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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Deplorável!

Deplorável! É impossível que não nos toque a todos!
Durante nove anos lutei para saber o que era feito da minha vizinha. Nunca tive ajuda da GNR, nem da PSP, nem dos tribunais”. Foi preciso uma penhora das finanças, para se fazer pagar das dívidas dos impostos que se foram acumulando, para se descobrir que a senhora idosa desaparecida há nove anos estava morta na sua própria casa.
GNR, PSP, Polícia Judiciária e Tribunal de Sintra foram avisados ao longo dos anos pela vizinha e por familiares do seu desaparecimento. Mas de nada valeu porque nada fizeram. Dizem que actuaram de acordo com a lei. Mesmo a Segurança Social que processava a pensão desta senhora ano após ano, limitou-se a interroper o seu pagamento. Também informou que actuou de acordo com a lei.
Ninguém se interessou por saber desta senhora, ninguém investigou o seu paradeiro, ninguém se preocupou em verificar se estaria em casa, se precisaria de ajuda. Vivia sozinha, entregue à sua própria sorte, sem apoio familiar, desinserida da comunidade e sem assistência por parte da segurança social. Excepção feita à vizinha que tudo fez para a encontrar, que não se cansou de avisar as autoridades, mas em vão.
Triste retrato de indiferença e irresponsabilidade a que chegámos. Tudo falhou porque estamos a construir uma sociedade que não pensa nas pessoas, que maltrata os seus velhos. É uma prova da crise de valores, de cultura e de comportamentos que estamos a viver. Uma crise que não rima com desenvolvimento…

21 comentários:

C.B. disse...

Nem tudo falhou. E o próprio Estado não falhou em tudo. O apartamento foi penhorado, a penhora executada e acabou vendido em leilão. O Fisco cumpriu a sua obrigação. O que nos deve deixar cheios de orgulho. GGRRRRRRRHHHH!

Tonibler disse...

Grave, grave era se a senhora tivesse falecido nas Caymman. Agora assim, cobrou-se o imposto devido e o estado social foi bem sucedido.

Suzana Toscano disse...

O caro C.B. diz bem, não fosse o fisco olhar por nós e ainda acabava até por cair a casa.

Freire de Andrade disse...

"actuaram de acordo com a lei"!!! Então, mude-se a lei!
O que me pareceu mais incrível, foi a casa ter sido penhorada sem se procurar indagar o porquê da ausência de resposta às notificações, vendida em leilão, sem sequer ter sido aberta e vista, e comprada por alguém que não tinha podido vê-la por dentro (embora barata, podia ter sido mau negócio).

Anónimo disse...

Li as notícias sobre este caso por aí e fiquei chocado... o que não é fácil de conseguir.

Pobre alma essa que viveria tão só.

(c) P.A.S. Pedro Almeida Sande disse...

Quando uma inteligência parda resolveu distribuir prémios pelo funcionários do fisco para abocanhar tudo o que pudesse em impostos, não foi a eficiência que se encontrou. Foi a indecência de se pensar o país como um enorme alforge onde se pudesse continuar a fazer o trade-off entre as pessoas e a manutenção de ordenados não só escandalosos mas impraticáveis para aquilo que é a realidade económica. Muitos ainda não perceberam que governar é manipular os dinheiros de todos mas na exacta medida que favoreça as pessoas. Há muito já passamos esse tecto, o tecto do primeiro estão as pessoas. O anel de frodo toca quem se põe em bicos de pés a pensar que pode pensar pelos outros.

A morte desta senhora às mãos de uma sociedade cada vez mais desumana e cruel, reflecte aquilo que já sabemos na prática. è a nossa morte que está li reproduzida, a morte da indiferença, a morte dos braços caídos, da aceitação de tudo com pouca acção, ou nenhuma, para além de um encolher de ombros ou de um passa à frente.
As corporações então são o melhor.
Uma polícia que não existe em Portugal, não por falta de efectivos, mas por falta de comparência na função. Antes os problemas pessoais dos agentes não se resolviam nas esquadras, sendo a polícia como corporação, ao contrário de outros países, invisível aos olhos dos cidadãos, chegando invariavelmente atrasada aso locais das ocorrências. A responsabilidade seguinte é a dos tribunais, de quem faz as leis e estabelece uma burocracia sem senso e encerra a vida num emaranhado complexo pouco próprio de qualquer simplex. O processo do simplex tornou-se ele próprio o seu contrário. As leis em Portugal visam normalmente criar mais um nível de dificuldade no acto simples que é, ou devia ser, a vida de uma pessoa.
A seguinte a das famílias desprovidas de valores, de garra para combater pelo seu país, de egoísmo exacerbado fechadas em Portugal nas classes elitárias no eu e os outros, sendo normalmente os mais responsáveis, os Pilatos de Portugal, os que mais vertem lágrimas de crocodilo por situações que reflectem a miséria de um país sem rumo dentro de cada um de nós.
É esta a imagem do desgraçado Portugal real do ano da graça de 2010?
É, mas podia se outro, se cada um de nós quisesse mudar-se para mudar colectivamente Portugal.

Adriano Volframista disse...

Cara MCAguiar
Em 1937, creio eu, foi publicada uma lei onde era concedido ao estado e à Ordem dos Médicos poderes de autoridade sanitária.
Os poderes eram amplos e musculados: entrar nas habitações das pessoas sem mandato judicial era um deles, sempre que existisse suspeitas de perigo para a saúde pública, outro era encerrar consultórios de falsos ou maus profisionais.
O regime de 24/A veio revogar esses poderes.
Há alguns meses, fomos confrontados com a impotência do Ministério da Saúde para impor o internamento a cidadãos que, claramente, tinham sintomas da Gripe A. Os direitos individuais dos cidadãos impedem que a sociedade se defenda, em tempo útil, contra comportamentos criminosos.
O caso desta senhora é um sintoma: ganhámos a democracia mas, não conseguimos defender eficazmente a vivência em sociedade.
Agora as perguntas que ninguêm quer fazer:
a) O Fisco assegurou-se de que a senhora estava viva?
b) A Segurança Social não devia ter confirmado a existência de um óbito, antes de interromper o pagamento das prestações?
c) Pode, o comportamento dos familaires, ser objecto de procedimento criminal?
d) Não seria altura de legislar sobre esta lacuna da lei, tanto mais que, casos como este, por força do inverno demográfico, serão mais frequentes?
Cumprimentos
joão

Bartolomeu disse...

Permitam-me que acrescente uma pequena rectificação: A idosa não faleceu sózinha, tão pouco foi abandonada.
Junto do seu, foi encontrado também o cadáver de um cão...

Tonibler disse...

E de um país, caro Bartolomeu. O cadáver de um país também lá estava.

Bartolomeu disse...

Tem razão, caro Tonibler e... pelo cheiro, em mais avançado estado de putrefacção, que o da idosa...

jotaC disse...

Cara Dra. Margarida Aguiar:
Alguém já disse que somos seres eminentemente sociais, e eu acrescento que somos, também, detentores do conhecimento bastante para nos organizarmos como sociedade justa e solidária. No entanto, acabámos por aceitar pela indiferença vidas que, quando vêm para ribalta, confrangem a alma.
A história de vida desta senhora é lamentavelmente triste. De quem será a culpa!?.- Talvez seja de ninguém ou de todos, talvez dos muros altos que construímos em redor do “eu”…
Depois do abandono de idosos nos hospitais, depois dos maus tratos infligidos a quem deles não se pode defender, depois da impessoalidade dos regulamentos que relegam para segundo plano a sujeito, uma coisa parece certa: vamos acabar assim, juntinhos ao “eu”.

jotaC disse...

PS:Cara Dra. Margarida Aguiar, gostaria "replicar" este post no meu espaço do facebook. Permite?

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Claro que sim, Caro jotaC. Obrigada pela escolha.

Blondewithaphd disse...

Ainda estou nauseada... E todos os outros clichés banais que digam de desgostada.

Bresson disse...

If it's far away, it's news, but if it's close at home, it's sociology.

Não vale a pena fazer sociologia.
Foi uma morte ensombrada pelas águas geladas da solidão.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caros Amigos
Esta história muito triste é uma história que nos conta o estado em que se encontra o País e que prova uma inversão de valores e comportamentos que nos deveria envergonhar a todos. Nela se concentra o que há de pior numa sociedade. A crise de valores está a afectar a qualidade da nossa democracia.
Foram anos e anos de deslumbramento com as amplas liberdades, o primado dos direitos, o consumo, o facilitismo, apostados na ânsia de tudo ter, de ter poder, dinheiro e lucro. Andamos a correr atrás de "powers points" de bem-estar e qualidade de vida, carregados de números, mas onde faltam as pessoas.
Deste lindo retrato faz parte a incompetência das nossas autoridades, que do alto do conforto dos seus guichets "tecnológicos" praticam a indiferença. E não se diga que o Fisco, essa entidade tão eficiente, cumpriu a sua função. É o Estado no seu maior esplendor, confiscando e cobrando receitas, não vê “caras”, só vê dinheiro.
Nem uma palavra, nem uma intervenção pública das nossas autoridades e dos nossos políticos. Para quê? É mais um facto banal, é a vida a correr, paciência é mais um caso.
Li há pouco que a Inspecção-Geral da Administração Interna confirmou à Lusa que foi aberto um processo administrativo (PA 96/2011) para “acompanhamento do caso no que concerne à intervenção dos agentes policiais”. É também incrível a forma como estas autoridades se manifestam. Um comunicado para a Lusa, o tratamento habitual, o caso não é para mais. Abre-se um "procedimento administrativo" e faz-se o “acompanhamento do caso”. Ficamos todos entendidos.
Será que estas histórias tão brutais e tão representativas de uma sociedade tão doente não são suficientes para semear uma mudança?

Pedro disse...
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Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Pois é, Caro Paulo, dá jeito invocar as leis para justificar a indiferença e irresponsabilidade. Estamos cheios de "zelosos" serralheiros!

Pedro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Paulo
Concordo e, ao mesmo tempo, não concordo com a sua conclusão.
Concordo que uma organização para funcionar bem tem que ter liderança, cada um deve conhecer o que a organização espera de si e de todos em conjunto, como deve actuar, que preocupações devem estar presentes na sua actuação. E concordo que esta é uma debilidade das nossas instituições públicas, que é potenciada pelo facto de existirem, normalmente, sobreposições de competências. O funcionamento em "silos" é ainda uma realidade, que se estende a vários sectores. Este modelo origina falta de coordenação, redundâncias na actuação, com a falta de eficiência e eficácia que todos conhecemos. Há imensos exemplos.
Não creio, por aquilo que veio a público, que as instituições envolvidas - policiais, judiciais, segurança social, tributárias, etc. - se tenham esforçado e, eventualmente, cumprido a lei. Não se empenharam. Basta pensar que esta senhora à data da sua morte, portanto há nove anos atrás, teria 89 anos. É estranho que todas essas instituições tenham achado normal que uma senhora idosa com esta idade, vivendo com uma pensão (presumo que pequena), fugisse ou tivesse emigrado!
Com a agravante de uma vizinha e de um familiar próximo, que por certo conheciam os seus hábitos e rotinas diárias, insistirem ao longo de nove anos na necessidade de as autoridades se certificarem se a senhora não estaria morta dentro da sua própria casa.
Entretanto, a GNR e a PSP andam às "turras" sacudindo responsabilidades entre elas.
A parte estranha que o Caro Paulo aponta, talvez se explique pelo facto de estarmos na presença de pessoas idosas que aguardaram pela pronta actuação das autoridades, nas quais confiaram. Depois o tempo foi decorrendo e tiveram, porventura, receio de fazer o que esperavam que as autotidades fizessem. Ficaram prisioneiras do "estado de direito"!

Pedro disse...
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