essa história sempre me meteu medo.
Do lado de lá do espelho, Alice encontrou personagens que reconhecia enganosamente, porque tinham a aparência de simpáticos coelhos ou de cartas de jogar, mas afinal eram loucas ou perversas criaturas que entornavam o chá a ferver pela gola do casaco sem se queimarem, ou rainhas que queriam cortar a cabeça à menina. Na sua fuga por territórios desconhecidos, ou transfigurados, ela encontrava-se gigante ou minúscula, ora não cabia nas casas ou via inundações provocadas pelas próprias lágrimas, ora tinha a perspectiva da formiga.
Do lado de lá do espelho, a realidade era inversa mas parecia a mesma coisa. Ganhava uma vida absurda e incontrolável aos olhos de Alice, perdida no seu sono, impedida de gritar que não era nada disso, que todos estavam enganados e ela era só uma criança que queria voltar para casa. Mais ou menos isto, como disse, nunca li o livro de fio a pavio, se calhar uma parte disto é mais o que me aterrorizou do que propriamente o que está lá escrito.
Leio os jornais e penso na Alice no País das Maravilhas, do lado de lá desse espelho de papel o que é pequeno transforma-se num gigantão, o que devia ser grande reduz-se a um cantinho perdido, a um registo de nada, a um detalhe. E é preciso fazer um grande esforço para perceber se uns pais cuja filha desapareceu da cama onde dormia – desapareceu? Dormia? duvida o espelho – são pessoas destroçadas que lançaram mão de tudo o que se lembraram para recuperar a garota que amavam ou se são assassinos tortuosos, criaturas abomináveis capazes de germinar um plano que só não é diabólico porque nem o diabo era capaz de ir tão longe quanto o que o espelho nos quer mostrar. Um dia do lado de cá, os médicos pais são pessoas como nós, sentimos um arrepio gelado a pensar se alguma vez os nossos filhos ficaram sozinhos um segundo que fosse. Outro dia do lado de lá do espelho e o sorriso era afinal um esgar hediondo, uma máscara de cinismo cruel. Um dia do lado de cá e a polícia é distraida e lenta, um segundo do lado de lá e esses homens afinal descobrem indício insuspeitos, cabelos e células num carro que não existia, invocam farejos caninos de cheiros que se agarram como lapas quando do lado de cá do espelho os cheiros se diluem em pouco tempo sem deixar rasto. O mesmo se diga dos heróis um dia, bandidos noutro, team lideres num jogo, agressores a murro no outro. Amores perdidos numa página, ai onde é que eu deixei a revista do mês passado!, agora batalhas campais em vez das brancas grinaldas...
Folheio e lembro-me de Alice no País das Maravilhas, nada é o que parece, todas as formas são disformes, todos os tamanhos invertidos, todas as emoções enganosas. Leio os jornais, vejo a televisão, e só vejo a rainha de copas -mas não tem um coração?- a gritar “cortem-lhe a cabeça, cortem-lhe a cabeça!”
Não li o livro até ao fim, repito. Não gosto daquelas maravilhas, até o título é terrível. Creio que a Alice acabou por acordar debaixo da árvore onde se tinha deixado adormecer, muito tranquila. Mas nunca mais deve ter podido olhar as coisas mais simples sem um sorriso amargo de profunda desconfiança.

sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Serviço público de televisão?

O sujeito, ex-inspector da Judiciária, e que no DN sugeriu, de forma nojenta, como provas da culpabilidade dos Mc Cann na morte da filha, as contradições e incoerências que advêm da sua profissão na fé católica, a que me referi ontem, passou a ser visto como um consagrado opinion maker, agora na RTP. E no telejornal das 14 horas lá estava a dar a sua insigne opinião sobre a opinião de um outro ex-agente, este inglês, que relacionava de forma indiscutível as mortes de Madeleine e a de uma outra miúda no Algarve, Joana.
Em suma, e de comentário gratuito em comentário gratuito e de opinião não fundamentada em opinião sem qualquer base, aí vai enchendo telejornais a nossa estação de serviço público.
Não informa, intriga; não tem rigor, procura o sensacionalismo barato; não aprofunda, limita-se a exibir um novo-riquismo pacóvio.Uma informação repetitiva, feita como se falasse para débeis mentais, com as mesmíssimas boatarias, sejam elas produzidas nos estúdios, em Leicester ou na Praia da Luz, mas constantemente reproduzidas praticamente ipsis verbis, para dar menos trabalho.
Serviço público de televisão? Deixem-me rir!...

Telemóveis e girassóis, unidos pela causa do ambiente…

O que é que os telemóveis e os girassóis têm em comum? Aparentemente, nada. Mas vão ter…
Uma investigação levada a cabo pela Universidade de Warwick, em Inglaterra, conduziu à descoberta de mais um processo que permite uma combinação feliz entre a tecnologia e o ambiente que me prendeu a atenção por ter, aos meus olhos, algo de espectacular. É que vai ser possível plantar um telemóvel num jardim e depois nascer um girassol! Não, não é ficção. Vai ser uma realidade.
A fórmula mágica foi “incubada” por investigadores da Universidade de Warwick, em pareceria com a indústria de alta tecnologia e a indústria de telemóveis. São utilizados materiais biodegradáveis de última geração de modo a produzir uma capa para o telemóvel que contem no seu interior uma semente. Esta semente fica adormecida durante o período de vida normal do telemóvel, findo o qual o equipamento, depois de lhe ser retirada a bateria, é enterrado. Ocorre, então, um processo de degradação rápida, deixando livre a semente que, depois, irá germinar. Os investigadores optaram por sementes de girassol porque esta planta é a espécie que mais probabilidade tem de vingar nestas condições.
Com esta inovação é dado um passo importante para resolver o grave problema da reciclagem dos telemóveis.
Com efeito, os milhões de telemóveis que deixam de ser utilizados, porque avariam ou porque são substituídos por outros, constituem um problema ambiental muito sério. A velocidade a que os telemóveis se tornam obsoletos tem vindo a agravar-se em resultado da cada vez mais rápida evolução tecnológica e do desenvolvimento imparável de estratégias de marketing cada vez mais agressivas que conduzem os consumidores a trocarem mais rapidamente e mais vezes os seus telemóveis. Em Portugal o período de vida útil média de um telemóvel é inferior a dois anos.
Não há dúvidas que a inovação tecnológica pode fazer maravilhas. As questões ambientais que decorrem do progresso tecnológico estão na ordem do dia. A invenção agora anunciada poderá contribuir, assim, para ajudar a resolver ou a minimizar algumas das externalidades causadas pelos telemóveis.
Fica-me, no entanto, uma “semente” de dúvida, necessariamente ligada à minha dose de ignorância nestas matérias, sobre se os girassóis nascidos a partir de sementes de telemóveis serão totalmente "limpos"!?
Aguardemos, então, pelas primeiras plantações. Já me estou a imaginar em trabalhos de jardinagem “tecnologicamente avançados” nos canteiros da minha casa…

quinta-feira, 13 de setembro de 2007

“Rua da Adega”...

Ao longo da vida tenho ouvido as mais disparatadas explicações sobre certas doenças e a sua relação com o álcool. Algumas são mesmo divertidas, outras nem por isso.
Todo o cuidado na passagem de atestados médicos para efeitos de condução é pouco. Sabemos que muitos condutores, sobretudo os mais idosos, apresentam algumas limitações com efeitos nefastos para si e para os outros.
Um utente, esquecendo-se de renovar a carta, solicitou-me um atestado, porque fazia 65 anos. Não o conhecia. Entabulei a necessária conversa, enquanto analisava a sua ficha clínica. Foi então que lhe perguntei como estava o fígado. Respondeu-me que devia estar bem. – Mas não bebe, pois não? – Oh senhor doutor, para lhe ser sincero digo que quando a comida é “seca” bebo um copito. Mas só um! Ainda hoje almocei grão com bacalhau. Ora um prato destes “obriga-nos” a beber um copo. Mas quando a comida não é “seca” passo um ou dois dias sem beber. – O senhor não devia beber nada, porque as análises que fez há pouco tempo mostram alterações do fígado. Ficou sério, rematando: - Isso senhor doutor é culpa do sargento! – Do sargento?! – Claro! Foi em 1963. – Em 1963?! – Na altura tinha acabado de ficar apurado para a tropa, mas não queria ir para a Guerra. Então, um sargento disse-me o que deveria fazer: solicitar ao hospital militar exames médicos, dizendo que sofria do fígado, mas para isso tinha que o fazer “inchar”. – “Inchar” o fígado?! Como? – Respondeu-me com ar meio aborrecido: - Tomando todos os dias, durante uma semana, uma gemada feita com seis ovos, seguida de meio litro de aguardente. No último dia, já no hospital, bebi três quartos de litro. Ia morrendo! De manhã a cama estava toda suja. O médico descobriu a marosca e disse-me que se não me apresentasse no quartel ainda ia preso. Regressei logo. Em seguida fui para a guerra durante 28 meses. Para provar a veracidade da afirmação arregaça a manga do braço direito mostrando uma tatuagem de “África”.
Enquanto o exame decorria, a conversa continuou com as histórias da guerra, do vinhito pouco graduado que se fazia lá em casa e no imperativo em o beber, mas só quando as comidas fossem “secas”.
Comecei a preencher o atestado médico, ao mesmo tempo que lhe chamava a atenção para os cuidados a ter com a condução e o álcool. – Não há perigo! Eu bebo só um copito... Acto contínuo, interrompendo-o, lancei-lhe: - Quando as comidas forem “secas”! - Claro! E a seguir faço uma sesta. – Pois, pois!
Muito bem! - Tenho aqui o seu bilhete de identidade, mas preciso da sua morada. Onde vive? – Em tal parte, na Rua da Adega. – Rua da Adega?! - Mesmo a propósito...

A boçalidade do argumento

Começaram a proliferar os comentadores, com sustentadas análises sobre o desaparecimento da pequena Madeleine, agora na suspeita de que foram os pais os assassinos.
Hoje, um articulista que vem escrevendo diariamente no DN, ex-inspector da Judiciária, certamente à falta de outras razões, atira dois argumentos profundamente grosseiros e boçais para sustentar a culpabilidade dos pais, com base nas incoerências e contradições do seu comportamento.
Essas incoerências e contradições que o articulista genialmente descobriu advêm do facto de os Mc Cann professarem a religião católica.
A primeira relaciona-se com o facto de os Mc Cann irem rezar à Igreja da Luz. Para o arguto analista um católico não precisa de ir à igreja. O argumento é de peso, e transcrevo: “se Deus estará em todo o lado, não seria necessária a chave da igreja, porque as conversas com Ele podem ser mantidas em qualquer lado.”!...
A segunda relaciona-se com o facto de, e também transcrevo, a “ultracatolicidade do casal esbarrar sobremaneira contra a prática da inseminação artificial que, segundo a igreja é moralmente inaceitável.” Por acaso, mero acaso, não é essa a posição da Igreja. Mas que fosse?
No fim, não sei que mais lamentar: se o facto de argumentação tão primária ter sido escrita, se o facto de ter sido publicada!...