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sábado, 4 de abril de 2009

Pressionáveis

Vai por aí um enorme burburinho por causa de alegadas pressões sobre os procuradores encarregados da investigação do caso Freeport. Conta-se que a estes foram enviados uns recados por outro procurador sem procuração do ministro da justiça, ministro que terá sido encarregado do sermão pelo primeiro-ministro. Por causa disso, o presidente do sindicato dos procuradores, em vez de procurar outro procurador a quem endossar a queixa que os procuradores do caso Freeport lhe fizeram (como lhe impõe a lei, se a pressão tinha como intuito perturbar a investigação, como deixou entender), veio dizer que só a deposita em Belém e não na Rua da Escola Politécnica, certamente porque lhe disseram que em Belém reside o ´supremo magistrado´ da Nação...
Entretanto o senhor Procurador-Geral reuniu com os procuradores alegadamente pressionados e alegadamente pressionante, na presença de procuradoras coordenadoras, de onde saiu um comunicado onde todos procuraram (com sucesso) encarecer a importância de mais esta triste cena da ópera bufa em que se transformou a justiça criminal portuguesa.
Os media rejubilam com mais uns largos barris de escândalo, alimento garantido para as próximas edições, prestimosamente ajudados pelos membros do governo que já anunciam intentar processos judiciais contra meios de comunicação, como se o gesto fosse capaz de afastar a ignomínia em vez de amplificar a barulheira e acentuar a confusão.
Ironia à parte, no meio de tudo isto ninguém parece ter ouvido o bastonário da Ordem dos Advogados que, num momento de particular lucidez, disse o que se esperava ouvir da boca dos personagens desta nova estória. Esperava-se que dissessem que os magistrados - do ministério público ou judiciais - não são pressionáveis. Para aqueles que confessam ao sindicato o receio de ser vítimas das suas decisões, a solução é só uma: a mudança de profissão, desde logo por respeito a tantos procuradores e juizes que vêem na lei e na sua coragem as únicas protecções de que necessitam contra qualquer coacção ou tentativa de condicionamento, velada ou descarada.

8 comentários:

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Ferreira de Almeida,
O seu post tem duas ideias estranhas:
1. O conjunto dos procuradores não é humanamente igual aos outros conjuntos de pessoas, com bons, maus e médios;
2. Não há problemas em tentar fazer pressões sobre quem não se deixa pressionar.
henrique pereira dos santos

Capuchinho disse...

O Senhor Procurador Lopes da Costa terá dito que o Primeiro Ministro queria a coisa resolvida rapidamente: não pode nem deve dizê-lo o Procurador, nem o 1º MINISTRO, embora o que se diz seja correcto e uma evidência para todos, calculo eu.
Os procuradores encarregados da investigação foram a correr dizê-lo a 3ºs, ao que parece a começar pelo Presidente do Sindicato do MP, queixando-se que isso é uma pressão intolerável; não podem nem devem.
O Procurador-Geral a correr foi marcar uma reunião com os intervenientes ... para os conciliar. Não será essa a sua função de dirigente e zelador pelo cumprimento da Lei - a mediação de conflitos estará reservada para outros.
O Conselho Superior do MP reune e ... discute cenários.
Será que alguém no seu perfeito juízo e sendo responsável da Justiça põe algum senso nisto tudo ? talvez alguns dos que sejam bons e médios ?
Pressões sempre as haverá - vivemos num pais democrático onde as pressões são e devem ser as legalmente possíveis: identificadas e dentro dos valores de um Estado de Direito.
Mas será que alguém mais fale claro, para não estarmos sempre a defender o actual Bastonário da Ordem dos Advogados ?

Anónimo disse...

Meu caro HPS
O meu post deve ter, de facto, coisas estranhas aos olhos de muito boa gente, não só do meu Ex.mo Amigo. Aliás, cada vez mais me sinto um estranho nesta conjuntura.
Mas vamos ao seu comentário. Admito sim senhor que há procuradores bons, maus e médios. Acrescentaria os esforçados mas mediocres como em todas as actividades e profissões.
Porém, tal como quando viajo de avião desejo que aos comandos não vá um piloto mau, mesmo um esforçado mas mediocre, mesmo um piloto médio, também faço votos que o meu caro, ou alguém que lhe não seja indiferente, não tenha o azar na vids de cair nas mãos de um procurador mau, medíocre ou mesmo médio. Porque os procuradores, sobretudo os que investigam crimes e os juizes que os julgam, têm nas suas mãos a decisão sobre o que há de mais precioso na vida de um homem: o bom nome, a integridade, a honra e a liberdade. Por isso, os bons não se preocupam com as pressões, muito menos com a ameaça à sua carreira. Preocupam-se com os valores, preocupam-se com a lei pois a sua função é defender e proteger a legalidade, que o mesmo é dizer, aquele conjunto de valores que a sociedade elegeu como essenciais.
Segunda das observações ao seu apreciado comentário. Não há, de facto, qualquer problema nas pressões perante quem não se deixa pressionar. Em primeiro lugar porque só um incauto ou um tolo é que tentará condicionar um magistrado que sabe que não é permeável a pressões. Mas acima de tudo porque um magistrado que não se deixa pressionar não faz queixinhas a quem quer que seja, age de acordo com a lei que lhe determina que denuncie o atrevimento!

Meu caro Capuchinho, de facto nada disto faz sentido aos olhos de quem, a meu ver, é bem formado. Mas é mais um episódio a juntar a tantos outros que põem a nú a desgraça que se abateu sobre o sistema judicial. Vê o meu Amigo como o caro HPS franze as sobrancelhas de estrnaheza lendo o que escrevi. Não é seguramente o único a considerar estranho que se diga que um magistrado deve ser indiferente às pressões. Consigo perceber porquê. Tem-se repetido vezes e vezes sem conta que os juizes e procuradores não são imunes ao que os rodeia. E por isso as suas decisões não podem deixar de refletir o "ambiente" que os rodeia. De tanto se repetir esta ideia, julga-se que assim deve ser, e que nenhum problema vem ao mundo por assim ser. Quem pensa deste modo (e são já assustadoramente tantos!), não achará estranho um acórdão, recebido há uns meses, subscrito por desembargadores que fundamentavam a revogação de uma sentença da primeira instância, entre outras razões (nenhuma jurídica) no facto de ter acabado de assistir a uma transmissão televisiva onde se defendia uma determinada tese sobre o que deveria ser entendido como desenvolvimento económico e social que correspondia à sua própria convicção. A sentença que tinha em apreciação contrariava essa visão, e vai daí, sem qualquer preocupação de compulsar a lei, revogou-se a decisão da 1ª instância e substituiu-se pela visão contrária.
Neste caso (como noutros que poderia citar, como o da juiz que determinou a inutilidade de uma lide prosseguir porque leu no "Expresso" que o ministro já tinha resolvido o problema...), age-se ao invés do que muitas vezes vi afirmado, há uns anos atrás quando abracei a profissão, nas sentenças: independentemente das convicções pessoais do procurador ou do juiz, o único pré-conceito que vale num Estado de Direito, é o pré-conceito que repousa na lei e no Direito, aplicados aos factos que a prova, feita segundo o contraditório, permitiu apurar.

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Ferreira de Almeida,
Que um magistrado deva ser imune às pressões estamos inteiramente de acordo. Que lhes deva ser indiferente é que já não: tem a obrigação de as denunciar se forem ilegítimas (tal como o polícia de trânsito a quem um condutor faz uma proposta desonesta).
Que as deve denunciar nos termos da lei estamos inteiramente de acordo (não faço a menor ideia se terá sido o caso ou não porque não sei o que se passou).
Só que a questão de fundo não se prende com o comportamento dos magistrados, com a importante excepção da forma assumida pela denúncia, mas sim com o comportamento do automobilista que sugere ao polícia que não passe a multa a troco de qualquer coisa.
O que estranhei foi a minha leitura de que o seu post desvaloriza a tentativa (que não sei se houve ou não e não é isso que está em discussão aqui), coisa que, tanto quanto sei de leis, e é pouco, não é desvalorizada pela lei.
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Exactamente ao contrário do que extraiu do meu post, não julgo que que quem sofreu a pressão - se ilegítima, convém realçar - deva ignorá-la. Deve, ao invés, agir como a lei determina denunciando-a a quem de direito. Que, a meus olhos, não é o presidente do sindicato. Tal como, no exemplo que deu, o polícia que foi tentado a deixar-se corromper não deve contar a tentativa ao delegado da associação sindical da PSP lá da esquadra.
Mas isso sou eu que assim penso, eu que começo seriamente a julgar que venho de outro planeta...

Henrique Pereira dos Santos disse...

Estou de acordo consigo neste comentário.
Mas tenho dificuldade em ler apenas isso no seu post.
Como eu já disse, não sei o que se passou e portanto não tenho opinião no caso em concreto.
henrique pereira dos santos

carlos disse...

Pois parece que os dois procuradores que se sentiram pressionados informaram do facto a sua superiora hierárquica, Da. Cândida que se ficou por aí, tanto mais que o PGA se queixou disso.
Percebe-se assim porque é que a seguir foram ao sindicato e este ao PR. Se não o tivessem feito, é certo e sabido que a questão nem existiria e a Dra. Cândida continuaria toda gaiteira a correr para os microfones a desmentir quaisquer pressões.

Anónimo disse...

Meu caro HPS, com efeito não leu no post apenas o que reiterei no último comentário. Leu também que magistrados que se sentem desconfortáveis com as pressões externas ao processo, devem pensar em mudar de profissão como opiniou, certeiramente, o bastonário da OA. Era essa a mensagem principal.

Meu caro Carlos, não sei verdadeiramente o que se passou. Se, como diz, as alegadas pressões foram reportadas à hierarquia e nada se passou, a omissão será grave. Mas continuo na minha, que de resto só se refere ao caso relatado por estar na ordem do dia: um magistrado não pode sentir-se condicionado por factores externos ao processo, salvo em casos de coacção extrema que têm de encontrar nos mecanismos de protecção previstos na lei a resposta adequada.