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terça-feira, 8 de setembro de 2009

Planos de contingência

Tenho seguido com atenção a pandemia da gripe A e até já colaborei na feitura de alguns planos de contingência. Aliás, aquando da ameaça da “gripe das aves”, já tinha feito muito trabalho de casa. No fundo, o objetivo principal é pura e simplesmente evitar situações catastróficas, fazendo todos os possíveis para desviarmos do caos, em que ninguém consegue entender-se, para uma situação de perturbação grave. Neste último caso, apesar de todas as contrariedades, é sempre possível manter em funcionamento as estruturas e minimizar o impacto na saúde das pessoas. Estes são os dois cenários mais graves. No entanto, é possível que a situação possa ser “apenas” grave ou até moderada.
O empenho das organizações nacionais e internacionais mostra a preocupação face a esta ameaça. Devemos louvar esta atitude? Sim, devemos, não obstante o aparecimento de algumas atitudes e comportamentos a raiar a estupidez e o histerismo ao provocarem alarmismos patológicos. Mas, enfim, “é a vida(!)” como dizia o engenheiro.
Pandemias de gripe não são novidade. Já tivemos muitas, e cada uma tem assinatura própria.
Em contraponto a este problema, queria expor um outro cuja relevância merece a nossa maior atenção, ou seja, a depressão.
Dados da OMS confirmam, o que já se suspeitava há algum tempo, que a depressão será a doença mais comum nos próximos 20 anos, afetando mais pessoas do que o cancro e as doenças cardiovasculares em conjunto, e estas últimas irão continuar a aumentar. Face a esta pandemia silenciosa, os custos económicos e sociais, devidos à diminuição da produção, às terapêuticas e aos cuidados com os doentes, serão incomportáveis para os governos. Se tomarmos em linha de conta que são os mais pobres dentro dos países mais ricos e as populações dos povos mais pobres os mais atingidos, então é fácil de prever as consequências. Um problema muito sério a exigir planos de contingência destinados a evitar a propagação deste “vírus mental” cuja capacidade de transmissão é fácil de prever.
Neste momento mais do que 450 milhões de pessoas sofrem de transtornos mentais. Nos próximos 20 anos a depressão será a maior causa de perdas entre todos os problemas de saúde.
O mundo anda muito preocupado e ansioso com mais um vírus da gripe e esquece uma brutal e perigosa pandemia cujas consequências são muito graves a vários níveis. Como explicar este comportamento? Por que razões não são tomadas medidas adequadas destinadas a evitar esta “asfixia mental”, utilizando uma palavra tão popularizada nos últimos tempos? A depressão é uma doença multifatorial e tem diversas causas, desde as biológicas às pressões ambientais. Quanto às primeiras não é possível evitá-las, mas, através de medicação adequada, é possível controlá-las, desde que as pessoas tenham acesso à mesma, claro. A par das causas biológicas, ou da propensão para uma maior ou menor depressão, os fatores ambientais, nomeadamente sociais e económicos, são determinantes para o eclodir de tão grave problema de saúde. Importa, pois, criar situações de justiça social, combater a pobreza, facilitar o acesso aos cuidados de saúde, proteger e defender os direitos das pessoas ao emprego e ao trabalho, respeitar os seus anseios e projetos de vida, desenvolver a solidariedade, evitar a corrupção, o nepotismo, lutar contra todas as formas de escravatura, enfim, contribuir para uma sociedade mais justa e respeitadora dos direitos dos seres humanos. Os planos de contingência são necessários, tanto, ou mais do que os ansiados planos contra a gripe A. Se os responsáveis deslocassem dez por cento da atenção que é dada à gripe A para as causas sociais da depressão, então, talvez conseguíssemos minimizar os efeitos de doença tão prevalente. Não vislumbro grandes empenhamentos nestas áreas. Que pena! Um dia vamos arrepender-nos desta nossa inoperância.
E que tal “planos de contingência” para políticos, economistas e quejandos com responsabilidades públicas? Em primeira instância são os verdadeiros vírus de situação tão mórbida.

1 comentário:

Pinho Cardão disse...

Sempre a palavra certa, caro Professor!...