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quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Coreia, amiga

Nos últimos meses, a Coreia do Norte tem deixado clara a sua admiração pela Europa, o que é particularmente simpático para os europeus numa altura em que, simultaneamente, tem vindo a intensificar o tom das provocações à república fraterna do sul e, por arrasto, aos EUA.

De entre as benfeitorias da Coreia do Norte, destaco a “abada” que concedeu à selecção portuguesa, sem a qual Portugal teria saído do Mundial sob uma total ignomínia e o Cristiano Ronaldo - o melhor do mundo – não teria marcado...com as costas, lá com o que é que ele marcou aquele golo esquisitíssimo.

Mais recentemente, segundo notícia de 1ª página do Financial Times de hoje, a Coreia do Norte está a oferecer uma amortização da dívida que tem com a República Checa, não em dólares (moeda em que foi contraída), mas sim em ginseng. É possível, no actual contexto, melhor prova de amizade entre países?

Só por si, a iniciativa de substituir uma relação monetária por uma relação mais pura de troca directa, constitui uma quebra - sempre bem-vinda – da rotina; neste caso da rotina que consiste em pagar em dinheiro aquilo que se pediu emprestado em dinheiro. Para além disso, como todos sabemos, o ginseng é uma raiz com propriedades alegadamente fantásticas, entre as quais se contam aumentos da memória, do vigor físico e do apetite sexual.

Mas o fulcro da generosidade de Kim Jong Il foi lembrar-se da grande máxima de Lenine de que “a melhor maneira de destruir uma economia capitalista é debochar a sua moeda”. Ora debochar a moeda parece ser, precisamente, aquilo que a Reserva Federal (Fed) se prepara para fazer. Passo a explicar.

No comunicado que emitiu a seguir à reunião de política monetária de ontem, a Fed indiciou a re-introdução da estratégia de política monetária que dá pelo nome de “quantitative easing”. Simplificadamente, esta estratégia consiste na criação, e posterior injecção no sistema financeiro, de quantidades gigantescas de liquidez, o que na prática se efectua através de compra de dívida (normalmente) pública por parte do banco central, com recurso a moeda recém criada. Ou seja, o “quantitative easing” implica uma monetização massiva da dívida federal norte-americana através da “impressão” de uma quantidade brutal de dólares, o que, a prazo, não poderá deixar de ter um efeito deletério sobre o dólar. Era nisto que o regime de Kim estava a pensar quando ofereceu aos seus amigos checos ginseng em vez de dólares ianques. Que hino à amizade!

5 comentários:

Pinho Cardão disse...

Caro JMBrandão de Brito:

Pois eu acho que a proposta coreana de ginsengização monetária nunca será de desprezar, nomeadamente face ao "quantitative leasing".
Desta última política, o meu amigo referiu os efeitos deletérios sobre a economia, e eu concordo.
Ora a ginsengização "aumentando memória, o vigor físico e o apetite sexual", não só o apetite, como a performance só poderá trazer vantagens aos agentes económicos e espevita a actividade. A Áustria fará um bom negócio: surgirão os tomadores por grosso do ginseng coreano, surgirão empresas de distribuição do produto, o giseng tornará felizes os austríacos e os cidadãos de países terceiros quererão ser felizes como eles. Tendo o monopólio da oferta coreana, fixarão os preços de revenda ao estrangeiro, com grande margem de lucro, claro.
O ginseng tornar-se-á, ele próprio um produto estruturado complexo, mas apetecível. Que o manancial de dólares do quantitative easing adquirirá de imediato.
Uma nova era de prosperidade surgirá, devido aos coreanos.

Tavares Moreira disse...

Será que os norte-coreanso terão pensado em converter o ginseng em padrão de valor internacionalmente reconhecido, em compita com o ouro?
Para isso não lhes basta evidentemente este primeiro passo de convencer os Checos a aceitar esse negócio, teriam de organizar um mercado internacional de ginseng, porventura tendo como centro de transacções uma conhecida propriedade na freguesia de Colares, Sintra, afamada pelos seus espinafres de características algo similares às do ginseng...
Em ligação à Chicago Mercantile Exchange e às demais bolsas de mercadorias por esse mundo fora, a Colares Mercantile Exchange tornar-se-ia no grande centro de negócio do ginseng e do miraculoso espinafre e, quem sabe, assim acabariam as dores de cabeça do endividamentoe externo do País...
Teríamos ainda o privilégio de "ver" frequentemente por Sintra, rodeado pelos seus 200 guarda-costas, a notável figura de Kim Jong Il, trajando aquele famoso sapato de homem com tacão de senhora...

Pinho Cardão disse...

Caro Tmoreira:
Com outro comentário assim e o meu amigo não entra mais na fronteira de Colares!...

Suzana Toscano disse...

deve ser por estas e por outras que ninguém percebe nada da crise internacional!!Mas Colares parece-me ser um bom centro para aclararmos ideias :)

José Maria Brandão de Brito disse...

Caro Dr. Pinho Cardão,
Estruturados sintéticos de ginseng deve ser engraçado...ginseng só com efeitos para a memória, outro só para apetite sexual...bom, a imaginação dos engenheiros financeiros certamente nos levarão a insondáveis terrenos. Estou a pensar o que será o subprime do ginseng.

Caro Dr. Tavares Moreira,
já estou a imaginar os saloios de Almoçageme vestidos de yupees a fazer contas aos bónus do trimestre...
Num registo (um pouco) mais sério, essa coisa do padrão ginseng faz-me lembrar um artigo que li do Professor Buiter em que é defendida a total irracionalidade dos sistemas de pagamentos baseados no ouro. Tem o título sugestivo de "Gold: a six-thousand year bubble"