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sexta-feira, 31 de julho de 2009

Verdade mentirosa, mentira verdadeira?

No Frente-a-Frente da SIC Notícias ouvi há pouco Joana Amaral Dias confirmar o que, segundo ela, já tinha dito há uma semana atrás: foi convidada pelo PS para deputada na próxima legislatura e rejeitou o convite.
Só me lembrei de escrever aqui esta passagem deste pobre folhetim PS/BE porque durante a semana que agora termina PS e BE se envolveram num “pugilato” político totalmente descabido com acusações mútuas, com o primeiro a negar ao segundo que não tinha feito qualquer convite, fora de questão, nem pensar, uma calúnia, uma mentira e o segundo atacando o PS, acusando-o do contrário, de afronta, de comportamento anti-democrático e vergonhoso, era o que faltava.
Um folhetim que quase teve “honras” de Estado vai-se lá saber porquê! Será que o caso ficou encerrado? Parece que não, que segue dentro de momentos…

Marcel Proust influencia programa de governo rosa?

1. Quem porventura ouça/leia as grandes linhas do programa eleitoral de governo (um programa prenhe de promessas de apoios) que tem sido muito comentado nestas últimas horas e não conheça a história política do País dos anos mais recentes, ficará por certo com a noção de que esse programa é apresentado por alguém que há muito aspira ser governo...e quer a todo o custo lá chegar!
2. Neste programa eleitoral abundam as promessas de felicidade para os cidadãos, oferecendo-lhes toda uma série de benefícios, nomeadamente na esfera social, que o executivo em funções deveria ter já implementado – caso evidentemente delas se tivesse recordado a tempo e horas e dispusesse de recursos para tal...
3.Nós, que temos o privilégio de conhecer a perfeita identidade entre os autores deste programa e os responsáveis do executivo desde há mais de 4 anos, naturalmente interrogamo-nos sobre as razões que terão levado um executivo em funções há tanto tempo a só agora se aperceber da importância de medidas que poderia muito bem ter aplicado – tanto mais que cerca de ¾ desse mandato (de 2005 até meados de 2008) decorreu em ambiente que não foi de todo de crise económica internacional...
4. Se boa parte desse mandato decorreu em ambiente não dominado pela crise e estas excelentes promessas foram olvidadas – ou não houve tempo nem recursos para as executar - como imaginar que as mesmas venham a ser executadas num período em que a crise vai ter uma influência dominante nas políticas e os recursos financeiros disponíveis vão atravessar o período de maior escassez de que há memória?
5. Agora que a crise económica, cuja duração efectiva se desconhece mas que poderá afectar seriamente a economia portuguesa – e as finanças públicas muito em especial – durante boa parte da próxima legislatura, torna-se muito estranha, incompreensível mesmo, a apresentação, pelo candidatura “incumbente”, de um programa social muito mais exigente em recursos...que todos sabemos não existirem!
6. Uma explicação para este enigma poderá estar num efeito Proust, sintetizado no título de uma das suas mais emblemáticas obras “A LA RECHERCHE DU TEMPS PERDU”...
7. Os autores deste programa – ou seja os mesmos que tiveram a incumbência de governar ao longo de mais de 4 anos – mostram súbito arrependimento por não terem concretizado um tão belo programa de governo durante o tempo que a Providência generosamente lhes concedeu...e aí estão eles, empenhadamente, A LA RECHERCHE DU TEMPS PERDU...

O Cro-Magnon de Vieira do Minho

Foi capturado um homem que andava foragido à polícia há dezasseis anos, depois de ter sido condenado a dez anos de cadeia pela morte de uma vizinha, segundo relata o Público de hoje. O que é extraordinária não é a persistência da polícia em perseguir o homem, - que fugiu da prisão depois de cumpridos dois anos e meio - uma vez que, ao que parece, ao longo destes anos fez buscas sistemáticas no encalço do foragido. O que é uma história digna de relato é que o homem era um pobre pastor que sempre viveu nos montes, no norte do País, e por ali ficou, vivendo em cavernas, isolado de tudo e de todos, apenas com um transístor a pilhas e um cão fiel, alimentando-se do que conseguia apanhar ou do que vizinhos antigos e família lhe iam deixar à socapa, como se fosse um animal bravio. Ao longo de dezasseis anos, muitos mais do que a pena a que estava condenado, viveu no terror de ser apanhado, rodeando-se de mil e uma cautelas para não deixar rasto e contando sempre com a cumplicidade do povo, que considerou que a pena era injusta porque a morte tinha sido acidental. No julgamento dos que o conheciam, era um bom homem, e por isso se uniram para o encobrir na estranha forma de liberdade que lhe restava. Nem por isso lhe evitaram a pena maior, a de viver um ostracismo desumano, mesmo na Grécia Antiga o limite para o exílio social era de 10 anos, sem que o banido se pudesse aproximar da cidade ou ser reconhecido como cidadão. Este pastor, que deu cabo da vida numa zaragata por causa de um rebanho, preferiu a sua liberdade fora do mundo, no meio de montes e vales que já eram o seu território, mas nem assim o longo braço da justiça o esqueceu no seu isolamento. Apanhou-o, depois de mais uma perseguição que deve dar um bom filme, doze agentes a escalar escarpas e galgar mato, armados até aos dentes, para sair vitoriosos da”Operação Cro-Magnon”.
A aldeia reagiu com hostilidade mas reconheceu com um suspiro de alívio que “foi uma obra de caridade” porque aquilo não era vida. Vai agora cumprir o resto da pena, como se esta meia vida de abandono e medo fosse só um pequeno desvio. Parece que se fartou de conversar com os agentes, talvez afinal ele próprio já não soubesse como sair da prisão ao ar livre em que se tinha metido, os atenienses lá saberiam como era cruel a pena de ostracismo.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

O absurdo Estatuto

Num assomo de espertalhonice saloia e pacóvia, o Partido Socialista, instrumentalizado pelos líderes açorianos que vêem no panache a razão de ser das suas vidas, insistiu na aprovação do Estatuto dos Açores, vetado pelo Presidente da República. Agora, o Tribunal Constitucional vem considerar inconstitucionais as suas disparatadas disposições, quanto à impossibilidade de a Assembleia da República proceder à revisão do Estatuto sem prévia proposta do Parlamento Regional, ou quanto ao facto de a dissolução da Assembleia Legislativa Regional ter um formalismo bem superior ao da dissolução da própria Assembleia da República.
Soluções absurdas, chamou-lhe o Tribunal Constitucional.
E o PSD também não está isento de culpa, ao ter aprovado na generalidade tão disparatado diploma. Em atenção aos que ameaçaram deixar o Partido, caso este não votasse favoravelmente o famigerado Estatuto. Uma indignidade de parte a parte.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

Descer os impostos: já não é irresponsabilidade? Será "apenas" insanidade?

1. Apesar de pouco dado a prestar atenção aos programas eleitorais de governo – ao fim de tantos anos temos de aprender alguma coisa, pelo menos saber (i) o que não interessa ler ou ouvir bem como (ii) distinguir aquilo que é simples encenação e uma proposta séria – uma notícia desta manhã buliu em especial com a minha sensibilidade.
2. Trata-se da promessa eleitoral de descida das taxas do IRS, anunciada pelo partido incumbente de Governo...
3. Promessa anunciada pouco mais de uma semana depois de o respectivo PM ter afirmado, solenemente, que descer impostos seria uma grave irresponsabilidade...
4. Assunto a que dediquei aliás um último POST, em 23 do corrente, intitulado “Política Orçamental: ideias clarinhas...como CARVÃO!”
5. Nesse POST procurei chamar a atenção para a contradição do discurso do PM quando proclamava, ao mesmo tempo, (i) a secundarização do objectivo do equilíbrio das contas públicas no contexto actual e (ii) a irresponsabilidade de uma eventual descida dos impostos...
6. Pois são estas mesmas excelsas mentes, cujo grande porta-voz, mentor e ideólogo há apenas uma semana anatematizava a descida de impostos...que agora vêm prometer uma descida dos impostos?...
7. Então a descida de impostos deixou de ser irresponsabilidade no curto espaço de uma semana?...Como é isto possível – será que o objectivo desta competição eleitoral é chegar ao zénite da insanidade?
8. Com este fantástico exemplo de rigor e coerência de ideias e propósitos, acham mesmo que vale a pena prestar atenção aos programas eleitorais de governo?

terça-feira, 28 de julho de 2009

Queria viver!

Gary Reinbach, um jovem de 22 anos, morreu por cirrose hepática. Bebia desde os treze anos de idade, altura da separação dos pais, e praticava binge drinking, como tantos outros jovens, independentemente da nacionalidade. Entre nós começa a ser, também, uma prática frequente, a procura da sensação de embriaguez imediata. Em consequência dos seus hábitos, Gary acabou por adoecer gravemente e, muito provavelmente, não deveria ter noção dos riscos que corria. Perante a situação só lhe restava a transplantação, mas foi-lhe negada, baseada no facto de não acreditarem na mudança dos hábitos do jovem. De acordo com as regras construídas por aquelas bandas, seria necessário que se mantivesse sóbrio durante seis meses. Mas como? Se o rapaz não chegou a sair do hospital! A mãe lutou pelo transplante e afirmou que o jovem queria viver. A situação causou polémica. Afinal, Gary merecia ou não uma segunda oportunidade de vida? Pessoalmente, penso que sim. Merecia. Mas foi-lhe negada, com base no pressuposto de que há poucos órgãos e que só devem ter acesso os que deem garantia de “bom comportamento”. No caso vertente, foi feito, por um jornal, um inquérito à população sobre se devia ou não receber um fígado. Surpreendentemente 60% afirmaram que não! Esta posição incomodou-me, porque há uma atitude moralista face ao alcoolismo do jovem. Eu pensava que o alcoolismo era considerado como uma doença, depois de durante muitos anos ter sido considerado como um vício, um pecado! Há um retrocesso que pode ser perigoso, ao associar certas situações a atitudes eivadas de moralismo. É certo que o comportamento determina muitos problemas, mas negar a “cura” com base na impossibilidade de mudança de hábitos é mau. Fiquei incomodado com a postura das autoridades médicas e da população inquirida. Como responderiam as pessoas que “negaram” a transplantação a Gary se este fosse filho, irmão ou neto, por exemplo? Diriam “não”? É óbvio que não! Moralistas de meia-tigela. Ainda um dia hão de sofrer na pele as consequências desta atitude. Quanto aos médicos, eu compreendo que a falta de órgãos é um grave problema. Mas as regras que construíram são imutáveis? Não! Evoluem e adaptam-se às novas situações. Neste caso concreto portaram-se como deuses negando o direito a viver. Será que se fosse outra pessoa teriam tido a mesma atitude? Não teriam mudado ou contornado as regras? Eu sei que os médicos das transplantações fazem milagres, que nem Deus consegue fazer, mas comportarem-se como seres divinos parece-me demais. Um dia corremos o risco de sermos tratados em função do nosso comportamento. Resta saber quem é que vai atestá-lo, e com que fundamentos!

Doutorado em improvisação!....

Hoje de manhã, o noticiário de uma estação de televisão apresentava uma qualquer senhora que, segundo ia ouvindo com pouca atenção, explorava tendências artísticas muito pessoais. Mas fiquei desperto quando, no fim da notícia, o jornalista referiu que a senhora era doutorada em improvisação!...
Para fazer jus ao nome, certamente que se trata de um doutoramento improvisado, noblesse oblige...mas talvez não muito diferente dos doutoramentos em série e por atacado, sonho que facilmente as Universidades satisfazem a qualquer recente mestre de Bolonha.
E mestre bolonhês doutorado obviamente não fica por aí. Improvisará de imediato um pós-doc como alternativa digna ao Fundo de Desemprego, mas que lhe garante uns anos de sobrevivência.
Afinal de contas, doutorados em improvisação é o que mais há. Mesmo sem queimar as pestanas a estudar tal arte!...

Parvoíce ibérica

Sintomático! Algo vai mesmo mal entre nós. O El País noticia hoje que “El 40% de los portugueses apoya una unión política con España”. O que é curioso é a perfeita indiferença dos espanhóis a esta posição. Entretanto, 89% dos portugueses apoiam a aprendizagem da língua espanhola e, mesmo, 50% consideram que deveria ser obrigatória. Do lado de lá, 76,2% dos espanhóis entrevistados rejeitam qualquer obrigação de aprender português, mas 97% têm a noção de que nós ganharíamos se uníssemos ao país vizinho.
Claro que eles já têm problemas de sobra, para quê mais um? Não são parvos, mas nós até somos...
Provincianos ibéricos!

domingo, 26 de julho de 2009

Respostas para o futuro...

Com o País em crise, ou melhor dizendo a braços com duas crises, a sua (estrutural) crise e a crise internacional, e com eleições à vista, o tempo deveria ser de profunda reflexão sobre o que correu mal nos últimos tempos que nos fez divergir da Europa e nos impede de encontrar um caminho de bem estar e de progresso sustentáveis.
O nosso grande problema é continuarmos sem discutir as questões essenciais, aquelas de que depende a viabilização da nossa economia, a criação de riqueza e a sua distribuição justa e equitativa.
Gostaria que os programas dos partidos, em particular do arco governativo, fossem capazes de apresentar e fundamentar a estratégia que defendem para o País. Entenda-se por estratégia um conjunto de grandes objectivos, que não podem naturalmente confinar-se a um ciclo eleitoral, e propostas de actuação para os atingir.
Mais do que os partidos se deterem em acusações mútuas, desacreditando e duvidando destas ou daquelas medidas ou antecipando medidas avulso, seria, isso sim, proveitoso que apresentassem um caminho coerente e sustentável para Portugal. É o que, admito, temos tentado fazer ao longo das últimas duas décadas, mas com fracos resultados.
O passado correu muito mal. Não estamos mais em tempo de tentativas e experimentações, do hoje fazemos assim e amanhã logo se verá, de agora avançamos por aqui e se amanhã for preciso recuamos. Precisamos de convicções acertadas e de firmeza.
Sem um rumo bem definido e igualmente bem informado e explicado junto da opinião pública é difícil conquistar a vontade e a confiança das pessoas. E sem a mobilização verdadeira das pessoas não iremos longe. Até porque as pessoas estão cansadas e desacreditadas e por isso o esforço para as mobilizar terá que ser cada vez mais maior.
Voltando às eleições e aos programas eleitorais e à eterna estratégia para o País que tarda em se impor, ocorrem-me muitas perguntas pertinentes para as quais gostaria de ter uma resposta. Aqui ficam algumas que tenho para mim, no momento em que vivemos, cá dentro e lá fora, como essenciais:
- Qual o modelo de desenvolvimento económico
- Que sectores da economia devem beneficiar do proteccionismo do Estado
- Que modelo de desenvolvimento regional
- Quais as funções do Estado e como devem ser exercidos os seus poderes
- Como enfrentar o problema do envelhecimento da população, designadamente a baixa da natalidade e o aumento da esperança de vida
- Que políticas para promover a inclusão social
- Que políticas para promover as potencialidades da sociedade civil, designadamente a solidariedade na sua componente económica
- Que políticas para educar para a cidadania
- Que políticas para preservar e promover a cultura portuguesa
- Como relançar os princípios tradicionais da ética social, como a transparência, a honestidade e a responsabilidade.
Vou estar atenta e aguardar…

De dedo acusador em riste

Esta época de crises e mais crises, e também de escolhas políticas para o futuro, é particularmente propícia a balanços, relatórios, análises e sentenças de toda a ordem. E é muito curioso repararmos na quantidade de pessoas que se colocam na confortável posição de “treinadores de bancada” quando na verdade são protagonistas plenos da vida política, económica e social, cada um no seu espaço. Mais estranho ainda é que esses grupos reclamam em geral um papel mais activo, o direito de serem ouvidos e de de serem chamados a participar nas decisões, mas o facto é que, quando chega a hora de olharem o que foi feito, excluem-se por completo da acção, é como se nunca tivessem estado na fotografia que analisam. Só isso explica como de tantas análises e balanços de analistas e da sociedade civil, resulte apenas um dedo acusatório apontado a todos os azimutes, menos aos próprios. Parece que tudo tem que mudar á sua volta, onde é que estaria o País se os outros fizessem tudo bem feito? Maravilha!Oiçam-se os empresários, os sindicatos, os docentes, os alunos, os directores, os empregados, os desempregados, os pobres, os ricos, os lideres, os magistrados, os polícias, etc. , todos ansiosos por que os outros se corrijam. O próprio Governo acha que fez tudo na perfeição, talvez uma ligeira sombra na cultura, rapidamente afastada pela próprio titular da pasta (em entrevista ao Público de hoje). Numa época em que tanto se discute a avaliação e os seus infinitos meandros, a auto avaliação parece o parente muito pobre, o único a quem nunca calha nada.
Hoje vi no Expresso notícia de mais um estudo, desta vez sobre o Índice de Perspectiva Profissionais (IPP), que dita a morte serôdia aos gloriosos yuppies, jovens cheios de titulos académicos e competências técnicas mas que fizeram história por serem impiedosos, competitivos e individualistas, para não ir mais longe. E que as empresas procuravam a todo o custo, não regateando salários nem prémios de resultados. Há muito tempo que se viu o resultado, mesmo muito antes da crise, lembro-me até que começou a ser recuperado, ao menos na teoria, um tímido Quociente Emocional (QE), como desejável adjunto do celebrado QI, para temperar as características do colaborador XPTO.Pois bem, agora, a pretexto da crise –e, claro, como remédio sine qua non – conclui-se que os hard skills, até agora conhecidas como competências técnicas e científicas, afinal não são tudo, e muito menos que devam concentrar as atenções das Universidades. Não, agora o fundamental é trabalhar as soft skills, anteriormente conhecidas pelas banalissimas capacidades de relacionamento humano, e esta é, insista-se, reconhecida como uma urgência para que as empresas passem a tirar pleno proveito das pessoas que tem ao seu serviço. Moral da história: “As Universidades não preparam os estudantes com as capacidades que as empresas procuram urgentemente”. Pois claro, e as empresas não desenvolvem esse ambiente porquê? Só agora é que notaram? Não recrutam pelas notas mais altas? Pela melhor preparação técnica? Não contratam os jovens com recibos verdes, com salários baixos (a geração mileurista, por cá reduzida a menos) exactamente o que convida a que não se envolvam, não arrisquem decisões, não invistam no médio prazo? Será que as empresas estão preparadas para valorizar os tais soft skills? Nada, sobre isto, nada. Seguro, seguro, é que os garotos não saem das universidades pronto-a-vestir, ora competentes, ora simpáticos, ora competitivos, ora solidários, ao sabor dos estudos, das análises e, sobretudo, da capacidade de encontrar sempre, mas sempre, alguém que devia ter pensado no assunto e não o fez. Um culpado, portanto. Assim, não vamos longe.

sábado, 25 de julho de 2009

Afinal, como é, o “problema” resolve-se com a Nossa Senhora ou com o Danacol?

Não tenho nada contra a publicidade, muito pelo contrário. Aprecio a publicidade que andam a fazer neste momento na rádio à “publicidade”, apelando à ética e ao rigor. Concordo! Tem que haver regras e ética na forma como se publicita um produto. Eu agradeço! Mas fico perturbado, e, até, indignado, quando fazem publicidade ao arrepio dos princípios mais elementares.
Acabo de ver na TV o cançonetista Marco Paulo a fazer publicidade ao Danacol. Nada de especial. Está no seu direito! Mas fiquei indignado quando faz referência à doença que sofreu há anos, cancro do intestino, dando a entender que aquele produto protege as pessoas deste tipo de cancro. Mas não é este o cançonetista que afirmou e afirma que quem o salvou foi a Nossa Senhora de Fátima? Não é este o cançonetista que canta e tece loas no santuário mariano na altura da peregrinação anual? Começo a duvidar deste senhor. Afinal, como é, o “problema” resolve-se com a Nossa Senhora ou com o Danacol?

A força das emoções...

Dançam e realizam acrobacias de patins, com movimentos tipo breackdance. São 60 segundos deliciosos com um grupo de bebés. Como é possível? São tão pequeninos!
Parecem verdadeiros, mas não são. Foram criados nos Estúdios Pinewood de Londres e fazem parte de uma campanha de marketing de uma marca de água mineral.
Cada vez mais a conquista dos consumidores passa pela criação de emoções, normalmente positivas, que induzem bem estar, boa disposição e alegria, esperança e até "sonhos", em que a criatividade e a inovação são capazes de fazer campanhas muito originais que de tão fantásticas e únicas as pessoas não esquecem. O objectivo é que as pessoas as associem ao produto ou à marca no momento importante da decisão de escolha ou que a marca ganhe notoriedade. Se conseguem ou não já é outra questão!
Mas uma coisa é certa, as emoções são mesmo importantes e a sua "manipulação" é cada vez mais uma arte!

"Sexta-feira sem carne"...

Ao começar esta crónica tenho que fazer uma declaração de interesses: sou um adepto de carne. Reconheço o papel da carne no nosso bem-estar e desenvolvimento. Se não fosse esta apetência, provavelmente ainda viveríamos paredes meias com os macacos e com um cérebro pequeno demais para poder pensar, criar e decidir. Acontece que nos dias atuais, falando do mundo ocidental, consome-se carne em demasia. Ao comermos carne em excesso, provocamos doenças nos nossos corpos e doenças no ambiente. Começando pelas últimas sabe-se que um dos principais gases com feito estufa tem origem nas vacas. Cada vez há mais vacas, logo, aumenta a produção do metano, o gás mais poderoso em termos de efeito estufa, mais de vinte vezes superior ao dióxido de carbono. As vacas eliminam-no de três maneiras: arrotando, deixando-se ir... e através de bostas fumegantes. Quem já teve oportunidade de “conviver”, por alguns momentos, com estes animais sabe do que estou a falar!
A necessidade de aumentar a produção de carne de vaca, de porco, de carneiro, as ditas carnes vermelhas, leva, também, a outras alterações ambientais, nomeadamente através da produção de cereais e diversos produtos vegetais com o objetivo de os alimentar, traduzidas na desflorestação e queimadas em várias partes do globo. Podemos comer um bife de vaca produzido com proteínas vegetais oriundas de um terreno agrícola nascido de uma queimada lá para as bandas da Amazónia! Daqui se infere outro tipo de perturbação ambiental, agravado, ainda, pelo facto de ser necessário muitos quilogramas de proteínas vegetais para produzir um quilograma de carne. Os cálculos da F.A.O. permitem afirmar que o setor agropecuário emite mais gases com efeito estufa que o setor dos transportes.
Face a esta realidade, alguns movimentos têm vindo a terreiro no sentido de reduzir o consumo de carne, e a produção agropecuária, promovendo um dia da semana sem carne. Na Inglaterra, o próprio Paul McCartney já aderiu ao programa “Segunda-feira sem carne”.
A par das doenças ambientais, acresce os problemas na saúde humana. Não deveríamos comer mais de meio quilo de carne por semana, dois quilos por mês, vinte e quatro por ano. No entanto, verificamos que os portugueses consomem, em média, 86 kg de carne por ano! Se atendermos ao facto de muitos nem de perto nem de longe atingem aqueles valores, então, é porque há pessoas que ultrapassam aquela cifra, já por si elevada, embora não tanto como os nossos irmãos espanhóis, verdadeiros lambões na matéria, com uma capacitação anual de 121 kg! Notável! Mas, afinal, quais são as complicações do excesso de ingestão de carne vermelha? Cancro dos intestinos. Esta praga é mesmo diabólica e, de ano para ano, tem vindo a aumentar de forma assustadora, tornando-se numa das principais causas de morte. Além do cancro dos intestinos, cuja importância é tal, que já começaram, e bem!, a fazer rastreios, as doenças cardiovasculares devem em parte a sua origem neste alimento, para não falar na sobrecarga que os pobres rins têm que suportar.
Face a estas evidências, faz todo o sentido, informar, esclarecer e educar as pessoas no sentido de terem mais juízo quando têm que lutar com um bom naco de carne. Os excessos pagam-se!
A tentativa de criar um dia sem carne é de incentivar, embora haja, como seria de esperar, reações opostas provenientes dos que têm interesses neste tipo de negócios. Mas isso é o habitual, seja tabaco, bifes, genéricos, pasta de dentes, vinho, etc. Quando se põem em causa interesses económicos há quem estrebuche, insulte e ameace. Depois, acalmam e calam-se!
A Inglaterra escolheu a segunda-feira e a cidade de Gante, Bélgica, a “terça-feira vegetariana”. Portugal, ou melhor Coimbra, podia associar-se a esta iniciativa promovendo um dia da semana sem carne, com o objetivo de ajudar a saúde do planeta e a nossa. Para o efeito, estive a pensar qual seria o melhor dia e conclui que deveria ser a sexta-feira. O nosso país, de tradição católica, caracterizou-se até há alguns anos por não se comer carne às sextas-feiras, mesmo fora da Semana Santa. Recordo que em pequeno a minha avó dava-me peixe frito, pescada ou bacalhau nesse dia. Torcia o nariz às sextas-feiras, porque não era amante de peixe. Safava-me o bacalhau, mas só se fosse assado! Ora aqui está uma medida a reativar adaptando uma tradição religiosa numa tradição ecológica.
Confesso que não estou muito seguro do sucesso de uma iniciativa destas, entre nós. São poucas as pessoas que irão ler esta proposta. Mas como começo a ser atrevido, proponho que os candidatos dos diferentes partidos à autarquia de Coimbra, adotem medidas desta natureza, simples, objetivas e suscetíveis de contribuir para a saúde do planeta e das pessoas. De qualquer modo vou tentar que cá em casa seja decretado a sexta-feira como dia sem carne. Uma espécie de casual friday gastronómica, em vez de não se usar gravata, deixar-se-ia de usar carne... Mas tenho que convencer o pessoal!

sexta-feira, 24 de julho de 2009

PPP e outros negócios com o Estado. - a emergência de uma fiscalização concomitante

Uma auditoria do Tribunal de Contas arrasou o negócio do terminal de contentores em Alcântara.
Ao longo destes últimos tempos o mesmo tribunal, em sucessivas auditorias, tem-se pronunciado sobre outros negócios do Estado, designadamente as PPP dos hospitais, grandes empreitadas ou concessões rodoviárias. A crítica é sempre a mesma: do ponto de vista do risco, os contratos celebrados não acautelam na devida medida a sua alocação nos adjudicatários.
Não discuto casos concretos. Nem tão pouco o rigor ou o alcance destas avaliações do tribunal. Mas a minha experiência profissional (de um lado e do outro da trincheira nas negociações) autoriza-me a dizer que é muito diferente a noção do equilíbrio contratual no momento das negociações ou quando se analisa o contrato já fechado e assinado, desenquadrado da ambiência e dos condicionalismos, quase sempre muito complexos, das fases pré-contratuais.
Nas negociações, o Estado é confrontado com esses condicionalismos. E de como eles afectam as propostas. São-lhe apresentadas provas - auditáveis, de resto - do limite do risco que pode e deve ser assumido pelo privado. E sabe, ou pode saber, que para além desse limite o negócio é inviável e nenhuma das partes - proponente ou Estado - retira vantagem, pela simples e elementar razão de que uma parceira ruinosa a prazo não aproveita a ninguém. Muito menos ao contribuinte, essa entidade absolutamente indefesa e por isso naturalmente propensa a considerar ruinoso qualquer contrato por mais justificado, legal e regular que seja.
Afinal, acontece nas PPP ou nas grandes concessões o que se passa em qualquer negócio entre privados em que as partes se esforçam por equilibrar o sinalagma de acordo com os seus interesses, mas também as suas possibilidades.
Vigora, porém, entre nós, o princípio da desconfiança na contratação pública. E se é este o princípio que leva a opinião publica(da) a pensar que em cada concurso germina a desonestidade, a falta de transparência, a incompetência, a deficiente defesa do interesse público, tanto mais intolerável quanto é certo que estão em causa dinheiros públicos, então não faz sentido manter o modelo de controlo sucessivo (da legalidade e do mérito) pelo Tribunal de Contas. Não faz sentido porque é inconsequente, ou, para utilizar locução cara aos auditores, ineficaz.
E também já se viu que a fiscalização preventiva, através do processo administrativo do visto prévio aos contratos, como condição de eficácia financeira dos mesmos, é incompatível com o estatuto de algumas das entidades públicas ou parapúblicas contratantes.
É tempo, pois, de fazer com que as actuações do Tribunal de Contas sejam algo mais do que afirmações pedagógicas de princípios, servindo, isso sim, de pasto às mais gritantes especulações, quase sempre fruto da ignorância que só não é chocante porque se tornou banal. Impõe-se um modelo de controlo concomitante dos grandes negócios do Estado pelo Tribunal de Contas, fazendo com que este órgão se envolva na fase pré-contratual, designadamente nas fases de escoha dos co-contratantes e, sendo caso disso, nas negociações.
Modelo inédito? Não. Em tempos que já lá vão, alguns institutos públicos responsáveis por adjudicação de contratos vultosos acolhiam na sua orgânica, a par do órgão executivo de gestão, um conselho administrativo onde tinha assento o delegado do Tribunal de Contas. A análise da legalidade dos contratos era assegurada por essa presença. Nada desaconselha agora que se vá mais longe, e que nas fases pré-contratuais esteja presente e participe técnico qualificado nomeado pelo tribunal, sob supervisão de juiz ou de secção criada para o efeito, com a missão de avaliar da legalidade ou do mérito fnanceiro dos contratos em gestação, à luz dos regimes jurídicos em vigor, designadamente do regime geral das parcerias público-privadas.
Para além da eficiência no controlo, algo de fundamental seria assim adquirido: a percepção por quem fiscaliza do caminho estreito que quem se senta à mesa das negociações por vezes é obrigado a percorrer para que os interesses das partes - de ambas as partes e não só do Estado - se equilibrem.
Só esse factor pode fazer toda a diferença não só no plano da utilidade e eficácia do controlo, mas também e sobretudo no acréscimo de confiança que deve merecer o instituto do contrato, como forma privilegiada de actuação convencional do Estado na satisfação de necessidades públicas.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Política orçamental: ideias clarinhas...como CARVÃO!

1. Numa recentíssima intervenção, o PM “incumbente” definiu dois grandes princípios inspiradores da política orçamental em tempos de crise: (i) a preocupação com o défice passa claramente para 2º plano porque há coisas bem mais importantes e (ii) seria irresponsável baixar os impostos.
2. Fiquei a pensar com os meus botões sobre a meridiana “clareza” destes princípios basilares de uma política orçamental supostamente em vigor - e para prosseguir, espera-se, após as eleições de Setembro próximo.
3. Não deixa de ser curioso que estes dois grandes princípios tenham sido ecoados pelos habituais media em tom seriíssimo, como de dogmas financeiros se tratasse. Neste capítulo sem qualquer surpresa, cabe acrescentar, já estamos habituados...
4. Temos pois que deixamos de ter qualquer preocupação com o défice...mas os impostos não podem baixar (nem que seja por um ano, acrescento eu) porque... certamente porque agravariam o défice!...
5. Ou seja, o défice não importa, num primeiro momento…para já ter toda a importância no minuto seguinte!
6. Dois pesos e duas medidas: (1ª) o défice não é nocivo se o seu agravamento for resultado de aumento da despesa e, como se constata este ano, de má execução do lado da receita...(2ª) o défice já incomoda se o seu agravamento for resultado de uma descida (irresponsável, claro...) dos impostos.
7. E não me venham dizer que o défice é virtuoso se for agravado pelo lado da despesa porque o Estado sabe muito melhor onde e como efectuar essa despesa em benefício da economia; e que o défice já não é virtuoso se resultar da baixa de impostos porque isso iria libertar rendimento para os particulares e para as empresas que não têm a mesma sabedoria do Estado, sobretudo em tempo de crise, na realização de despesa económica e socialmente útil...essa é que não!
8. Caricaturando, tudo estaria bem, no agravamento do défice, se forem executadas mais 150 rotundas para suprir a grave insuficiência que o País apresenta neste tipo de infra-estruturas...
9. Mas seria grave irresponsabilidade baixar por exemplo a taxa social única pois isso poderia estimular as empresas a não reduzir ou reduzir menos – ou quiçá a aumentar (não seria fácil) – o número de trabalhadores ao seu serviço...
10. Em matéria orçamental, a clareza - “clarinha como o carvão” - é, como se vê, a palavra de ordem!

Xiao Xiao


Xiao Xiao em chinês, ou Tiny (minúsculo), é um ratinho que nasceu das células estaminais da terceira via, ou seja a partir das células iPS (induced pluripotent stem cells), neste caso obtidas a partir das células da pele, mediante a junção de apenas quatro genes, os fatores Yamanaka.
Afinal é possível gerar um novo ser a partir de células tão fáceis de obter...
As “terceiras vias” estão a dar resultado, pelo menos na genética...

O que valem as promessas?

Desdobra-se o PS em promessas e alegados compromissos com o eleitorado, indignando-se porque os outros partidos não revelam os seus programas eleitorais, sinal de falta de ideias.
A propósitob disto, algumas interrogações.
O PS exerce há já quatro anos e meio, com maioria absoluta e cooperação presidencial nos assuntos fundamentais da governação, o poder. Três dos quais sem os condicionalismos da crise financeira e económica. Não se percebe porque não pôs o governo do PS em execução o que o PS vem hoje prometer. Que novas e favoráveis condições existem que não se verificaram durante toda a legislatura e impediram a concretização das medidas agora propostas?
Segunda nota para sublinhar a leveza e a inconsistência das propostas de novos subsídios aos mais carenciados, apoios às pequenas e médias empresas, melhorias nos serviços sociais, apoios à internacionalização das empresas, mais dinheiro para a cultura, reforço da investigação, etc., etc,. Baseiam-se em quê? Que dados, que estudos, e sobretudo que prognoses sérias permitem esta criativa torrente de benesses para todos, que o Secretário-Geral do PS vai diária e alegremente anunciando após cada sessão dessa verdadeira fonte de inspiração que dá pelo nome de Novas Fronteiras?
Creio que o cidadão comum, o eleitor que decide, já percebeu a falta de consistência deste discurso político. E estou convencido que não acredita nestas imaginosas criações saídas, de repente, dos think tanks constituídos à pressa para encher programas eleitorais.
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Quem queira afirmar-se pela diferença em relação à tradição da politica portuguesa, deve refletir nas palavras de Indira Ghandi que um dia dividiu as pessoas em duas categorias essenciais: "as que fazem as coisas, e as que dizem que fazem ou fizeram as coisas", aconselhando: "tente ficar no primeiro tipo. Há menos competição".

quarta-feira, 22 de julho de 2009

Fantástica falácia

O Ministro das Finanças disse ontem, e os media repetem, que o Estado perdeu 4,2 mil milhões de euros de receitas fiscais no 1º Semestre de 2009.
Fantástica falácia, que quase todos vêm aceitando!...
O Estado não perdeu nada, nunca perde nada. Tudo o que arrecada é ganho!...
O inefável Ministro garantiu ainda, e mais uma vez, que a despesa e as contas estão controladas. Mais uma prova de qu o Estado não perdeu nada!...

Flores para a Sílvia



Mais uma deslocação até ao Buçaco. Trabalhei e corrigi a minha parte do próximo volume da Quarta República. Em seguida, fui até à cascata e ao vale dos fetos. Uma tarde pouco quente para julho e mal vestida de cinzento, mas, mesmo assim, consegui, durante o passeio, que o sol fizesse a sua aparição, permitindo gozar com os belos jogos de luz e sombras. O sol desconcerta-nos quando quer, e quando nos ouve. Quando acabei de descer o vale, ao chegar ao lago, verifiquei a existência de um painel de azulejos com um poema, escondido entre a vegetação. Fiquei surpreendido. Tantas vezes passei pelo local e nunca o vi. Aproximei-me. Um poema escondido entre a folhagem, “Flores para Sylvia”. Assim que acabei de ler, transcrevi-o para o meu bloco de notas. Um poema lindo para uma Sylvia que não sei quem é ou quem foi. Também não interessa. O mais relevante é haver poetas que ainda cantam a Sylvias.

Tenho rosas encantadas
Que colhi à beira-mar;
Tenho saudades desabrochadas
Em orvalhos de luar;
Tenho a flor de salgueiro
Onde hoje ao por do sol
No seu canto derradeiro
Poisou um rouxinol
A cantar o teu sorriso;
Tenho lendárias flores
Caídas do paraíso
Numa nuvem de mil cores;
Tenho lírios do trigal
Carregados de perfume
Num florido morangal;
Tenho papoilas de lume
Num ramo de malmequeres
Mas no meu coração
Para um dia tu colheres
Tenho amor verde em botão.
(Carlos Lança, 82)

Retomei o passeio e rememorei as Sílvias que conheci, mas esbarrei de imediato com uma Sílvia, no meio daquela frondosa e viçosa mata, cheia de vida, de paz, bela e estranhamente tranquilizadora. Uma Sílvia que foi, e que continua a ser, alvo de amor e de muita ternura. “Um amor verde em botão” que conheci há já alguns anos e que a morte colheu de forma cruel, na flor da idade, uma criança. Foi colega da minha filha mais velha na escola. Nasceu doente, com cataratas congénitas, lesões cardíacas, problemas renais, foi operada, tinha dificuldades na expressão oral, mas intelectualmente era normal. E corria. Recordo-me bem. Corria de forma diferente, mas corria. E era muito alegre. Uma alegria que contagiava qualquer um. Um dia apareceu no jornal. Sim. A notícia da sua morte, devido a leucemia. Foi a minha filha mais velha que tomou conhecimento ao abrir um jornal. Um choque. Contou à mãe que recortou aquele quadradinho. Acabo de saber que conserva aquele pequeno pedaço de papel com a sua fotografia.
Estava longe, muito longe de recordar aquela criança de óculos especiais presos com um grossa fita à volta da cabeça, não fossem cair e danificar-se durante as suas correrias.
Rodeado de belas flores, que crescem ao longo do riacho e nas margens dos lagos, apeteceu-me oferece-las todas à Sílvia, “um amor em botão” que a morte não deixou abrir, que gostava de correr, de rir e de viver...

terça-feira, 21 de julho de 2009

Eleição de membros na AR para o Conselho Nacional de Ética

Acabo de ter conhecimento das personalidades eleitas pela Assembleia da República para fazerem parte do novo Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, seis notáveis que muito admiro e respeito.
Fiz parte do último CNECV, embora reconheça não ser um especialista na matéria, preocupo-me, e muito, com problemas bioéticos. O meu contributo foi escasso e acabei mais por aprender do que propriamente “ensinar”. Foi uma experiência muito enriquecedora, e desde já agradeço a todos os membros as atenções que me propiciaram.
Apenas circunstâncias ocasionais é que me levaram a integrar o conselho. Na altura, era deputado, e aliado à minha condição de professor e às minhas preocupações humanistas, alguém se lembrou de que seria uma mais-valia. Não tanto, mas tentei cumprir com as minhas obrigações. A lista, na época, foi elaborada em conjunto com membros indicados pela coligação PSD-PP e o partido socialista. Agora não sei se foi ou não uma lista em conjunto, ou se cada partido indicou os seus nomes. Não interessa. Os eleitos são merecedores de confiança, até, porque três são professores de ética ou bioética, nos Açores, Lisboa e Coimbra. No entanto, numa leitura mais atenta, estranho não ter sido indicado, nem para suplente, um professor de bioética, neste caso da Universidade do Porto, que tinha sido indicado pelo PSD no anterior conselho, o Prof. Rui Nunes. Rui Nunes é um bioeticista dinâmico e criativo, que tem contribuído de forma muito intensa na abordagem de vários problemas éticos, dos quais se destaca, por exemplo, o caso do testamento vital, só para falar do mais recente.
Não me move qualquer interesse pessoal, nem tão pouco sou procurador de quem quer que seja, mas deixar de fora alguém que tem pugnado pelo desenvolvimento da bioética - concorde-se ou não com as suas ideias, estilo e/ou comportamento -, parece-me um desperdício.
Sou militante do PSD, e nesta qualidade tenho o direito de questionar quais as razões para a não inclusão de tão iminente professor de bioética nas listas do PSD. Não me digam que tem a ver com o conceito de renovação das listas!! Estamos a falar de pessoas altamente experientes e dedicadas a áreas muito sensíveis e difíceis, e não de candidatos a deputados...
Repito, desconheço as razões, mas quero acreditar que foi apenas um tremendo esquecimento, uma falta de memória, que atinge os partidos em determinadas ocasiões...
Hoje apeteceu-me desabafar, usando algo que nunca pensei utilizar, ou seja, a minha condição de militante de um partido e o facto de ser ex-deputado. Mas faço-o, porque é um direito que me assiste! Estar calado? Para quê? Não é mais honesto, dizer o que pensamos? E prometo a mim mesmo que não vou ficar por aqui!

Notícias do passarito apressado


Cheguei aqui na 5ª feira de manhã, com armas e bagagens para uns dias de férias, mas larguei tudo na entrada e corri para o alpendre, a espreitar o ninho. Reparei logo nos vestígios de pássaro, bem evidentes na laje que eu deixei bem limpa no dia em que devolvi o pardalito ao seu ninho. Bom sinal, apesar de exigir nova acção da esfregona, mas é incrível como o que podia contrariar-nos nos dá uma alegria, depende do que se está na disposição de aceitar em troca de uma pequena vitória... Primeiro espreitei a medo, sem mexer na folhagem, para o caso de ele estar lá ainda com hesitações, -“Vou voar, não vou voar”, mas o silêncio era total e comecei a recear que ele tivesse morrido à fome, abandonado pela mãe em retaliação por eu lhe ter pegado sem luvas, contaminando-o com o cheiro humano. Ainda fiquei mais desconsolada com a minha ignorância qunado contei à minha filha a história do passarito e, quando lhe disse que o tinha ajudado a sair da relva, ela atalhou ansiosa: - “Espero que não lhe tenhas pegado com as mãos!” “_ Como é que sabes isso?”, perguntei pasmada. “- Ora, todos os escuteiros sabem isso logo quando são lobitos, não se pode tocar nas crias porque senão as mães não os reconhecem pelo cheiro, é isso que distingue uns filhotes dos outros, ou julgas que é pela beleza, como a história das corujinhas e da raposa? E não é só para os pássaros, é também para os outros animais, não se deve mexer nas crias...” Senti-me miserável, é o termo, miserável, e arrependi-me logo de não ter ido mais vezes àqueles encontros de famílias de escuteiros, onde podia ter aprendido coisas muito úteis.
Bem, mas apesar daquele sinal de esperança no chão do alpendre, o facto é que o ninho estava vazio, irremediavelmente vazio. Afastei as folhas já sem cerimónias, para averiguar outros sinais da história vivida longe da minha vista, mas felizmente não havia nada que me leve a suspeitar de um fim desgraçado, ao abandono. Ainda havia uma migalhinha de pão, mas eu deixei várias, de que não havia rasto. Além disso nunca vi gatos a rondarem o jardim. E uma ou outra formiga a passear na alcofa de pássaro não significava nada, de contrário haveria imensas, como já vi uma vez num caso mais infeliz.
Tudo visto, conferenciei com a família e passámos busca minuciosa ao jardim, cruzando os dedos para que a busca fosse vã e o pardalito tivesse conseguido voar para além da sebe alta que limita o território, pequeno mas cheio de canteiros e flores onde se podiam esconder os restos de um passarito mal fadado. Nada, não encontrámos nada.
Portanto, não há notícias, o que poderemos tomar como sendo afinal boas notícias. Quem sabe?, a estas horas anda ele por aí, já não era assim tão pequeno,talvez até tenha ficado a olhar curioso, com a cabecita de lado, ao ver-nos a passar revista ao jardim, as folhas velhas a crescerem num monte no meio da relva, a que propósito andam eles a limpar os canteiros com este sol? Os pássaros pequenos são assim, dão-nos preocupações, pregam umas partidas e depois ainda ficam a rir-se de nós, com ar traquinas, no alto do poleiro onde se sentem a salvo de mãos abelhudas e impacientes...E nós perdoamos-lhes todas as traquinices, contentes por os vermos a salvo e a jurar a nós próprios que para a próxima não nos apanham desprevenidos, quando quiserem voar antes de tempo....

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Sopa

Um dia destes acordei de manhã no preciso momento em que estava a sonhar que comia uma sopa cremosa, fumegante, colorida, sabores múltiplos, dos quais se destacava a hortelã-pimenta e dois nacos de uma carne esbranquiçada que se desfazia docemente na boca. À mesa, muitas pessoas a discursarem, enquanto eu, contra toda a etiqueta, ia saboreando sofregamente a misteriosa receita, tentando matar uma fome insuportável e deixando a retórica para os outros. Acordei com fome. Estranho sonho. Nunca me tinha acontecido semelhante coisa. Claro que se me perguntarem se gosto de sopa, digo logo que sim. E é raro não gostar, agora!, porque em criança levava de vez em quando uns calditos, mas não eram de galinha, para a comer. Pensei: - Qual terá sido o fator que desencadeou o sonho? De repente, lembrei-me que antes de deitar tinha lido vários artigos, um dos quais me levou ao passado e que tinha a ver com uma outra sopa, a “sopa primordial” de Stanley Miller que, em 1953, com apenas 23 anos de idade, efetuou uma interessante experiência em que conseguiu produzir alguns aminoácidos. Mediante descargas elétricas num recipiente de vidro que continha água, amónia, metano e hidrogénio, matérias-primas abundantes no início deste planeta, simulando a hipotética atmosfera da altura, produziu as primeiras moléculas orgânicas. Ainda era muito novo quando ouvi que tinha sido realizada esta experiência. A minha mente juvenil, treinada na criação do mundo de acordo com as regras da época, levou-me a associar a tal “sopa” às minhas intolerâncias com algumas sopas de que não era propriamente adepto, retirando, confesso, uma fabulosa sopa de feijão que a minha avó fazia. Tirando esta, só um caldito de cebola para os momentos de doença, quanto às restantes não era propriamente um gourmet, muito pelo contrário, nomeadamente quando tinha nabos e couves duras. No tocante aos caldos de galinha, aqueles olhos de gordura a boiar fitavam-me de tal modo que ficava sem apetite, isto para não falar dos ovinhos que descobriam dentro do animal. - Sopa!? Repeti, quando ouvi o professor na tentativa de nos iniciar nos mistérios da ciência. Sopa da vida, dizia! - Afinal Deus começou a vida com uma sopa ou moldou o homem com o barro? Perguntei, meio confuso. Mas a pergunta foi mesmo no sentido literal. Barro com que fazem os bonecos, os cântaros e os púcaros e sopa do género batata, feijão, couves, nabiças, cenouras, azeite e muitos outros produtos. Quanto à descarga elétrica, interpretei-a como sendo o equivalente de calor para cozinhar a sopa, à falta de um fogareiro. Mas não, como depois percebi, tratava-se de um outro “cozinhado” cujo impacto era muito mais profundo do que poderia pensar ao princípio.
Afinal andavam a “dar sopa”, mas esturricada, a saber a “bispo”, expressão que sempre ouvi lá em casa mas cuja origem desconheço. As expressões sobre sopa não ficaram por aqui. Na adolescência, quando um jovem queria pedir namoro a uma rapariga e esta não ia na cantiga, a rapaziada gozava dizendo: - Então? Deu-te sopa! Desconhecia as razões por que diziam isto! Dar sopa é oferecer um alimento muito útil e importante à saúde. Descoberto ou construído, sabe-se lá quando, talvez no Paleolítico, quando alguém colocou um pedaço de carne em água a ferver. Nascia o caldo. De qualquer modo, os gregos aperfeiçoaram esta técnica, a tal ponto que criaram o Caldo Negro de Esparta, que devia ser um caldo que era incapaz de comer; sangue de animais, vinagre e ervas aromáticas que tornava os espartanos naqueles doidos quando iam para o campo da batalha, desprezando a vida. Bah! Deviam era desprezar o raio do caldo, pois devia ser melhor morrer do que prová-lo!
“Molhar a sopa” é uma expressão muito utilizada quando alguém se lembra de fazer confusão. – Então! Também foste molhar a sopa? Hoje em dia é o que se vê mais por aí, pessoal a “molhar a sopa”, a torto e a direito, tamanha é a confusão. Há quem “engrosse o caldo”, na cozinha com fécula da batata, mas na vida social como forma de provocar uma discussão desagradável. Claro que há muitos que não têm qualquer pejo em “entornar o caldo”. Quando se fala de sopas pensa-se logo nos pobres, ao ponto dos portugueses terem instituído oficialmente a “sopa dos pobres” que continua hoje sob formas e designações diferentes. Recordo-me inúmeras vezes os pobres da minha juventude que batiam à porta e pediam um prato de sopa. E davam, acompanhado de um bom naco de pão.
Muito se pode dizer ao redor deste alimento curioso e promíscuo, no qual inúmeros gradientes em doses e combinações variáveis permitem produzir tão variadas e agradáveis sabores e texturas.
A vida depende da sopa, que digam os bebés na sua verdadeira iniciação ao mundo. Sopa, fonte da vida. Sopa, alimento saudável, a “tranca da barriga”, capaz de despertar emoções e sentimentos ao ponto de fazer inveja a qualquer memória proustiniana e até científica...

Guerra civil à vista? Então "às armas"!

1. Quem fala de cenário iminente de “guerra civil”, de forma algo surpreendente, é a Administração nomeada pelo BdeP para o Banco Privado Português (BPP) em Dezembro de 2008, no comunicado em que hoje anuncia a sua decisão de se demitir das funções para que foi nomeada.
2. De forma também surpreendente, o BdeP vem logo a seguir informar que não aceita a demissão do Conselho de Administração por si nomeado...
3. O problema é que a Administração do BPP deixa claramente a entender não estar a fazer nada no Banco – estará a assistir ao seu desmantelamento provavelmente – depois de os vários planos de salvamento que apresentou (quatro ao que parece) terem sido sistematicamente recuados pelas autoridades do sector...
4. Ao mesmo tempo o Governo reitera que não tenciona envolver dinheiros públicos nesta Instituição depois de ter (i) prestado uma garantia de € 450 milhões para um empréstimo que serviu para pagar a determinados credores comuns (esquecendo outros?) e de (ii) ter aceitado a nomeação de um Conselho de Administração da confiança do BdeP não se percebe agora muito bem para quê – a não ser para responsabilizar mais o Estado, evidentemente...
5. Aberto desta forma o cenário de insolvência, é pois a própria Administração do BPP que antevê um “cenário de guerra civil” para o caso de essa insolvência vir a acontecer...
6. Julgo que haverá fartos motivos para lançar desde já o grito de “às armas!” do nosso Hino Nacional...considerando que em tal cenário de guerra civil valerá com certeza o velho aforismo “homem prevenido vale por dois”...
7. Alguém consegue perceber esta "alhada" em que o Estado se envolveu?!

domingo, 19 de julho de 2009

O Relógio de sol


Esta coisa de andar a escrever para adultos tem muito que se diga. Há quem se queixe de que andam “esquecidos”! Sendo assim, o melhor é começar a ensaiar para ofertar aos netos pequeninos alguma prosa que os possa motivar para as letras e escritos. Não sei se é a primeira vez que se publica neste blog um post-conto para os mais pequenos. A Quarta República não pode esquecê-los. Eu, pela parte que me toca, nunca os esquecerei...

Um dia, uma menina foi fazer uma curta viagem com o seu avô. Entraram os dois num pequeno jardim, no meio do qual estava uma coluna com um estranho cubo em cima. As quatro faces tinham riscos, números, além de placas de metal que pareciam velas e letras. A menina perguntou ao avô o que era aquilo. O avô respondeu-lhe que era um relógio de sol, ou melhor quatro relógios de sol. – Relógio de sol? Questionou a petiza. – Sim. O sol ao fazer sombra com as plaquinhas marca as horas do dia. É muito simples, explicou o avô, o sol anda e a sombra vai-se modificando. – Ah! E o que dizem as letras, avô? - Aqui, neste lado, posso ler “Boas e más eu marco as horas, tanto melhor se ris, tanto pior se choras”. Oh avô explica lá isso melhor que eu não percebo. – Como já sabes o relógio marca as horas. Não é verdade? – Sim. – Ótimo. Tens que aprender que na vida das pessoas há momentos bons e momentos menos bons. Já tiveste alturas em que choraste por estares triste? – Já. – Bom, então podemos dizer que são horas más. E não tiveste momentos em que te sentiste alegre? – Já. Respondeu novamente a neta. - Então, o que é que tu não entendes? – Aquilo que leste “tanto melhor se ris, tanto pior se choras”. Hum! Como explicar-te? E se perguntasses ao sol? – Ao sol? – Sim, fala com ele. – Como?!– Olha, eu sei que o sol fala, mas só às crianças e desde que nenhum adulto esteja por perto, por isso eu vou deixar-te por uns momentos no jardim e vou ali - estás a ver aquele banco lá no fundo da alameda? -, falar com velhos amigos. Não te importas, pois não? Mas não saias daqui. Eu fico a vigiar-te para ver se fazes alguma asneira. E o avô afastou-se por uns momentos. A menina, quando viu que o avô já estava um pouco afastado, e sem olhar para o sol, porque faz mal aos olhos, virou-se para a coluna e perguntou: - É verdade que tu falas com as crianças, sol? – E ouviu por detrás da sua cabeça: - Claro que falo e ouvi perfeitamente a conversa que estavas a ter com o teu avô. Então queres saber o que significa aquela frase “tanto melhor se ris, tanto pior se choras”? Olha, se rires nunca envelheces, ficas criança para toda a vida, porque quando ouço uma criança a rir faço parar o relógio. Não te esqueças que eu “sou a alma do tempo”. Mas quando choram, fico com pena e acelero o tempo para que as pessoas não sofram muito. Acontece que, quando acelero o tempo, para que passe depressa e as pessoas esqueçam as suas horas más, provoco o aparecimento das rugas. – Ah! Então é por isso que o meu avô tem muitas rugas? – É. Mas se reparares bem, por dentro o teu avô não tem rugas, o tempo parou e é uma criança. E sabes que é por causa disso que tu gostas tanto dele? Foi então que a menina viu aproximar-se o avô e lhe disse que já sabia. – Ah! Já sabes? Então explica-me. As rugas da tua pele são as horas más e as tuas brincadeiras de que eu gosto muito são as horas boas. Avô! Eu não quero que tenhas mais rugas, vamos brincar os dois? – Vamos pois, disse o avô! E foram deixando para trás os quatro relógios de sol. O avô esqueceu-se de ler à neta que noutra face estava escrito o seguinte “A minha alma é o sol”. Para o relógio o sol era a sua alma, mas para o avô o sol era a neta. Um dia ficará a saber...

sábado, 18 de julho de 2009

Mais vale tarde do que nunca...

Muito raramente vou às praias da Costa de Caparica. A razão é muito simples, é que a Costa de Caparica é um verdadeiro inferno, um atentado ao ambiente e ordenamento do território, uma ameaça à qualidade de vida e bem estar das pessoas, é um desafio à tolerância e paciência dos cidadãos e dos contribuintes.
Mas hoje lá fui, um pouco contrariada, com aquela ideia de lá vou eu meter-me em engarrafamentos, na poeirada e no meio da confusão. Mas tinha que ser porque os amigos não têm culpa e gostos não se discutem.
Passaram-se décadas e não fomos capazes de impedir a degradação da fabulosa costa da Costa de Caparica, deixámos avançar o betão e de forma anárquica, como já vem sendo hábito pelo país fora, e deixámos que as areias fossem levadas pelo mar. Pouco ou nada fizemos para fazer a sua reabilitação urbana e valorização ambiental e, em particular, para oferecer aos habitantes de Lisboa e Almada e ao turismo local a fruição de um espaço de veraneio que tinha (ou tem) todas as possibilidades de ser um ex-líbris.
É nestas coisas que podemos bem avaliar a facilidade com que embarcamos, anos após anos, em políticas medíocres, incapazes de travarmos os erros da destruição do ambiente, do desordenamento do território e da “diarreia” do betão e pouco exigentes no conceito de bem estar e de qualidade de vida.
Portugal tem uma costa maravilhosa, o mar, as falésias, as arribas, as praias, a vegetação, as vistas e muito mais. É um privilégio que deveríamos acarinhar e aproveitar com todo o respeito. Não tem sido assim, muito se tem destruído e de forma irreversível. Somos ingratos e incultos.
A Costa de Caparica é, para a minha geração, um caso chocante, uma vergonha. Passaram-se décadas e o espectáculo não acabou. É um desastre urbanístico desde que me conheço.
Mas parece haver agora uma luzinha ao fundo do túnel. Fiquei agradavelmente admirada com a reabilitação da zona dos pontões que se desenvolve para norte da vila da Costa de Caparica numa extensão de várias centenas de metros. Foi feita uma limpeza geral urbanística em redor e recriada uma vasta zona, supostamente, verde na qual se adivinham árvores e arbustos recentemente plantados, foram construídos bons acessos para automóveis, bicicletas e zonas pedonais, incluindo amplos parques de estacionamento bem empedrados com estruturas modernas de protecção solar, foi construído um passeio marítimo com acesso às praias servido por equipamentos de restauração uniformes na sua arquitectura e de design simples, bem integrados na paisagem marítima, e foram aumentadas as áreas úteis de areia para os banhistas. Reparei nos ecopontos estrategicamente colocados.
Enfim, o que vi, sendo uma pequena intervenção em relação à dimensão do problema que se estende ao longo de toda a costa - da Trafaria até à Fonte da Telha - representa um volte face em relação ao estado de coisas prevalecente.
Fui informada que a reabilitação operada foi realizada ao abrigo do Programa Polis, através de um papelinho que se encontrava pendurado no vidro do meu automóvel que avisava que dentro em breve o estacionamento seria cobrado.
Tenhamos, pois, esperança que a operação de requalificação se estenda por toda a Costa de Caparica. Depois de décadas de desvario urbanístico e desmazelo ambiental, ainda assim mais vale tarde do que nunca!

sexta-feira, 17 de julho de 2009

O acordo de honra!...

Como o Ferreira de Almeida referiu no post anterior, Helena Roseta fez um "acordo de honra" com António Costa. Se este, que é o número 1, sair da Câmara, Helena, que é o nº 2, também sai.
Se Roseta está, como disse, tão preocupada com os lisboetas, como se compreende que também abandone o barco, se o capitão nadar para outro porto?
Acordo de honra, a sério, seria com os eleitores, não com António Costa.
Enfim, negócio particular travestido de "acordo de honra", a aumentar a desonra dos políticos que a tal se prestam.

Lisboa e seus amores

"Quem me quiser apoiar livremente que o faça, mas não vou sentar-me à mesa de negociações com ninguém. Quero manter a nossa autonomia" - Helena Roseta ao DN de 2 de Abril de 2009.
Volvidos três escassos meses, num destes últimos dias Roseta caiu em si. Uma súbita epifania (as epifanias são por definição inesperadas, e então na política...) fê-la ver que o acordo com o PS (o partido que esteve na origem da sua candidatura independente) é agora um imperativo, quiça um desígnio, já que a fragmentação do poder na autarquia nos últimos dois anos comprometeu muitas realizações: "Houve uma data de coisas que não se puderam fazer.". - DN de 17 de Julho de 2009.
A senhora Arquitecta anuncia ainda que se acontecer alguma coisa a Costa (de bom, é o que aqui desejamos) que o afaste da presidência da Câmara caso seja eleito, que não, que nunca irá ocupar o seu lugar e que existe, firme, um "acordo de honra". Tudo por Lisboa a que se dedicam os cidadãos que a apoiam.
O amor a Lisboa faz estes milagres de desprendimento e esvaziamento da ambição pessoal, em primeiro lugar; e de coerência em segundo, mas não menos importante.
Nada que a política feita com amor e exemplar afirmação de princípios não nos tenha já habituado.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Descomplexificar diz a OCDE...

A OCDE produziu um estudo a pedido do Ministério da Educação para avaliar o modelo de avaliação dos professores. Não conheço o estudo, mas a leitura que fiz de várias notícias publicadas sobre o diagnóstico feito pela OCDE e as recomendações apresentadas leva-me a confirmar que alguns dos problemas encontrados no modelo de avaliação dos professores são um clássico.
Quero com isto dizer que sempre que é concebido e implementado um modelo de avaliação do desempenho, em particular quando estamos perante organizações que não têm tradição ou maturidade na avaliação do desempenho e em que a gestão por objectivos não está institucionalizada, há um conjunto de cuidados a observar que, naturalmente, não podem igualmente ignorar as especificidades e a maior ou menor complexidade das organizações em causa.
Ora, as recomendações da OCDE revelam justamente aspectos que não foram adequadamente avaliados ou tratados. Vejamos o impacto gerado pelo facto de alguns desses aspectos não terem sido devidamente acautelados. A aceitação e o sucesso de um modelo de avaliação do desempenho implicam:
- O envolvimento dos profissionais abrangidos, avaliados e avaliadores, quer dizer, a compreensão do funcionamento do modelo, a percepção das vantagens e dos benefícios. A OCDE confirma a resistência que o modelo encontrou junto das escolas e dos professores pela falta de percepção das vantagens e das razões da sua importância para o ensino.
- Que as estruturas e profissionais envolvidos estejam preparados para aplicarem e gerirem o modelo. Normalmente, a implementação destes modelos implica formação para avaliados e avaliadores, não apenas no que se refere à gestão do processo, mas em particular em termos de construção de uma atitude e vontade pró-activas de contribuir para melhorar o desempenho individual e o desempenho colectivo. A OCDE refere, com efeito, o facto das escolas e dos professores não estarem preparados para a complexidade do modelo.
- Que os critérios e a cascata da sua ponderação sejam simples, claros e transparentes. A OCDE recomenda, justamente, a simplificação do modelo que se afigura complexo, mesmo considerando as “simplificações” que o Ministério da Educação introduziu na versão inicial.
Há depois outras recomendações apresentadas no estudo com as quais concordo, que em princípio tendem para credibilizar e fornecer mais confiança ao modelo, com resultados benéficos nos níveis de motivação e predisposição dos professores, e que podem contribuir para ultrapassar algumas das tensões que explicam a contestação ao modelo de avaliação do desempenho. Essas recomendações dizem respeito ao recurso à avaliação externa no que se refere à avaliação dos professores para efeitos de progressão na carreira, à maior autonomia da escola na condução do processo de avaliação e à exclusão dos critérios de avaliação da classificação dos alunos e da taxa do insucesso escolar.
O estudo confirma o que não deve ter discussão, que a avaliação do desempenho é fundamental para melhorar a qualidade do ensino. Não há razão nenhuma para que as escolas e os professores estejam fora de uma cultura moderna assente no mérito e apostada na qualidade. Imprescindível é que todas as partes se comportem como agentes activos do sistema e assumam a correspondente responsabilidade.
A ideia foi boa e continua a ser, mas alguns aspectos essenciais não foram suficientemente acuatelados. É tempo de o Ministério da Educação, as escolas e os professores fazerem uma reflexão séria e levarem a sério as recomendações da OCDE…

E querem que votem neles!...

Na negociação com António Costa, Helena Roseta conquistou o segundo lugar na lista para a Câmara de Lisboa.
Mas logo António Costa veio desfazer a conquista, afirmando que o número dois da lista não seria o número dois na Câmara, já que o número dois na Câmara seria o Arquitecto Manuel Salgado.
Todavia, o arquitecto Manuel Salgado, que não é número dois na lista, mas é o número dois na Câmara, nunca será o número um da Câmara, se António Costa bater a asa para outras paragens. Aí, o número um da Câmara, disse-o Costa, será um socialista de cartão, que não será nem o número um, nem o número dois da lista.
Portanto, temos um candidato em segundo, mas que nunca será segundo, nem sabemos se será quarto, sexto ou décimo, e temos um segundo que nunca poderá chegar a primeiro. E podemos ter um primeiro, que nem é segundo ou terceiro.
Nestes jogos florentinos, pedem o voto dos cidadãos, dizendo que querem servir Lisboa, mas vão-se servindo a si próprios. Como podem gerir Lisboa, se nem uma lista escorreita conseguem apresentar?

California "arde" em défices e em dívidas

1. A Califórnia, o mais importante Estado da Federação USA, em termos populacionais e económicos – seria a 8ª economia do Mundo se constituísse uma nação independente, com direito a participar num G.8 – está em foco devido à sua precária situação financeira e económica.
2. Com uma taxa de desemprego que ultrapassa os 11%, bem superior aos 9,5% da Federação, a Califórnia viu as receitas orçamentais caírem fortemente, abrindo uma “cratera” orçamental e colocando o Estado numa situação próxima da insolvência, a dívida titulada emitida por este Estado tem já o estatuto de “junk bond”, simplesmente o pior na escala do rating ...
3. Nas suas edições de 11 e de 13 do corrente o Financial Times trata este assunto de forma desenvolvida, referindo nomeadamente a necessidade do Governo da Califórnia – presidido pelo bem conhecido Arnold Schwarzeneger – de lançar mão de “IOU”, ou seja certidões de dívida para pagar a fornecedores de bens e de serviços uma vez que não dispões de fundos e o endividamento bancário directo “bateu no tecto”...
4. Estes “IOU”, com vencimento para final de Setembro próximo, são negociáveis pelos seus titulares junto dos bancos - ou eram pelo menos até 6ª Feira passada, data a partir da qual diversos grandes bancos (Bank of America, Wells Fargo, JP Morgan) deixariam de aceitar o seu desconto...
5. Valeu à Califórnia, para ter mais algum tempo de respiração, uma decisão recente da Securities and Exchange Commission (SEC) atribuindo a estes “IOU” o estatuto de títulos de dívida transaccionáveis em mercado secundário, o que determinou um interesse significativo na sua negociação por parte dos intermediários financeiros e de investidores em busca de melhores remunerações – estes títulos vencem uma taxa de juro de 3,75%, numa altura em que as aplicações de prazo semelhante no sistema bancário vencem quase 0%...
6. O Governo da Califórnia terá emitido cerca de USD 3 mil milhões de “IOU” até este momento, podendo ser obrigado a novas emissões se não conseguir chegar a acordo com o Senado quanto às medidas de poupança a incorporar em novo orçamento que deverá ser aprovado até Setembro.
7. A Califórnia tem nesta altura um défice orçamental de USD 26,3 mil milhões, para um total de receitas de USD 113 mil milhões – de acordo com o F. Times.
8. No pior cenário – que pode não acontecer se o Governo Federal vier a adoptar um plano de salvamento que em todo o caso não será pacífico – o Estado da Califórnia acabará por entrar em “default” no cumprimento da sua dívida financeira, avaliada em cerca de USD 70 mil milhões...
9. Ao ler esta notícia, ocorreu-me um famoso discurso de posse proferido em Fevereiro de 2000, por alta individualidade do nosso mundo financeiro - ainda em funções apesar de já terem passado 9,5 anos - no qual criticava (sarcasticamente) as pessoas que na altura chamavam já a atenção para o aumento rápido da dívida externa do País...
10.Dizia essa alta individualidade que chamar a atenção para o endividamento externo de Portugal, membro da zona Euro, não tinha sentido pois era mais ou menos a mesma coisa que falar do endividamento do Mississípi na zona Dólar...não referiu a Califórnia talvez por lhe parecer um exemplo (de possível default) muito inverosímil...
11. Com esta rasgada visão dos nossos dirigentes o País pode estar certo e seguro do rumo que leva, vamos certamente dar a bom porto...

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Um conselho ao Senhor Doutor Juíz

Tem sido tal o frenesim da tevisão a noticiar as novas condições de trabalho em que foi colocado o juíz dos casos mais mediáticos da nossa Justiça que chegamos a perguntar se esta exposição visual se torna ou não "convidativa"!
A velha Boa Hora, austera, intimidatória e resguardada na intimidade dos gabinetes de trabalho, trasladou-se para um modernaço imóvel, trivial, soalheiro, envidraçado, exposto...bem mais exposto que o seu vizinho oceanário.
Na corrida à denúncia deste facto, a televisão mostra, torna a mostrar, filma bem de perto a cara do juíz, a posição exterior do seu gabinete, a posição do juíz dentro do gabinete...e manda uma reportagem de exteriores para mostrar que o Ministério da Justiça, atento e pressuroso, actua colocando uma película enegrecida e opaca nas janelas deste gabinete.
Agora, olhando para o exterior do prédio, esta película, sendo a única que foi colocada, denuncia na perfeição qual é o gabinete deste Senhor Juíz!!!

Eu atrevo-me a dar-lhe um conselho: mude a disposição da secretária, coloque-se noutro ângulo de trabalho, Senhor Doutor Juíz...

Mapa Etno Musical de Portugal



O jornal i dá-nos conta da publicação, em formato digital, do novo Mapa Etno-Musical de Portugal, da autoria de Júlio Pereira, que fez a apresentação hoje, na Livraria Ler Devagar. O projecto teve o apoio do Instituto Camões e assinala em cada canto do País a música tradicional, os trajes, os instrumentos e ainda as explicações históricas dessas tradições.
Há quem diga que só se conhece bem um país, ou uma região, quando se experimenta a sua gastronomia, porque ela reflecte todas as condições de vida de um povo, mas o conhecimento mais enriquecedor e o que nunca mais se esquece é o que resulta do contacto com as pessoas, os seus hábitos, o seu sotaque, e quando se decifra a razão de ser das suas tradições. Ora é precisamente esse domínio que leva mais tempo, que exige um olhar atento e demorado, incompatível com as viagens turísticas de poucos dias, muitos quilómetros, muitas paisagens e ainda mais fotografias, e é uma pena.
Portugal é um País lindíssimo, construído ao longo de séculos, onde se reflectem todas as vicissitudes do cruzamento de povos, de alargamento de horizontes, de riquezas súbitas e pobreza imensa, sem no entanto perder a sua identidade. Em cada canto há traços e costumes que demonstram essa diversidade mas também esse traço comum que conseguimos resumir, para encurtar razões, na palavra saudade.
Uma das formas mais ricas dessa expressão dos povos, a música, as danças, o modo como celebram e se manifestam em grupo, está muito esquecida e é muitas vezes pura e simplesmente desprezada, quando não ignorada, sobretudo pelos mais novos. O crescimento das grandes cidades, o despovoamento das aldeias e a manifesta quebra na relação inter geracional, deixou para trás cantos e tradições, lendas e crenças, tudo marcas profundas da cultura e da raiz das populações.
O lançamento deste mapa Etno Musical em formato digital tem a imensa virtude de trazer à modernidade o testemunho e a compreensão do que não pode ser esquecido, sob pena de nos empobrecer a todos, de modo irreparável. E, já agora, pode até ser muito útil para a decisão política, uma vez que sem esse conhecimento, e sem o respeito por essas raízes, muito do que é diferente é tratado como igual, gerando decisões erradas ou cujos efeitos se arriscam a deitar a perder muito mais do que aquilo que se pretende ganhar.

terça-feira, 14 de julho de 2009

O mito das falências

Com vista a proteger a sua actividade, manter os activos, preservar o emprego e defender o mais possível os interesses próprios e de terceiros, a General Motors, gigante mundial, decidiu em Junho apresentar-se à falência no Tribunal de Falências do Estado de Nova York.
Passado pouco mais de um mês, o Tribunal aprovou o plano de falência.
Claro que saíram prejudicados os accionistas e muitos créditos foram reduzidos, mas isso são as regras do jogo de uma economia de mercado. Mas a actividade continua e o emprego foi assegurado.
Em Portugal, os processos de falência demoram anos, mesmo considerando a diminuta dimensão das nossas empresas. E continua a pensar-se que as falências arrastam desemprego.
Nada mais falso, na maioria dos casos. Se uma empresa se apresenta à falência a tempo e horas e o processo é resolvido expeditamente, não se perdem os equipamentos, nem os clientes, nem os trabalhadores. Perdem os accionistas e, em parte, os credores. A empresa continua a actividade, com outros donos.
Mas os sindicatos, os governos, os próprio sistema de justiça não compreenderam ainda esta realidade. E receitam paliativos, que só agravam o mal.
Segundo a última edição do Expresso, a maior parte das empresas apoiadas pelos fundos de capital de risco do IAPMEI continuam com as dificuldades que tinham, correndo o risco de encerrar.
Nada que não se soubesse já. Nenhuma empresa apoiada pelo célebre Plano Mateus conseguiu recuperar.
Acontece que os governos gostam deste tipo de capitalismo mixuruca, sempre a pedir apoio ao Estado, e da angariação de votos e da troca de favores que provoca.
Mas que não deixa revitalizar a economia e as empresas. Nunca mais aprendemos!...

O fascínio dos ensinamentos do velho Mao


"O inimigo avança, retiramos. O inimigo acampa, provocamos. O inimigo cansa, atacamos. O inimigo retira-se, perseguimos".

Aqui na blogosfera ou nos jornais. Mas também nos livros, nos actos das instituições ou nas decisões judiciais. Quem aprendeu pelo livrinho vermelho nunca esquece. Do fundo do subconsciente, nos momentos decisivos, emerge, irresistível, a velha doutrina...

Atenção à pressão mediática...

Nos últimos tempos, temos assistido através da comunicação social ao desenrolar, quase em directo, de casos judiciais que envolvem decisões sobre a vida de crianças "desprotegidas". São crianças cujo percurso de vida, desde muita tenra idade, se desvia dos afectos e dos cuidados normais que os pais e a família têm para dar ou que a dado momento é interrompido por acontecimentos que as colocam em perigo.
Quem não se lembra do caso Esmeralda ou da menina russa de Barcelos? E quem não tem presente o processo de adopção do pequeno Martim? Ou, mais recentemente, a greve de fome a porta do tribunal por causa da decisão judicial da adopção da pequena Beatriz?
Questiono-me até que ponto a pressão mediática, impulsionada por um determinado sentido de justiça que as partes envolvidas querem fazer valer, pode interferir nas decisões dos juízes, condicionando sentenças futuras ou corrigindo sentenças já proferidas.
A cedência à pressão mediática não favorece uma justiça competente, independente e credível, com a agravante de que estamos perante uma matéria muito sensível, relativa ao superior interesse da criança, em que a decisão de um juiz é fundamental na sua vida, porque vai ditar o seu bem estar e a sua felicidade.
Se não é bom que os juízes se deixem influenciar por protestos à porta dos tribunais, que bem montados constituem um chamariz para a atenção da opinião pública, não menos preocupante são os casos em que se não fosse a pressão mediática o sentido da decisão dos juízes não seria alterado sendo, portanto, legitimo questionar se o superior interesse da criança seria efectivamente defendido.
Ambos os casos não podem constituir vias para fazer chegar aos juízes informações relevantes para apoio às suas decisões. Considero que é um caminho perigoso.
Arrepia-me este estado de coisas. Devo concluir que os tribunais e as instâncias públicas envolvidas e outras entidades intervenientes, como é o caso das instituições de acolhimento, que lidam com a protecção de menores deveriam estar mais bem apetrechados e preparados e deveriam melhor articular entre si, no sentido de reduzir ao mínimo o risco de más decisões judiciais por falta de competência, de informação, de conhecimento, de controlo ou celeridade de actuação.
Errar é, evidentemente, humano, mas fazê-lo por desconhecimento ou incompetência é grave e imperdoável!

segunda-feira, 13 de julho de 2009

A língua do Saviola!...

A língua de Saviola trai os pensamentos do reforço benfiquista, noticiou o DN na sua edição de 11 de Julho.
Palestina, faixa de Gaza, há três mil anos. A bela e voluptuosa Dalila, sacerdotisa dos Filisteus, recorrendo a todos os seus truques, descobriu que a enorme força de Sansão, que o levava a ganhar todos os combates, lhe advinha dos longos cabelos. Depois de uma longa noite de amor, apanhando-o a dormir, rapou de uma tesoura, cortou-lhe os cabelos, cegou-o e acorrentou-o.
Passados três mil anos, um trio de jornalistas desportivos usou também de todas as suas artimanhas para descobrir a razão da força do Saviola, e assim o deixar fraquito, à mercê dos adversários.
Descobriram que o virtuosismo de Saviola não está nos pés nem na cabeça, como é usual nos futebolistas. A sua força e o seu talento está, imagine-se, na língua. Não na língua, tout court, mas na língua de fora!...
A investigação concluiu que, quando Saviola está com a língua de fora, vai em direcção ao adversário, finta para o lado direito e remata à baliza.
Ainda segundo a investigação, Saviola fica com as mãos cerradas quando opta por analisar a partida; mas, se a língua lhe salta, aí vai ele à procura da bola, avança para o adversário, finta para o lado direito e remata. Sempre, sempre desta maneira!...
Depois desta descoberta, penso que os adversários já sabem como o neutralizar, pondo em causa a grande esperança benfiquista.
Cá por mim, não sou de intrigas, mas muito me admiraria se essa investigação não tivesse sido efectuada a soldo do filisteu Pinto da Costa!...

O gato Zorbas no meu alpendre


Às vezes acontecem-nos coisas curiosíssimas.
Ontem à noite estive a reler de um fôlego a História de uma Gaivota e do Gato que a ensinou a Voar, de Luís Sepúlveda, uma excelente forma de assinalar o início de uns dias de férias de Verão. Para os que ainda não tiveram o prazer de a ler, a história conta as peripécias do gato Zorbas, que se comprometeu perante uma gaivota moribunda a chocar-lhe o ovo e a proteger o filhote até ele aprender a voar. De tudo o pobre gato se desembrulhou com toda a alma mas o maior problema foi mesmo, por razões óbvias, ensinar a gaivotinha Ditosa a aprender a voar. Uma parábola maravilhosa, emocionante e terna, que fica a bailar no espírito até desvendarmos as múltiplas facetas com que se cruza na nossa realidade.
Estava eu hoje a preguiçar no alpendre, a ver gaivotas no céu e a pensar na coragem do Zorbas, quando oiço um “poc!”, como se algo macio mas denso tivesse caído da trepadeira para o empedrado. Não fosse a memória fresca da história e continuaria sonolenta na minha cadeira, mas lembrei-me de repente que havia um ninho no meio da folhagem, dei com ele quando há dias a ventania ia partindo o tronco grande e tive que o prender de novo, foi por um triz que o ninho não caiu também. Levantei-me de um salto e fui procurar o que teria caído.
Da beira do alpendre vi um pardalito na pedra, ainda mal coberto de penas e a tentar esvoaçar, arrastando-se atarantado para a relva para logo aterrar sem forças. Fiquei a vê-lo pasmada, a pensar no que faria o gato Zorbas, palavra que pensei isso, ajudo-o ou deixo-o tentar?, a lembrar-me de quando ele miou “o principal é aprender que só voa quem se atreve a fazê-lo”. Mas o passarinho falhou várias tentativas e o sol estava forte, quando chegou à relva estava exausto e não se mexia, só o papo minúsculo se agitava violentamente e o bico aberto, numa aflição.
Como não tenho a coragem do gato preto e lustroso, nem compromissos de ensinar um passarito a voar, fui apanhá-lo de mansinho, ainda agitou as asitas curtas mas depois sossegou e deixou-se afagar, muito redondo na palma da minha mão. Pousei-o numa caixa macia mas o seu bico aberto parecia reclamar comida, ou água, o Zorbas teve a mesma dúvida, o que come um passarinho? "Insectos," responderam-me, "não vais apanhar melgas para lhe dar, pois não?" Água ainda lhe dei, deixando escorregar uma gota pelo meu dedo, mas ele não quis, ao menos fechou o bico, sinal de que estava de posse dos seus instintos vitais. Também virou a cara às migalhinhas de pão…
Até que tive a ideia de voltar a pô-lo no ninho, onde ele se encolheu muito consolado, e fiquei à espreita, a boa distância. Não passaram muitos minutos até se aproximar um pardal, depois outro, que entraram na folhagem e desataram numa chilreada que não era canto mas zanga, um ralhar intenso e aflito, os dois ao mesmo tempo numa algazarra. Depois um voou, muito rápido, o outro – a mãe, certamente, - ficou na beira do ninho muito quieta, a vigiar o atrevido. Depois também voou mas pousou na sebe, disfarçada.
Fui ver o ninho, sem tocar nas folhas que o encobrem, várias vezes antes de vir embora. Lá estava ele, sozinho e muito sossegado, a debicar qualquer coisa. Talvez amanhã se atreva de novo, se a mãe estiver por perto, não há-de ser menos esperto que a gaivota Ditosa.
Tenho pena de não estar lá, havia de o ver subir, primeiro desajeitado, depois confiante, pensando que o gato Zorba é como todas as mães, fazendo tudo para ensinar os filhotes a voar com segurança, mas sempre a hesitar se será a altura de os deixar, com as suas asitas curtas, ganhar altura e conquistar os céus em direcção à sua própria vida.

domingo, 12 de julho de 2009

A falta que o Zé faz a Costa

Enternecedora a cerimónia que consumou o casamento de conveniência entre o Zé Faz Falta e o PS Lisboeta. O Zé arranjou uma barriga de aluguer substituta do BE e passou a fazer parte dos que fazem falta ao PS neste momento de aflição. Todos parecem ser poucos para fazer frente a Santana Lopes (quem diria!). Só resta seduzir Helena Roseta (tarefa muito mais penosa, mas possível) porque, mesmo com o declarado apoio de Saramago ao PS, não é de crer que o PC vacile, sabendo como sabe bem que é nestes combates que se ganha credibilidade. E que para ser politicamente credível é indispensável afirmar a sua autonomia, afirmação possível com Sampaio ou Soares, duvidosa com Costa.
Percebe-se que Zé faz mesmo muita falta a Costa, não tanto pela sua valia eleitoral mas sobretudo pelo seu curriculum.
O Zé é o herói da Al Jazeera, para quem já não se lembre.
É ele o responsável pelos milhões a mais que tivémos de pagar a mais pelo túnel do Marquês.
O mesmo que se indignou e denunciou o escândalo da concessão a pataco de espaços municipais a tenebrosos interesses, como o restaurante Eleven no Parque Eduardo VII, ao mesmo tempo que onerava a Praça das Flores para exibições publicitárias de uma marca de automóveis.
O censor dos cartazes do PSD na Praça do Marquês do Pombal, a mesma onde, anos antes, se publicitava como candidato do BE.
Tudo isto sem falar nas superiores qualidades do Zé como gestor autárquico. A História de Lisboa registará como factos maiores, logo depois do entalanço do Martim Moniz, os grandes feitos do Zé, que, por serem públicos e notórios, aqui me dispenso de assinalar.
Ouço Costa dizer que a aliança com o Zé é para garantir a continuidade o trabalho e a sustentabilidade ambiental de Lisboa.
Conseguiu dizê-lo sem se rir. Eu é que não resisti à gargalhada.

“Frenemy"

Tinha um colega que afirmava que sempre que se penteava, recorria a um desodorizante e a uma camisa lavada transmitia a sensação de que era a pessoa mais atraente do mundo. Afinal, um pente, uma fragrância e uma camisa vincada eram a solução. De facto, ficava logo com outro aspeto, mas, na minha opinião, era, sobretudo, devido à sua atitude perante a vida. Tratava-se de um extrovertido e bom comunicador a que não era alheio a sua origem, traduzida no idioma brasileiro. Também é muito comum que algumas senhoras e meninas ao vestirem um simples trapo conseguem dar mais nas vistas do que muitas outras cheias de ouro, de sedas e de vestidos de grandes nomes, as quais ficam roídas de inveja por não conseguirem chamar a atenção desejada! Este fenómeno não se esgota nestas singularidades. Há aqueles que têm tudo, dinheiro, posição, fama, usufruem constantemente de viagens e de referências elogiosas e que, mesmo assim, pasme-se!, não conseguem esconder o seu incómodo pelo facto de outros terem algum sucesso, ou conseguirem um destaque, ainda que minor, longe, mas muito longe dos primeiros. É de ficar com a boca aberta! Que raio de mundo é este, que não deixa que um pobre mortal consiga ocupar um lugarzito a que tem direito? O mundo é pequeno, de facto, mas não é preciso “expulsá-los”para dar mais espaço a quem já tem tanto, e, muitas vezes, com todo o direito.
Houve quem cunhasse uma nova palavra “frenemy” que acabou por fazer a sua entrada em dicionários de língua inglesa (fr(iend) + enemy).
Em português podíamos utilizar algo como “aminimigo”. Mas do que é que se trata? Trata-se de um amigo ambivalente e invejoso que não consegue suportar uma hipotética, na grande maioria dos casos, superioridade em várias áreas, tentando esconder a sua hostilidade como um gato com o rabo de fora. Pessoalmente até seria capaz de enumerar uma catrefada de exemplos, caso de um “frenemy” que sempre que sabia que saía para algum lado dizia logo que passava a vida a passear pelo mundo fora! “Até parecia o Mário Soares dos tempos áureos!” Eu?! Posso ter saído algumas vezes, poucas, muito poucas, até, porque não sou dado a viagens, e se fizesse a respetiva contabilidade poderia concluir que o meu “frenemy” tinha feito tantas ou tão poucas que qualquer astronauta, habituado a passear à volta do globo, morreria de inveja!
Há várias formas de diagnosticar esta situação, uma delas é o alivio que sentimos quando o "frenemy” cancela os planos, ao contrário de uma esperada eventual deceção! Que alívio! Mas o convívio com estas pessoas é terrível, porque é uma fonte permanente de irritação, de stress e até de hipertensão arterial! O curioso é que quando estamos perante pessoas que sabemos, e que mostram, não terem qualquer simpatia por nós, então, não há nem irritação, nem stress e nem crises hipertensivas!
Enfim, “amizades” que deixam muito a desejar!
O povo português tem uma expressão muito peculiar para estes casos: “Não podem ver um pobre de camisa lavada”. Só falta criar a palavra equivalente na nossa língua e, depois, utilizá-la sem qualquer acrimónia, para bem da saúde...