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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Soberania ao menos na protecção dos direitos fundamentais

Não conheço o acordo com os EUA de que hoje se fala, nem o teor do parecer da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) que o reprovou. Sei que entre Portugal e os EUA foi celebrado um acordo bilateral nos termos do qual as autoridades portuguesas se obrigavam, penso que com base no princípio da reciprocidade, à transmissão de dados pessoais como instrumento de prevenção e combate ao crime. Com a entrada em vigor deste acordo acabariam, não sei se em absoluto, os vistos de portugueses de entrada nos EUA. Leio na imprensa que a CNPD considerou que o governo português não formulou reserva à possibilidade de esses dados serem utilizados para práticas que pusessem em causa direitos fundamentais como o direito à vida (artigo 24º da nossa Constituição).

Lembrei-me de casos antigos de pedidos de extradição em que exactamente este problema se colocou. Num deles fui participante activo, defendendo um extraditando acusado de crime a que cabia pena de morte num dos estados dos EUA, numa das raríssimas incursões pelo direito criminal que levou a defesa até ao Tribunal Constitucional. Por esse caso interessou-se aliás uma editora, que converteu em livro as principais peças do processo. Titula-se ´O Dever de Não Extraditar´ (Legis, Porto, 1996). Na sua apresentação encontra-se o registo de palavras que, todos estes anos passados, continuam a fazer sentido:

  • “No domínio do chamado «direito vivido» não há lugar à ponderação de interesses puramente conjunturais que tantas vezes preside à elaboração da lei, motivada como muitas vezes é, por factos estranhos à justiça e serva de conveniências. É neste preciso plano – o da vivência do direito – que se revela a diferença entre as proclamações da Constituição e a aplicação que das suas".
Ao que parece, contra a rendição à conveniência do tratado, a maioria da CNPD pensou assim. Que é indispensável que a lei não ceda à conveniência e aceite sacrificar direitos que lei maior considera fundamentais sem estar devidamente assegurado que isso se faz para a protecção de direitos tão essenciais como aqueles que a nossa lei fundamental garante. É bom sabê-lo, porque isso significa que ainda existem instituições que desempenham com independência o seu papel de garantes do sistema de valores.

2 comentários:

Tonibler disse...

Constituição outra vez?!? Ora, caro JMFA, andamos de volta de conceitos obsoletos como direitos fundamentais???

Toda a gente sabe para que serve a constituição: para ser revista. O seu conteúdo não é para ser levado a sério por ninguém, está aí um presidente da república para o demonstrar.

Pedro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.