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terça-feira, 7 de janeiro de 2014

A dupla face dos perdões fiscais...

Foi considerada pelo governo um êxito a operação de regularização de dívidas ao Fisco e à Segurança Social. Uma operação que permitiu aos contribuintes regularizar dívidas beneficiando de isenção de juros, custas administrativas e redução de coimas.
Leio nos jornais que este foi o maior e mais bem sucedido regime de regularizações de dívidas alguma vez ocorrido em Portugal. O objectivo inicial fixado pelo governo de fazer entrar nos cofres do Estado 700 milhões de euros foi largamente superado, ascendendo a 1,2 mil milhões de euros, cerca de 0,7% do PIB.
Sem estas receitas extraordinárias a meta orçamental de 2013 não seria atingida. Assim sendo, parece que ambas as partes envolvidas ganharam. Mas não será bem assim, nem tudo é um mar de rosas. O recurso a estas operações de regularização de dívidas motivado pela necessidade de fazer face à redução pontual de défices orçamentais é paradoxal. Por causa das dívidas os défices crescem, mas por causa delas os défices reduzem-se! O recurso a estas regularizações carimbadas de extraordinárias não está isenta de problemas e de riscos perversos. Uma coisa é certa: só é perdoado quem tem dívidas.
Os contribuintes faltosos financiam-se a custos económicos e financeiros mais baixos quando comparados com os custos suportados pelos contribuintes cumpridores. Uma situação geradora de iniquidades e concorrência desleal na economia, com mais custos financeiros para os contribuintes e que coloca em dúvida a própria eficácia da máquina fiscal que, diga-se em abono da verdade, muito progrediu nos últimos anos.
Um ponto merece reflexão: o perdão fiscal ajuda a uma cultura de cumprimento de obrigações fiscais ou, pelo contrário, alimenta a tolerância colectiva com a fuga aos impostos? E a seguinte pergunta merece também atenção: o que deve ser feito para que os contribuintes liquidem as suas obrigações fiscais dentro dos prazos normais e não em momentos especiais quando o Estado está com a "corda na garganta"? Elevada carga fiscal, dificuldades económicas e financeiras, complexidade do sistema tributário, ineficiência do sistema judicial são respostas possíveis...

9 comentários:

António Barreto disse...

Perceção de justiça e reconhecimento de retorno relevante correspondente por parte do contribuinte.

Luis Moreira disse...

É, claro, que quem tem dinheiro e deve muito espera por estas medidas.

Unknown disse...

Uma boa pergunta.
Lamento não saber a resposta.
Sei apenas dizer que cada dia as injustiças são maiores e há sempre os que se aproveitam para viver das falcatruas...

Unknown disse...

Quando o estado está com a corda na garganta -espero que não passe a ser a normalidade e acabe o regabofe abrilista. Vamos discutir com ideias frescas as eleiçoes para o parlamento (europeu) de modo a que tenhamos regras mais adaptadas e no fim os responsaveis nacionais não venham com desculpas como agora com a UE ou então que não tenham a possibilidade de fazer o que fizeram com o defice.

Joao Jardine disse...

Cara MCAguiar

O pagamento dos impostos não é um dever moral como se pretende em Portugal, fazer crer.
Por isso, o contribuinte está no seu direito (e dever) em fazer tudo ao seu alcançe para, pela via legal, pagar o mínimo e ao Estado compete-lhe cobrar o máximo.
Os nossos vizinhos usam esta "técnica" de "perdão" fiscal(na prática reduz-se a perdoar as coimas por não pagamento atempado) com regularidade e com elevada eficácia.
Como não desejo alcançar um mundo virtuoso, haverá que viver com esta "desigualdade".
O país com menos fuga fisco é os EUA não porque sejam "virtuosos" mas porque têm uma máquina tributária eficaz. Não creio que o modo de actuação do IRS (americano) pudesse ser replicado em Portugal ou na Europa.
A medida do governo, como se viu teve êxito e, espero, que a repitam dentro de mais ou menos cinco anos (é sempre melhor do que deixar prescever +/- um bilião de impostos devidos e não pagos, como tem sucedido de há uns anos a esta parte).
Cumprimentos
joão

Tonibler disse...

A máquina fiscal é um corpo estranho no ambiente económico e o facto de funcionar ao nível dos estados gera estas situações. Deveriam ter sido fechados os contribuintes faltosos e sido eliminados os postos de trabalho? Dito desta forma ninguém responde que sim. Mas o ponto do financiamento também é relevante em termos de competitividade e ninguém responde que não nessa perspectiva. E se as duas respostas estão certas, então é a "pergunta" que está errada. Os impostos estão a ser colectados em níveis errados do estado e o problema de agregação gera o paradoxo.

Anónimo disse...

Deixando de lado as questões relacionadas com a moralidade dos impostos, o seu valor, etc, etc, não posso deixar de lamentar que o Estado consiga chegar a um tal ponto de pobreza que tenha que recorrr repetidamente a soluções imorais como esta o é. Independentemente de concordar-se com o valor dos impostos, com as coimas por atraso, com tudo isso, o facto é que a lei é a que é. É imoral que por causa da necessidade extrema chegue-se ao ponto de entre os dias A e B suspender-se a lei. É injusto para os que pagaram atempadamente e é injusto para os que pagaram antes do dia A e sofreram as penalizações aplicaveis ao seu atraso.

João Jardine, permita-me uma achega. O que enuncia na segunda frase do seu post, algo com o que concordo plenissimamente e uso tanto quanto possivel, foi expresso numa sentença do Supremo dos Estados Unidos em finais dos 1990s. O cidadão tem não apenas o direito como também o dever de usar a máxima extensão da lei em seu benefício.

Suzana Toscano disse...

Ē certo que, em teoria, este recurso à "suspensão" da lei é injusto e arbitrário porque vem permitir que faltosos regularizem as dívidas em condições de que não puderam beneficiar muitos dos que pagaram, incluindo o prazo. Mas se há necessidades de receita então é preferível isto a inventar taxas, contribuições e reduções de rendimento a quem já pagou tudo o que tinha a pagar, usando argumento de pseudo justiça e equidades que deixam muito a desejar e criam graves injustiças relativas entre rendimentos do mesmo nível. Mas por mal, prefiro estas repescagens, pelo menos são cegas, imprevisíveis e só pagam os que já tinham obrigação de pagar.

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caros Comentadores
Perdões fiscais, prescrições de dívidas ou “totolotos” fiscais não ajudam à moralização do sistema, no sentido de que, independentemente da maior ou menor carga fiscal, as obrigações fiscais devem ser cumpridas por todos os contribuintes e a dignidade do Estado é um valor que deve ser valorizado e preservado.