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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Síndrome sem nome...

Em medicina é relativamente comum, na construção de novas entidades nosológicas, designá-las com o nome de quem as descobriu ou, então, relacioná-las com algumas descrições decorrentes de determinados fenómenos, locais onde foram identificadas pela primeira vez e até mesmo fazendo recurso à arte, à mitologia e à literatura. No fundo trata-se de síndromes, conjunto de sinais e de sintomas que conferem personalidade médica sem a qual não é possível tratar ou prevenir. Algumas dessas síndromes traduzem acontecimentos interessantes, previamente relatados, aos quais os descobridores foram buscar o nome. Neste momento surgem algumas na minha memória, caso do cocheiro "mister Pickwick", personagem de uma obra de Dickens, gordo, que adormecia em qualquer lugar e que traduz a relação entre a apneia do sono e a obesidade; outra, a síndrome de Stendhal, tão bem descrita na sua obra "Nápoles e Florença: uma viagem de Milão a Reggio" em que o vislumbre da imensa beleza florentina lhe provocou desorientação e perturbações fisiológicas. Os sofredores desta entidade são de tal modo sensíveis à beleza que chegam a não saber quem são, exigindo mesmo internamento; algo semelhante ocorre com os místicos religiosos que, na Terra Santa, se transfiguram em novos Messias (síndrome de Jerusalém). Outros chegam a automutilar-se e a fingir patologias sem fim, são os sofredores da síndrome de Münchhausen, o barão aventureiro aldrabão contador de façanhas mirabolantes. Os que não crescem psicologicamente, e se mantêm num estado de maturidade infantil, são categorizados como sofrendo da síndrome de Peter Pan, mais uma obra literária a dar nome a uma entidade. Poderia continuar no ritmo de enunciação das síndromes, como a de "Estocolmo", para justificar a dependência ao raptor, ao qual a vítima confere atributos não condicentes com o mal que lhe possa ter feito, uma forma de sobreviver que se arrasta para além do episódio.
Tudo isto foi despertado a propósito de um fenómeno designado por "cancro Cinderela". Mas o que é que a Cinderela tem a ver com o cancro? A história é por demais conhecida, o príncipe deseja encontrar a dona do sapato de vidro. Neste caso, "cancro Cinderela", estudos recentes revelam que só após três ou mais consultas é que são diagnosticados certos tipos de tumor. Por este motivo, atraso na deteção da doença, o tratamento pode ficar comprometido. Os autores recomendam que os médicos sejam mais interventivos, quais príncipes à procura de tumores! É natural que certos tipos, devido à localização e evolução não sejam diagnosticáveis logo à primeira, mas se formos na onda de procurar tudo e mais qualquer coisa, temo que possamos causar mais dano do que benefício. Este problema não é de fácil resolução. De qualquer modo, o bom senso e o cumprimento de determinadas regras podem ser uma grande ajuda.
Uma senhora ainda nova começou a queixar-se de problemas digestivos, mal-estar, ligeiras náuseas, uma ou outra tontura, enfim, um quadro muito comum e que a própria interpretou com sendo algo relacionado com o "fígado". Tudo bem, clínica e laboratorialmente. Medicação apropriada, com alguns efeitos positivos, mas depois sem seguimento. Então, anda melhor? Não. Não?! Bom, então temos que ver isso, de qualquer modo até ao fim do ano vai continuar com a terapêutica, depois, se não houver melhoras, temos que fazer mais alguns exames. Faltava pouco para o Natal. Em janeiro, pedi-lhe os tais exames, mais com o objetivo de comprovar que não havia nada de mal do que confirmar qualquer suspeita.
Entrou e perguntei-lhe pelo exame. Onde já vai isso. Como?! Assim que o fiz o médico mandou-me de imediato para o IPO. Amanhã vou ser hospitalizada para ser operada à cabeça. Só agora é que vim, porque o senhor doutor não esteve na semana passada. Fiquei de boca aberta, não porque fosse impossível ter um tumor, mas porque queria que não tivesse nada e poder dizer-lhe: Pronto! Afinal está tudo bem. Pode ficar descansada. Perante esta confissão - a senhora vinha-me mostrar outro exame, que estava bem -, vi-me de repente com um sapato de vidro, que se ajustava ao seu pé, mas que acabou por se partir nas minhas mãos, provocando-me dor e sofrimento. Dar uma boa notícia a um doente é a melhor coisa que pode acontecer a um médico, mas fazer achados destes, terríveis, é um sufoco. Não consigo habituar-me. Causa-me mal-estar e dor de alma. Não sei se há designação para esta síndrome, mas que existe, existe!

O desconcertante Paul Kugman...

1.Como quase todos os génios, o génio da economia Paul Krugman tem o seu lado de personagem desconcertante...
2.Na intervenção que produziu na sessão em que recebeu o doutoramento “honoris causa” de universidades portuguesas, afirmou não ser adequado impor mais austeridade para além da que já decorre do PAEF em vigor...mas acrescentou, logo a seguir, que seria necessária uma redução dos salários para tornar mais competitivos os produtos e serviços exportáveis.
3.Ficamos assim a saber que a redução de salários não entra na definição de austeridade tal como entendida por Krugman...será que se trata da “Austeridade Inteligente”, sustentada por um conhecido político da nossa praça, a que me referi em Post anterior?
4. Numa entrevista divulgada na edição do Público de hoje, Krugman afirma que a adesão ao Euro por parte de Portugal foi um erro – pior ainda terá sido o erro da Grécia na sua opinião – e que teria sido preferível termos mantido o Escudo. Com uma certa graça (e com razão tb, na minha opinião) comentou que, caso tivesse-mos mantido o Escudo, “haveria hoje menos automóveis em circulação, mas certamente mais empregos”...
5.O que Krugman não disse mas teria sido útil que tivesse acrescentado, é que o erro não esteve propriamente na adesão ao Euro, mas nas políticas seguidas aquando da adesão e durante os muitos anos que se lhe seguiram até hoje, as quais exacerbaram os desequilíbrios da economia portuguesa e a conduziram ao estado de sobre endividamento e de sufoco financeiro em que caímos.
6.Com outras políticas, na altura recomendadas pública e intensamente por alguns sinistros personagens (devidamente metidos na ordem, alguns deles) , a adesão ao Euro poderia ter sido um sucesso como foi no caso de outros países europeus...
7.Na mesma entrevista, Krugman diz ter pouco para aconselhar ao Governo português e, numa curiosa demonstração de franqueza remata desta forma: “Eu realmente tenho dificuldade em dar conselhos ao Governo português. Aliás detesto dizê-lo, mas não faria as coisas de forma muito diferente daquilo que está a ser feito agora”!
8.Desconcertante, este Paul Krugman, e provavelmente uma enorme desilusão para os que dele esperavam receber um forte estímulo para o combate ao “ultra-liberalismo” da política económica em vigor...

A difícil conciliação...

No meio da austeridade, da crise, das más notícias, esquecemo-nos das coisas boas que também as há. E são muitas. Esta é uma delas. Não resolve o empobrecimento, mas é um sinal de que como é importante o desenvolvimento sustentável na prevenção das crises.
Os golfinhos estão de volta ao estuário do Tejo. As águas do rio recuperam da poluição de que foram vítimas durantes anos a fio, foi o crescimento desenfreado da cidade urbana sem as necessárias infra-estruturas de saneamento básico. É a falta de planeamento e de visão sobre o futuro que tanta falta nos faz. Venham mais golfinhos...

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Economistas virtuais

“Não serve de nada ao Governo cortar mais na despesa…pois tal só agravará a recessão”.

Paul Krugman
Para Krugman a economia é modelo teórico (aliás requentado) e a actividade económica mera realidade virtual.
Pois Krugman aumentaria a despesa, para haver crescimento económico. Só que se esqueceu de revelar o modelo prático para arranjar o dinheiro para o efeito.

Garzón

Confesso que fiquei satisfeito, apesar de tudo e de todos...

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

"Austeridade Inteligente" ou despesismo disfarçado?

1.Foi hoje publicamente apresentado pelo Secretraio-Geral do PS um novo conceito de “austeridade” a que foi dado o nome (pomposo) de “inteligente”.
2.Na opinião do autor, trata-se de um novo tipo de "austeridade" que se diferencia radicalmente da que tem vindo a ser aplicada entre nós, pois “não tem como efeito a recessão e a quebra da economia” e que deve ser acompanhada por “uma prioridade dada ao crescimento e ao emprego”...
3. O autor não foi explícito (como convém...) quanto aos instrumentos a utilizar para aplicação deste novo tipo de “austeridade”, mas deixou algumas indicações quanto ao que pensa sobre o assunto, quando pediu mais um ano pelo menos para a aplicação do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro (PAEF) negociado pelos seus colegas de Partido, oferecendo como justificação que, se tivéssemos mais um ano, ter-se-iam evitado (i) o corte dos subsídios da função pública no corrente ano, (ii) o corte de 50% do subsídio de Natal em 2011 (via fiscal, universal) e ainda (iii) a antecipação do aumento do IVA sobre o consumo de electricidade e (iv) o aumento do IVA sobre a restauração e similares.
4.Até compreendo e aceito que se defenda um PAEF que, na componente finanças públicas, assente mais nos cortes de despesa do que nos agravamentos de impostos, sobretudo em sede de IRS (nomeadamente sobre a poupança) e de IRC.
5. Em minha opinião, se o PAEF em Portugal tem algum ponto fraco, ele estará provavelmente no excessivo recurso ao agravamento fiscal dos rendimentos, que desincentivam a poupança e o investimento e que nos pode ainda sair bastante caro...
6.Por alguma razão a Irlanda não foi por aí, introduziu cortes mais severos na despesa pública mas aguentou os impostos sobre o rendimento e está retirando já os benefícios dessa opção...
7. Mas não parece ser essa, de todo, a preocupação do autor da "Austeridade Inteligente", cuja intenção, bem ao contrário, parece ser a da realização de mais despesa pública (ou de evitar cortes nessa despesa, o que vem a dar no mesmo), bem como o alívio das taxas do IVA, incentivando o consumo interno numa altura em que a sua contenção se afigura crítica...
8.Sendo assim, a inteligência desta "Austeridade" fica muito mais parecida com a supressão da Austeridade do que com a sua manutenção...e seria preferível que o autor assumisse frontalmente essa opção, evitando este jogo de palavras em que mistura Austeridade e Inteligência para disfarçar as suas reais propostas...
9.Trata-se, no fundo, (sem surpresa) de reiterar a fórmula “mais despesa pública para “dinamizar” a economia e “promover” o emprego”...com resultados sobejamente conhecidos...

domingo, 26 de fevereiro de 2012

Todos fazemos falta...

Idosos são úteis, capazes e fazem falta à sociedade”, uma verdade que as sociedades que se dizem desenvolvidas e modernas se têm encarregado de negar, promovendo desde os bancos da escola uma ideia negativa em relação à velhice, associando-lhe incapacidade, doença, inutilidade, incompetência. Com efeito, os valores das sociedades modernas alteraram-se e hoje o que se privilegia é a novidade, a inovação, a mudança, como sendo traços de juventude. Porque são os jovens, nas escolas e depois nos centros de investigação e nas empresas, que aprendem e constroem as tecnologias e fazem descobertas que mudam o mundo todos os dias. São um símbolo de energia e vitalidade que contrasta com o saber acumulado e a experiência da vida dos mais velhos que facilmente descartamos e queremos ignorar como se fosse possível prescindirmos desses valores. 
A ideia de que o futuro depende dos jovens - o que não deixa de ser verdade - assim dito desvaloriza a existência das pessoas mais velhas remetendo-as para pessoas improdutivas que estão a mais, que não são necessárias, olhadas como um fardo social e económico, esquecendo-nos que os jovens de hoje serão os velhos de amanhã e que passarão pela mesma discriminação se, entretanto, não formos capazes de mudar a forma como encaramos o envelhecimento. A quem aproveita esta lógica?
Curiosamente, o Japão, uma das sociedades mais industrializadas do mundo e tecnologicamente mais avançadas, adoptou activamente políticas que visam dar sentido e propósito à vida das pessoas idosas. As pessoas idosas no Japão são consideradas, são úteis à sociedade e têm graus de realização superiores aos que se verificam na Europa.
2012 é o Ano Europeu do Envelhecimento Activo. Envelhecer com qualidade, significa não apenas viver mais anos com saúde, mas deve significar uma participação positiva na actividade social e uma contribuição para a geração de riqueza. Há muito trabalho de sensibilização a fazer para que se alterem atitudes discriminatórias e estigmatizantes em relação às pessoas idosas. Mas há também que haver vontade política para valorizar o trabalho dos mais velhos, aceitando a aprendizagem ao longo da vida como um activo e encontrando formas que permitam a quem tem saúde e saber trabalhar e ser útil à sociedade por mais tempo. Um mundo dividido com jovens de um lado e velhos do outro é como um filme a preto e branco, antiquado, com falta de colorido, de vida...

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Sucesso da Irlanda: tema politicamente (muito) inconveniente...

1. Quem tenha lido a edição do F. Times de 17 do corrente terá certamente reparado no texto da página 25, “MARKETS & INVESTING”, no qual é feita uma extensa referência aos importantes progressos realizados nos últimos meses pela Irlanda, um dos 3 países da zona Euro forçados a negociar uma operação de resgate financeiro para evitar a insolvência do Estado e do sistema bancário.
2. Nesse texto é dada especial saliência à notável recuperação das cotações da dívida pública irlandesa: depois de as taxas de juro implícitas na cotação da dívida a 10 anos terem ultrapassado os 15% em Julho/2011, o valor da dívida começou a recuperar, situando-se a taxa de juro implícita já abaixo de 7% à data em que o texto foi publicado – a 1ª vez aliás em que a taxa de juro ficava abaixo de 7% desde a negociação do resgate financeiro (Novembro/2010).
3. A mesma taxa situa-se actualmente em 7,06%, inferior em 5,8% à taxa de juro implícita na cotação da dívida portuguesa para o mesmo prazo, que é de 12,86%.
4. Sucede que a Irlanda até já conseguiu voltar ao mercado obrigacionista, com uma emissão de obrigações ao prazo de 3 anos, realizada há cerca de 3 semanas, colocando cerca de € 3,5 mil milhões a uma taxa de juro de 5,25%.
5. Outros indicadores mostram que a recuperação da Irlanda não se limita à dívida pública: a economia cresceu mais de 1% em 2011 e deverá continuar a crescer em 2012 (+0,5%), segundo as previsões da C. Europeia divulgadas na semana finda, apesar desta mesma previsão apontar para uma contracção do conjunto da zona Euro, de - 0,3%...e das fortes contracções esperadas para Portugal e para a Grécia…
6. A economia irlandesa beneficia certamente do facto de os irlandeses terem resistido “estoicamente” ao aumento da tributação sobre as empresas, aquando da negociação do resgate financeiro, mantendo o seu “IRC” em 12,5% (aceitando, em contrapartida, maiores cortes na despesa pública...deviam estar loucos...), tendo conseguido atrair, em 2011, um volume muito elevado de investimento estrangeiro nomeadamente de empresas americanas…
7. A economia irlandesa beneficiou também de uma forte recuperação das exportações que mais do que compensou a quebra da procura interna decorrente do plano de austeridade adoptado, devendo notar-se que as exportações assumem um peso relativo na economia que é mais de 3 vezes o peso relativa das exportações na economia portuguesa…
8. A situação da Irlanda, não sendo isenta de riscos, oferece assim um contraste impressionante com a da Grécia, sendo também bastante diferente, para melhor, da situação portuguesa…a Irlanda é pois exemplo de que um programa de ajustamento associado à operação de resgate financeiro, quando executado com convicção, com toda a gente a “remar para o mesmo lado”, pode mesmo transformar-se num sucesso…
9. Pois bem, creio que esta é a principal razão pela qual o caso irlandês é quase ignorado em Portugal – o seu sucesso vai contra a corrente dominante da “inteligência” portuguesa, dominada pelos “papagaios” (com a devida licença de Medina Carreira) de serviço aos telejornais e noutros meios de comunicação…
10. Para esse exército de papagaios/opinadores, é AXIOMÁTICO que um programa de austeridade JAMAIS poderá dar bons resultados, como se vê com a Grécia (sobretudo) e tb com Portugal…é preciso crescimento e, para essa opinião dominante, crescimento é sinónimo de mais despesa do Estado, para “dinamizar a economia”…
11. Politicamente muito incorrecto falar sobre o sucesso da Irlanda, que me perdoem os nossos leitores…

Paciência, Wilberforce!

Não me recordo, apesar de fazer muitos esforços, quando é que comecei a pronunciar certas palavras, provavelmente por as dizer sem saber o que dizia. Balbuciamos, soletramos, interagimos através de palavras, fonemas e monossílabos sem saber o significado dos mesmos. Depois, com o tempo, acabamos por preencher o oco dessas palavras com algum sentido ou significado, um recheio grosseiro, e muito limitado, que, periodicamente, é substituído por conceitos mais elaborados e consistentes.

Não me lembro quando é que comecei a utilizar a palavra Deus, mas sou capaz de precisar alguns conceitos a esse propósito. Diziam-me que estava no céu. Olhava para o céu e não percebia como é que alguém podia estar lá em cima. Metia-me muita confusão, mas uma estampa, que estava na sala, ajudou-me a resolver o assunto. Uma imagem de um homem barbudo sentado sem usar banco, em cima das nuvens, dava a impressão de que estava para lá do teto azul. Foi então que entendi o que era o céu e onde estava Deus. O azul era a cor do teto e por cima, qual forro, estava a casa de Deus, onde morava, e assim percebi como é que ele via tudo; lá em cima podia ver com facilidade o que é que se passava cá em baixo. Desta forma consegui encontrar uma explicação. Depois, esta interpretação e muitas outras construídas ao redor do imaginário infantil - o que eram as "almas", onde ficava o purgatório e como muito facilmente se ia para o inferno, além de algum terror religioso que perturbava o meu sossego e transformava sonhos em pesadelos horríveis -, alimentadas e ensinadas "superiormente" por adultos, a quem devíamos respeito e obediência, começaram a cair umas atrás de outras sem fazer grande esforço. Bastava para o efeito pensar, não muito, apenas um pouco. No entanto, acabei por compreender, ou melhor, respeitar quem aceitava ou se deixava conduzir por essas normas e condutas. Não tenho nada que meter o "bico" na esfera da fé de quem quer que seja, embora não deixe de ter as minhas opiniões, mas devo ser tolerante e respeitador dos direitos dos outros. O que me mete mais confusão é quando tentam colocar a religião, seja ela qual for, em pé de igualdade com a ciência e procurar falar de igual para igual, sobretudo na explicação de determinados fenómenos. Um deles tem a ver com a criação da vida, mais propriamente do homem. Quando comecei a compreender a teoria da evolução acabei por conhecer muitas passagens relevantes de todo o historial e das mudanças operadas na forma de ver as nossas origens. Antes de saber o que era o darwinismo, aos seis anos de idade, já tinha tido uma violenta discussão com o padre na catequese a propósito da criação de Adão e Eva. E que discussão! Não aceitei minimamente a estupidez que me quis impingir e não levei com a cana da índia porque era um homem bom, mas não muito inteligente, se fosse o professor, que era o oposto, eu tinha ficado calado, mas apenas por causa da cana, obviamente.

Quando Thomas Huxley, o "buldogue" de Darwin, foi interpelado no famoso debate com o bispo Samuel Wilberforce, em que este lhe perguntou se descendia dos macacos por parte da mãe ou do pai, numa atitude provocatória, prenunciadora de uma mudança social e cultural sem precedentes suscetível de perturbar a ordem existente dominada pela religião, determinou a necessidade absoluta de separar as duas formas de ver e explicar o mundo. Mas parece que não, criacionismo e o desígnio inteligente intrometem-se constantemente na ciência, sempre com o objetivo de a religião não ser subalternizada ou perder a força. O recente debate entre o arcebispo Rowan Williams e o cientista ateu Richard Dawkins, realizado na Universidade de Oxford, fez recordar o outro.

Evidentemente que há perguntas que ficam sem resposta, mas, presumo, que não se deveriam misturar as duas conceções. Dizem alguns entendidos que Deus e a religião não são "para o bico da ciência", e dizem muito bem, mas também é preciso dizer, nesse caso, que a ciência também não é para o bico da religião. De qualquer modo, registo algo que considero muito positivo, os "atuais bispos" já admitem ser também descendentes dos "macacos". Sempre é uma evolução. Quem deve andar um pouco perturbado com isto tudo é a alma de Samuel Wilberforce.

Paciência, Wilberforce!

Tempo de mares revoltos

É atribuida a Margaret Thatcher a frase: “Se os meus críticos me vissem a caminhar sobre as águas do Tamisa diriam que era por não saber nadar”. As opiniões “críticas” vivem cada vez mais do imediatismo, do juízo feito em cima da imagem que passa no instante, que foca o que interessa para desencadear a polémica, está tudo muito facilitado a estes comentadores a la minute. E eles não se fazem rogados, os seus cérebros fulminantes ditam logo a opinião, a imagem ainda não saiu do ecran ou o título do jornal ainda está fresco de tinta e já as análises definitivas correm céleres nos rodapés, são quanto basta para alimentar outros tantos cérebros ávidos do momento e multiplicam-se os ditos, os comentários, as indignações ou as gritarias dissonantes, tudo numa confusão geral e tão rápida que fecha o espaço que seria necessário para se pensar um pouco. Que diabo, pode perguntar o sensato que ainda resiste àquele turbilhão, será que foi mesmo assim? Não pode ser, cogitam os lógicos e os analíticos, isto não faz sentido, duvidam e procuram atarantados um pouco de reflexão, mas não, já cresceu a onda possante de opiniões, já criou a sua corrente, os sensatos metem a viola no saco, encolhem os ombros e dizem, se "toda a gente" diz o mesmo é porque foi, os lógicos pensam quem diria, que estranho, mas a onda não gosta de obstáculos, ai de quem se lhe atravesse, a onda também se alimenta do que tenta enfrentá-la, vai tudo na barafunda. Depois, as vozearias cansam-se, encantadas com os destroços que a onda já esmorecida deixou na praia. Com sorte, envergonham-se um pouco, calados, dos seus erros de avaliação, quando baixa o ruído e é finalmente possível ouvir a voz rara dos que pararam um pouco para pensar. Mas os tempos que vivemos são propícios a mares revoltos, mais do que à serenidade inteligente dos que se dão ao trabalho de pensar.
A propósito, já viram o filme A Dama de Ferro”? É excelente, não percam.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

"For sale":assim vai a nossa Europa

http://www.presseurop.eu/pt/content/article/1530961-grande-venda-relampago-na-europa

Revolução na economia confirma-se...mas é quase TABU...

1.Em 28 de Janeiro último editei o Post “Revolução na economia: balança de BENS e de SERVIÇOS a caminho do equilíbrio? “, no qual mencionei – com base em dados estatísticos da Balança de Pagamentos com o exterior até Novembro/2011 e em previsões do BdeP divulgadas no Boletim Económico de Inverno – a possibilidade de estarmos a assistir a uma mudança radical no comportamento da economia portuguesa, corrigindo desequilíbrios acumulados ao longo dos últimos 15 anos.
2.A divulgação pelo BdeP, no início da corrente semana, de informação referente a todo o ano 2011, vem reforçar aquela perspectiva: com efeito, verificou-se uma diminuição drástica do défice conjunto dos BENS e SERVIÇOS com o exterior, o qual passou de € 11.483 milhões em 2010 para € 5.446 milhões em 2011 (-52,5%).
3.Mais especificamente, o défice dos BENS diminuiu de € 18.195 milhões em 2010 para € 13.190 milhões em 2011 (-27%), graças ao desempenho das exportações, que subiram de € 36.689 milhões para € 42.570 milhões (+16%), enquanto que as importações quase estagnaram, passando de € 55.084 milhões para € 55.760 milhões (+1,2%).
4.Por usa vez, o superavit dos SERVIÇOS aumentou de € 6.712 milhões em 2010 para € 7.744 em 2011 (+15,4%), com relevo para a rubrica “Viagens e Turismo” que representa 65% desse superavit.
5.Mas o mais interessante é verificar que no último trimestre de 2011 o saldo conjunto das balanças de BENS e de SERVIÇOS já foi positivo, concretamente de € 52 milhões, sendo € 2 milhões em Outubro, -€ 26 milhões em Novembro e € 76 milhões em Dezembro.
6.Quer isto dizer que no último trimestre de 2011 se assistiu já à concretização do cenário que o BdeP tinha antecipado no seu Boletim de Inverno, o qual antecipa um superavit conjunto dos BENS e SERVIÇOS em 2012, da ordem de 0,3% do PIB (€ 500 milhões aproximadamente).
7.A confirmação deste cenário ao longo de 2012 significará a eliminação do persistente e elevadíssimo défice dos BENS e SERVIÇOS que vínhamos arrastando desde há cerca de 15 anos, com especial agravamento pela forma desastrada como a política económica foi conduzida em Portugal após (e imediatamente antes) a entrada no Euro, culminado no absoluto desvario do período de 6 anos que terminou em Maio de 2011...
8.É também muito curioso que esta mudança radical do comportamento da economia portuguesa, que se deve quase em exclusivo ao formidável esforço das empresas (empresários e trabalhadores) que laboram nos sectores expostos à concorrência, para além da importante correcção dos erros de política económica, mostra mais uma vez que, tal como em 1976/77 e 1983/4, a economia portuguesa reage com elevada rapidez a medidas de ajustamento típicas dos programas FMI...
9.Mas ainda mais curioso é verificar que esta alteração fundamental, sem a qual a economia portuguesa nunca mais teria qq saída, constitui assunto quase TABU na comunicação social em geral e nos debates entre os comentadores com lugar cativo nas TV’s, em especial...tal como o sucesso da “resgatada” Irlanda, note-se...PORQUÊ?

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Até Obama!...

Lembram-se do famigerado “choque fiscal”?... Sim, aquele que “andámos” a prometer na campanha eleitoral de 2002, e que depois, quando “chegámos” ao Governo, só aplicámos a menos de metade (e tarde)?... Pois é verdade: não saberemos nunca como estaria o país hoje se ele tem sido aplicado. Mas atrevo-me a referir, atendendo a tudo o que se passou de então para cá, e à triste situação a que chegámos que, com elevadíssima probabilidade, não estaríamos tão mal…
Vem isto a propósito da notícia que ontem foi conhecida: Obama propôs a descida da taxa máxima de IRC nos EUA dos actuais 35% para 28% e, ao mesmo tempo, propôs também, para compensar, a eliminação de várias excepções, deduções e isenções para as empresas (http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=539793). E não me digam que os EUA não têm dificuldades orçamentais: têm, como é conhecido, e não são poucas…
Sim, até posso compreender que, agora, sujeito a um programa de ajuda e ajustamento, seja mais difícil colocar este tema na agenda – mas existem alterações fiscais que podem ser neutras do ponto de vista da receita e ser, ao mesmo tempo, “amigas” da competitividade, da atractividade, do investimento e do crescimento económico (como esta que Obama propõe; ou a reforma fiscal que a Eslováquia levou a cabo em 2004).
Por exemplo, a Irlanda, no seu programa de ajustamento, fez ponto de honra em não mexer na sua “jóia da coroa”: a taxa de IRC de 12.5%. Subiram vários impostos, cortaram salários, pensões e outras prestações sociais, mas lá mexer no IRC… isso é que não!...
… Porque, segundo vários responsáveis políticos do país – e de partidos diferentes!... – aquela taxa de IRC é fundamental para continuar a atrair investimento e criar riqueza no país.
Repito a pergunta: e nós?... Quando iremos avançar deforma convicta, arrojada e marcante num tema e numa área onde os passos que desde há anos temos dado são… para trás?!...

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Não anda bem o governante...

... que explica que as gigantescas dívidas de empresas públicas não vão ser pagas pelos utentes nem assumidas pelas próprias empresas, mas pelo Estado. O Estado, neste caso, são os contribuintes como o governante bem sabe. Pensava eu que a socialização das consequências dos disparates cometidos era coisa do passado. E que as explicações demagógicas tiveram o seu tempo. Erro meu.

Ponto final nas águas...

Os Senhores Deputados não desistiram, continuam a discutir se bebem água da torneira ou água engarrafada, já vai para cima de dois anos. Volta e meia as águas vêm ao de cima. Em Novembro foi assim
Depois de muitos estudos e pareceres, eis que as últimas contas dizem que beber água da torneira fica mais caro que beber água mineral. A culpa é dos "custos de pessoal para o enchimento, limpeza, colocação e arrumo dos vasilhames” e dos custos com os jarros. Esperemos que este folhetim tenha acabado. Francamente, com o país em tão grandes dificuldades não há assuntos mais importantes e urgentes para tratar?

Post it ("06568")

Manhã de inverno, muito fria, iluminada por um sol basófias, demasiada luminosidade e pouco calor. Ligo o rádio, notícias do costume, exceto o leilão do molde dos dentes de Elvis Presley, cuja base de licitação é de doze mil dólares. Estou com curiosidade em saber até quanto irá subir. Licitadores não irão faltar e o desejado artefacto irá terminar numa sala qualquer tornando-se no ponto central de atenção e de orgulho do dono.

O que leva as pessoas a adquirirem determinados objetos? Falo daqueles que não são propriamente exemplos de obras de arte, caso do molde em questão, do lenho de Cristo que, a estas horas, deverá corresponder ao abate de uma floresta, ao cabelo de Napoleão, às cuecas da rainha Vitória, aos dentes de Santo António, às inúmeras relíquias de santos e santas que andam por aí e a tantas outras coisas que dispenso de enumerar. Estes objetos em si não valem grande coisa, adquirem valor porque materializam ideias, conceções, desejos, transferências, vontades de incorporar em si a importância absoluta ou relativa dos indivíduos ou proprietários. Parece que a memória de certos factos ou valores necessita de um substrato qualquer que desperte emoções ou recordações. O comprador do molde ainda poderá fazer dinheiro, cobrando aos adoradores de Elvis uma pequena quantia para verem o que esteve mergulhado na boca de um grande homem da música. Já estou a imaginar os ahs de espanto e de admiração.

Olhando para o que me rodeia, acabo por verificar que não sou muito diferente dos outros, também tenho algumas lembranças, não propriamente de interesse coletivo e "importantes" como as que acabei de referir, mas mais comezinhas, que me obrigam a refletir sobre o passado e sobre alguns acontecimentos, princípios ou valores. Pondo de parte as recordações familiares que acabarão por perder significado ou "valor" ao fim de algum tempo ou gerações, alguns artefactos desprovidos de efeito estético que andam lá por casa já me obrigaram a viajar no passado e a analisar determinados acontecimentos. No fundo transmitem ou despertam emoções e qualquer um de nós alimenta-se mais ou menos gulosamente delas.

Acabo de sentar-me na mesa de um café a que me habituei ir desde há algum tempo na minha deslocação semanal. Esta mesa seria naturalmente ocupada por uma figura típica que acabei por conhecer, um cauteleiro de idade avançada que fazia do estabelecimento o seu local de trabalho, fosse verão ou inverno. No verão estaria lá fora debaixo da palmeira a dormitar a sua sesta, no inverno resguardava-se do frio no interior. Comecei por estudá-lo, não sob o ponto de vista clínico, embora denotasse claudicação na marcha, mas, sobretudo, pela forma como se exprimia e comentava certos assuntos. Um dia atrevi-me a comprar-lhe uma cautela, eu, que por hábito não sou dado a jogos. O meu objetivo não estaria em ganhar qualquer prémio, mas sim em granjear a sua confiança para umas boas conversas, o homem era um filósofo de rua e eu queria aprender mais. Não é que logo à primeira ganhei um pequeno prémio? Setenta e cinco euros! Fiquei perplexo, pela primeira vez na vida ganhei qualquer coisa ao jogo, mas é tão raro jogar, pensei. Na semana seguinte, à hora do almoço entreguei-lhe a cautela. Agora só me falta mais uma. O indivíduo tinha tudo sob controle. Troquei a cautela por uma série delas até esgotar o "prémio". Nas semanas seguintes, graças a terminações e a minúsculos prémios ia trocando por outras ao mesmo tempo que começámos a sentar à mesma mesa. Se fosse o primeiro a chegar ao escritório era ele que se sentava na minha mesa, caso contrário era eu. Depressa verifiquei que a sua sabedoria extravasava o comum, é natural para quem trabalha na rua e é perspicaz. Críticas e análises judiciosas à situação, sentenças doutorais, e ainda por cima vindo de quem teve de abandonar a escola primária quando andava na terceira classe, para ganhar dinheiro a fim de comprar dois papos secos por dia, que era o que comia. Não sabia como se chamava nem tão pouco o senhor sabia o meu nome e o que é que eu fazia, mas gostava de conversar comigo. Da última troca de cautelas resultou que a única ficasse em branco. Ao fim deste tempo acabou por acontecer. Pensei, na próxima semana já não troco nada, tenho de voltar ao princípio e comprar-lhe outra, ele disse-me que um dia talvez me desse a taluda. Ri-me, claro, porque não confio no jogo, mas sempre era um pretexto para uma boa conversa e aprender qualquer coisa, porque aprende-se, e muito, com este tipo de pessoas.

No domingo, ao chegar a casa, vejo no jornal uma notícia sobre o falecimento de uma pessoa na cidade vizinha, através da fotografia vi que era o cauteleiro. Fiquei a saber o seu nome e que tinha falecido de morte súbita durante a madrugada na pensão onde vivia. Agora, na mesa onde estou a acabar de escrever este texto, que era a sua secretária, olho para o conjunto de cautelas que não foram premiadas, sobretudo para a última, última em todos os sentidos. Não deitei nenhuma fora. Guardei-as todas e vou continuar a guardá-las, porque me fazem despertar emoções, e eu preciso delas para sobreviver. Não são tão valiosas e importantes como o molde dos dentes de Elvis, mas são, também, um molde, um molde de vida e de pensar de alguém que tinha muito para ensinar. Um post it da existência, "06568".

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Depois queixem-se!...

Os serviços de imprensa do Conselho Europeu suspenderam o repórter de imagem da TVI que gravou a polémica conversa informal entre o ministro das Finanças português e alemão. Estranho era se tal não acontecesse, dadas as normas existentes e aceites para a captação de imagens.
Mais grave, todavia, foi o facto de a comunicação social ter amplamente difundido as imagens e o diálogo. Acontece que sabemos há muito que a comunicação social se rege por leis próprias e se louva em comportamentos que condena no comum dos cidadãos, como as escutas, no caso vertente. O que significa uma total conivência das hierarquias das redacções na ilegalidade.
Mas, ainda mais grave foi o aproveitamento que o Secretário-Geral do Partido Socialista insistiu em fazer do caso, utilizando uma ilegalidade para fazer política. Pior ainda, adulterando a conversa, entrando por um processo de intenções, lamentavelmente cada vez mais habitual na nossa política. E avalizando critérios jornalísticos ilegítimos. Depois queixem-se da comunicação social!...

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Nem tudo é mau...


Li hoje a notícia que no Vale de Chelas em Lisboa vai nascer uma horta urbana que será cultivada por trezentos hortelãos. Há uns dias atrás tinha lido que mais de vinte terrenos municipais abandonados da periferia de Évora vão ser divididos em talhões e transformados em hortas urbanas. Sinais dos tempos!
Um pouco por todo o país estão a nascer as hortas urbanas, terrenos outrora baldios, deitados ao abandono ou ao cultivo clandestino da terra, muitos deles destinados, mais trade ou mais cedo, ao “betão armado” ainda que para tal lhes fosse modificada a utilização através dos convenientes actos administrativos.
Num momento de grande austeridade, não é admissível o desperdício de recursos que bem aproveitados e geridos podem transformar-se em bens úteis para quem deles precisa. Estamos a assistir a uma nova consciência política e social. O aproveitamento ordenado e regulamentado da terra arável e saudável em hortas urbanas é um sinal de que as autoridades públicas percebem que através de uma intervenção ordenada e regulamentada viabilizam o acesso de centenas de pessoas a uma fonte de rendimento que na maioria dos casos lhes vai permitir ter um prato de sopa na mesa das suas casas. Mas para além do sentido económico, iniciativas como as hortas urbanas têm uma função social importante, na medida em que promovem a interacção social e comunitária, valorizam o trabalho e educam para a cidadania.  São um exemplo de como o público, o privado e o social  podem articuladamente contribuir para o desenvolvimento sustentável. Nem tudo é mau…

"Duas rosas vermelhas"


Acabei, ao fim de algum tempo, por saber que teve um passado fermentado pela luxúria, recheado pela aventura e afogado no álcool. Acabou tudo, os primeiros pelo efeito do tempo e o último por vontade própria. Depois começou a perder peso de uma forma assustadora, muitos quilos, tantos, que o homem, já de si perturbado, não sei se pela vivência ou devido à sua estrutura, ficou ainda muito pior. E eu comecei a ficar igualmente. Pus-me a vasculhar pelos meandros do seu corpo para saber onde estaria o gato, mas, por mais voltas que desse, não encontrava nada. Pus a hipótese de que a falta das calorias do tinto seria o responsável, aliada a qualquer perturbação de cariz metabólico não detetável ou a alguma depressão mascarada. Como continuava a emagrecer, joguei, em doses baixas, com o efeito secundário de um medicamento, e, para minha satisfação, deixou de perder peso, começando, lentamente, a engordar. Semana após semana era evidente a alegria do senhor. Eu é que comecei a ficar novamente inquieto porque os quilos começavam a ser demasiado visíveis, insuflando-o em todas as latitudes. Paralelamente a uma boa disposição, também crescente, comecei a conhecer um pouco do seu passado. E que passado! Sempre que tentava abordar alguma das suas aventuras, um sorriso estafado, a lembrar o gato Félix, iluminava-lhe o rosto de uma forma encantadora. Já reparei que aquela forma de rir é muito comum nalgumas pessoas, capaz de seduzir outras, de saias, para ser mais preciso.

Posteriormente fez-se acompanhar da mulher, também doente, para que a consultasse. Faladora nata, ia debitando os seus males, ao mesmo tempo que se "queixava" da vida que o marido lhe dava. E ele sempre calado com o tal sorriso a querer alargar-se nas costas da mulher, quando esta dava a entender algumas das suas marotices. Nesses momentos olhava-o, mas sem grandes sinais de incómodo, parecia que já se tinha habituado. Inicialmente não aprofundei em demasia o assunto, mas sempre ia dando alguma corda para outros momentos, ao mesmo tempo que ganhava a confiança da senhora para que pudesse cumprir a terapêutica e alguns conselhos indispensáveis ao seu bem-estar e saúde.

Com o tempo, quem começou a contar as aventuras do carteiro foi a mulher. Primeiro em França, onde espanholas, francesas, nicaraguanas, e sei lá que mais outras nacionalidades, foram alvo de venturas e algumas desventuras. "Mas o pior não foi em França, senhor doutor". Ai não! Não, foi aqui perto, quando começou a exercer as atividades de carteiro. Não foi tanto assim, dizia o marido, mas era visível que estava comprometido, o sorriso atraiçoava-o. E a mulher contava histórias, uma após outra, enquanto o carteiro, agora reformado, ouvi-a com nítida sensação de regozijo, mas sempre mudo. Então o carteiro entregava cartas e mais alguma coisa, disse-lhe. Pois, o carteiro toca sempre duas vezes, ripostou, embora ficasse com a nítida sensação de que nunca tinha lido a obra de Neruda, cantava-a de ouvido. Mas o senhor não tocava só duas vezes, chegava a tocar cinco ou mais. O sorriso floria-lhe com uma satisfação dos diabos.

Então, ele tem-se portado bem, tem andado satisfeito, perguntei à mulher. Sim, anda pois, passa o dia sem fazer nada, não me aborrece, estou tão admirada que nem quero acreditar, senhor doutor. É verdade! Sabe o que me aconteceu? Não, diga. Não é que ao fim de 43 anos de casada o meu marido ofereceu-me duas rosas vermelhas no dia dos namorados? Olhe que nunca me deu nada em toda a minha vida, isto é, exceto as minhas duas filhas, mas rosas senhor doutor, nem rosas nem nada! Olhei para o gabiru, sentado tranquilamente à minha frente, e o tal sorriso, safado, sedutor, iluminou-se como nunca. E ela, muito orgulhosa e feliz, a que não era alheio a compensação do seu estado clínico e, também, do seu marido, irradiava uma felicidade tão sentida que me tocou. Ambos estão bem, de corpo e sobretudo de alma...

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Ai, um Mário que não era Piegas!


Bom fim de semana.

Que seria do País...

... se não fossem as intervenções salvadoras deste que se assume?

METRO do Porto...e o direito de nos fazer a vida num inferno...

1.Segundo notícia hoje divulgada, o METRO do Porto terá apurado em 2011 uma receita de bilheteira de € 35,6 milhões, enquanto só os juros das dívidas ascenderam a € 136,6 milhões...
2.A confirmarem-se estes dados, isto quer dizer que as receitas cobrem apenas 26% dos juros suportados, ficando a descoberto 74% dos juros + os salários e respectivos encargos sociais + o consumo de energia + os custos de manutenção do equipamento + os fornecimentos e serviços de terceiro +, a limpeza dos edifícios + o consumo de água + as despesas com correios e telefones, etc, etc,etc...quem paga isto?!
3.Não consigo entender como se pode gerir uma empresa nestas condições, isto ultrapassa os limites da nossa compreensão, entrando numa esfera de absoluto delírio de acumulação de prejuízos, de dívidas, rumo a uma próxima estação, a da Implosão...
4.O grande problema é que, tal como o METRO do Porto, a generalidade das empresas de transporte público continuam a acumular prejuízos e dívidas, se não num nível de gravidade idêntico, certamente numa escala muito próxima...
5.Como se sabe, face às dificuldades (impossibilidade) de acesso a novo financiamento bancário por parte destas empresas, mesmo com o aval do Estado, já há meses que o Tesouro tem vindo a suportar directamente o pagamento da dívida financeira destas empresas, ficando a deter uma montanha de créditos sobre as mesmas...que jamais recuperará.
6.Assim sendo, são os impostos que todos os cidadãos pagam, sejam ou não utilizadores destes meios de transporte, que aguentam a sobrevivência destas empresas em condições de perfeita irracionalidade...
7.Todavia, com a persistência de situações deste tipo e a contínua acumulação de prejuízos e de dívida que dela resultará forçosamente, qualquer dia já nem os nossos impostos serão suficientes para tapar estes buracos gigantescos de exploração... e então não sei como será, a implosão destes sistemas de transporte tornar-se-á incontornável...
8.Perante um cenário tão desolador e tão irracional, espanta-me como os interesses organizados ainda lutam bravamente para manter estas situações aberrantes sem qq alteração, por exemplo promovendo greves a cada semana que passa, rejeitando toda e qualquer medida de racionalização, seja ao nível das empresas seja ao nível do sector...
9.E ainda chamam a isto defender “direitos adquiridos”, pelos quais lutam até à insanidade...eu chamar-lhes-ia antes o direito de nos tornar a vida num inferno, que é o que verdadeiramente estão defendendo...

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Ainda e sempre o reino da ilusão



Na pausa para almoço fui atraído pelo título da notícia: "Medidas de incentivo à natalidade em Portugal falham". Julguei tratar-se de um qualquer estudo, de uma avaliação das políticas de apoio à família e de combate ao flagelo demográfico que está aí, aos olhos de todos - o acelerado processo de envelhecimento da população portuguesa. Fiz um esforço para me recordar de uma medida assim, com esse propósito. Uma medida séria, que leve os jovens casais a apostar na famíla estruturada, com filhos, e não daquelas que só existem no discurso político. Esforço feito em vão, pois para além do quase insignificante efeito da existência de filhos na família para efeitos fiscais, não me veio à memória uma só. Das sérias, repito. Não das folcolóricas de que se faz este reino de ilusão. Pois só no reino de ilusão se pode discorrer sobre o falhanço de medidas que jamais existiram...

Pintor desconhecido

Tenho uma propensão para andar em velharias, mas não em antiquários, um hábito com muitos anos, com interrupções mais ou menos longas, dependendo da disponibilidade e sobretudo da existência ou não de comerciantes de coisas velhas. Gosto de chafurdar na poeira, lutar contra algumas teias de aranha e sujeitar-me a ataques de espirros, por vezes compensados com a aquisição de algo interessante. Não sou propriamente um indivíduo que goste de regatear, mas, neste tipo de negócio, paradoxalmente, sabe-me bem. Talvez tenha alguma razão de ser. Como é que se dá valor a coisas "sem utilidade"? Algum valor intrínseco, obviamente, ser ou não raro e sobretudo se é cobiçado ou não pelo comprador. Mas existe outro motivo, fazer conversa com o vendedor, criar empatia, estabelecer alguma relação, ou seja, fazer negócio à maneira dos judeus. Conversar, conversar e depois no fim negociar. É muito mais fácil.

Há cerca de dois anos descobri um velhustro. Na altura comecei por adquirir quadros de um autor desconhecido, tinham algo intrínseco, beleza, criatividade, sentido estético, em suma, arte. Indiscutível. Estavam perdidos, amontoados em cantos ou debaixo de velhos móveis, em sítios praticamente inacessíveis. O valor era ridículo, e mais ridículo era a minha tentativa em baixar o preço. Depressa concluí que não era o preço o que me preocupava mais. Queria saber quem era o artista, se era vivo, onde vivia, enfim conhecer um pouco sobre o autor. Nada. O comerciante desconhecia quem era o autor, limitou-se a dizer que alguém da terra lhe trouxe os quadros e uns desenhos. Quer vê-los? Abriu a gaveta de velha cómoda e retirou uma quantidade enorme de desenhos, de esboços, de estudos. Andei à procura de um ou outro que me agradasse mais e perguntei-lhe o preço. Calou-se, olhou-me durante uns instantes e depois disse, leve-os todos. Todos? Fiquei assustado com o valor que iria pedir por aquilo tudo. Deu-me a sensação de queria ver-se livre da papelada, cartões e folhas cheias de pó. São vinte e cinco euros. Engoli em seco, nem deu para regatear. A maioria estava assinada, A. Caseiro. A curiosidade levou-me a querer a conhecer o autor, mas não tive sorte. Contactos, mais contactos, telefonemas e nada. Foi por mera casualidade que através de um pintor conhecido fiquei a saber um pouco sobre o anónimo criativo. Tinham sido muito amigos em criança e na adolescência. Como seria de esperar um excêntrico, com vida atribulada e bastante sedutora, na sua expressão mais lata. Depois, ao longo do tempo, o meu amigo do velhustro, começou a guardar velhas pastas com desenhos que lhe iam chegando e que depois caíam-me nas mãos por preços crescentes, mas mesmo assim muito acessíveis.

O velho amigo, também pintor, mas consagrado, desconhecia o paradeiro de A. Caseiro e nem sabia se ainda vivia. A última notícia datava de há alguns anos, disseram-lhe que tinha sido internado numa casa de repouso por causa da cabeça.

Há tempos, ao consultar um Caseiro, perguntei-lhe se não conhecia um outro com o mesmo nome e que era ou tinha sido pintor. Ficou a pensar durante alguns segundos, disse-me que tinha um primo afastado que fazia desenhos, julgava que estava internado, mas não sabia onde. Vou tentar descobrir e depois digo-lhe. Passaram-se mais uns meses até aparecer com um papel na mão. Era a direção da casa de repouso onde estava o primo afastado. Agradeci-lhe e fiquei de ir à localidade saber como estaria o senhor, mas, atendendo à informação de que estaria "mal da cabeça", fui adiando, até hoje, quando surgiu uma oportunidade. Participei na parte da manhã num debate e aproveitei a tarde para descobrir o local. Não foi fácil. Cheguei, identifiquei-me e expliquei ao que ia. Sim senhor, está aqui na instituição. Entrei, sentei-me, fui tratado com muita delicadeza e esperei menos de dois minutos até aparecer de braço dado com o diretor, que me tinha avisado de que não via bem por causa de uma trombose que teve há nove anos. Um senhor muito simpático, sorriso encantador, não revelando sinais de deterioração mental, que era o que eu temia. Disse-lhe ao que vinha, que provavelmente tinha em minha posse a maior coleção de desenhos dele, além de quadros, e que lhe queria testemunhar o meu apreço e admiração pela sua obra. O homem ficou estupefacto, nem queria acreditar no que estava a ouvir, dizendo constantemente que estava muito feliz, muito contente, nem se lembrava da última vez que sentiu tanto prazer. A conversa desenrolou-se de uma forma suave, descrevendo-lhe as suas obras, algumas das quais conseguiu identificar Tentei conhecer algumas particularidades da sua vida, sem entrar em muitos detalhes, mas "obriguei-o" a prometer-me que um dia destes irá contar muitas coisas. Riu-se, dizendo que o faria com muito prazer. Prometi-lhe que na próxima visita lhe traria as minhas pastas para ver os seus desenhos. O pior é que eu não vejo. Não vê? Pode ver mal, mas ainda consegue ver alguma coisa. Confirmei a minha afirmação ao escrever num papel o meu nome e contactos, numa letra maior do que é habitual. Caseiro conseguiu ler, embora com alguma dificuldade.

O belíssimo sol de inverno, que lá fora aquecia e alumiava a tarde, invadiu dois corações, o do pintor e o meu.

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Mobilidade, um assunto sensível...

Li a notícia que o governo quer aprovar um regime de mobilidade geográfica que permita a transferência de funcionários, sem o seu acordo, para concelhos longe da área de residência. O objectivo é redistribuir os funcionários públicos de modo a racionalizar a afectação dos recursos, transferindo funcionários onde estão em excesso para onde fazem falta. Nada contra a necessidade de uma boa afectação dos recursos, humanos e outros. Todos sabemos da acumulação de políticas erradas neste campo e dos respectivos resultados.
Compreende-se a preocupação da racionalização da afectação dos recursos, da eficiência da sua gestão, da necessidade, em particular, de assegurar o funcionamento dos serviços que por falta de funcionários não funcionam, prejudicando a qualidade dos serviços às populações que deles supostamente deveriam beneficiar. É difícil não estar de acordo quanto a este ponto.
Já será mais difícil concordar que os funcionários recebam uma guia de marcha para se apresentarem num serviço público que os coloca a centenas de km de distância das suas residências de família. Não parece ser aceitável, quer de um ponto de vista económico quer de um ponto de vista familiar e social, que um trabalhador tenha que deixar a família e incorrer em custos adicionais, para os quais não terá, nem tem que ter, rendimento para lhes fazer face, em nome da racionalidade económica e orçamental pública nos termos em que é apresentada.
Basta pensar, por exemplo, num trabalhador(a) que tem mulher ou marido com emprego e/ou filhos a estudar no ensino superior e/ou a viver em casa própria para se perceber as dificuldades que enfrenta perante uma situação de mobilidade geográfica de centenas de km. Parecem óbvios os  prejuízos pessoais causados ao  trabalhador e à sua família que decorrem de uma situação deste tipo.
É pena que não se comece por assegurar essa racionalização entre serviços geograficamente próximos. Não há notícia que a este nível a racionalização esteja concluída. Por outro lado, a mobilidade para concelhos longe da residência não deixa de causar alguma perplexidade ao verificamos que ao mesmo tempo se assiste ao encerramento de serviços públicos e quebra de actividade económica nesses concelhos distantes, dando lugar ao fenómeno de desertificação a que temos vindo a assistir. Precisamos de políticas de desenvolvimento articuladas que estimulem o povoamento dos conselhos distantes, que lhes devolvam a vida que têm vindo a perder. A mobilidade geográfica em causa não está desligada desta realidade. Sem as compensações adequadas ou os incentivos próprios é difícil de a concretizar…

A Oposição endoidou!

O Estado perde mais com a abolição da tolerância de ponto no Carnaval, porque tem que pagar o subsídio de almoço aos funcionários, foi o mais inacreditável e extraordinário argumento que ouvi para contestar a medida governamental. Como se o argumento em si já não fosse verdadeiramente bestial, alguns sábios ainda detalharam outros custos suplementares, como ausência de colegas e consumos de água, luz, comunicações, segurança, etc, etc.

Seguindo tal elaborada teoria, ficamos então a saber que funcionário público é mero custo, nada produz, não traz qualquer proveito para ninguém. Assim, coisa a eliminar rapidamente.
Com tais amigos, sejam eles jornalistas, sindicalistas, economistas e políticos, bem podem os funcionários públicos venerar os maiores inimigos.

Enfim, tudo serve como arma de arremesso: a Oposição endoidou.

Não digamos que...não somos a Grécia!

1. Segundo notícia há poucas horas lida, um grupo de 30 destacadíssimas personalidades da nossa praça, que como poucos têm sofrido as agruras do “neo-liberalismo” dominante, resolveram lançar um público Manifesto, no qual apelam à solidariedade com a Grécia.
2.Nesse Manifesto, entre outros assuntos graves, é feito um apelo par a que deixemos de utilizar a expressão “Não somos a Grécia” que, no entender dos Manifestantes, constitui uma declaração viciada por falta de solidariedade para com os padecimentos dos gregos...
3. Creio que estas personalidades vítimas do “neo-liberalismo” – algumas das quais, de resto, tendo sido vítimas do celerado “fascismo”, entram assim numa segunda fase de vitimização – estão cheias de razão no que toca ao (não) uso da expressão “Não somos a Grécia”.
4. Como sustentei em Post aqui editado em 28 de Janeiro último, intitulado “Porque não pomos os olhos (e falamos) da Irlanda em vez de falarmos da Grécia”, não temos qualquer interesse em andar para aí a dizer (já reparei que agora se diz menos, talvez tenham começado a perceber o equívoco) que não somos a Grécia, que somos doutra divisão, etc...
5.Sempre tive a noção de que a repetição dessa estafada teoria, em vez de nos afastar da Grécia aos olhos de terceiros, acabava por nos atrair para a órbita infernal da crise helénica – como vimos no último Post que aqui editei, W. Munchau, conhecido articulista do F. Times, embora de uma forma não explicada, advoga mesmo a arrumação de Portugal e da Grécia no mesmo “basket” , ou seja no “basket” da insolvência do Estado...
6.Será preferível, em vez de nos tentarmos distanciar da Grécia – com um resultado exactamente oposto - procurar estabelecer a comparação em relação à Irlanda, reconhecendo, sem complexos, que os irlandeses, apesar de terem sido como nós sujeitos a uma operação de resgate financeiro, conseguiram até agora fazer bem melhor...
7. ...mas que nós estamos a fazer tudo o que é necessário para seguir as pisadas da Irlanda, e que lá chegaremos se Deus nos der vida e saúde...
8.Assim, a minha adesão ao Manifesto das 30 personalidades é limitada a este ponto – que me parece aliás muito relevante – não podendo subscrever a parte do Manifesto onde são invocadas razões de solidariedade europeísta e internacionalista em “defesa” da Grécia, com as habituais “bicadas” à Alemanha e seus comparsas creio, pela mesma razão que ouvi há dias M. Carreira: “A Snra. Merkel é muito mais realista que esses papagaios que para aí andam...”.