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terça-feira, 17 de março de 2015

Reforma das pensões: a base alargada de representação social que faz falta...

Ouvi há pouco uma parte da entrevista dada pelo Senhor Subir Lall do FMI à SIC Notícias. À pergunta sobre a necessidade de Portugal fazer uma reforma do sistema de pensões referiu que vai levar tempo, apontou para a necessidade de um consenso político que respeite, por sua vez, os argumentos do Tribunal Constitucional nos chumbos às propostas de lei apresentadas pelo governo. Completamente de acordo.
A reforma do sistema público de pensões é um tema incontornável. Não é uma criação da crise. A crise é que ajudou a mostrar a sua necessidade. Sem dúvida que uma reforma do sistema de pensões requer uma base alargada de representação social que não será encontrada se o assunto não for realmente debatido, se não houver coragem e vontade dos partidos do arco da governação. Só um debate esclarecido e verdadeiro permitirá alguma convergência na decisão política sobre as mudanças que são necessárias fazer. 
O sistema público de pensões perdeu a confiança da população. As sucessivas alterações das regras de formação das pensões e de acesso à reforma e os cortes avulsos realizados nos últimos anos alimentaram a perda de confiança. A desinformação que está instalada também ajuda.
A questão da sustentabilidade financeira entrou na agenda política há muitos anos, com a tomada, ao longo do tempo, de decisões políticas de natureza restritiva que visaram resolver desequilíbrios financeiros, em especial os de mais curto prazo. Mas enquanto a questão financeira teve um papel activo nas políticas públicas das pensões, já os temas da adequação e da equidade não foram, e mal, colocados no mesmo plano, notando-se uma primazia daquele sobre estes. Não tinha que ser assim. Os três objectivos não são incompatíveis, pelo contrário, devem estar presentes na procura de caminhos e soluções que sejam capazes de compatibilizar todos os planos em jogo. 
Com o passar do tempo, avolumaram-se as dificuldades dessa compatibilização, o que só vem dar razão à necessidade imperiosa de encontrar compromissos políticos e sociais duradouros. Fazê-lo sem esta ideia de compromisso é uma fonte de tensões que em nada contribui para encontrar soluções que gozem da representação alargada da sociedade.
Esperemos que os partidos do arco da governação estejam a estudar este assunto e que apresentem propostas concretas nos seus programas que forneçam alternativas bem fundamentadas que as pessoas compreendam e que realmente contribuam para fazermos as mudanças necessárias em lugar de insistirmos no caminho que nos trouxe até aqui…

6 comentários:

Carlos Sério disse...

Como podemos assistir à alegação, superficial e "tremendista" de que "não há dinheiro" para as pensões da CGA, se foi o próprio Estado a esquivar-se a pôr na CGA a sua contribuição como entidade patronal, durante anos e anos, poupando aí cerca de 16 mil milhões de euros, pelas contas que se podem inferir dos relatórios da própria CGA, entre 1997 e 2012, em 16 anos?
E que dizer do facto de os dinheiros da Segurança Social (que não pertencem ao Estado) terem sido utilizados para jogo na Bolsa ou para dar de garantia da dívida soberana, conforme portaria de Vítor Gaspar de 29/07/2013? Diz quem já fez contas (e são todos personalidades com provas dadas) que se está a falar de um desfalque de cerca de 100 mil milhões de euros.
De modo que, para começo da conversa, o governo deveria - mas não lhe dá jeito - reconstituir os fundos que financiavam o pagamento das pensões, antes de recorrer à CES, punindo quem não é culpado dos desmandos.
Sim, se não houver reforma da Segurança Social - e também apoio que seja feita gradualmente -, o sistema de pagamento de pensões irá rebentar um dia destes.
Mas o que me preocupa também é que se andem a atirar pedras, escondendo a mão, convocando os mais novos, ameaçados pelo colapso, para se rebelarem contra o sistema intergeracional das pensões, consagrado na Constituição, "vendendo" raciocínios para convencerem ingénuos de que tudo está em cortar aos actuais pensionistas para "melhorar" as coisas.
Não. Vamos, todos juntos, lutar para que o Estado assuma a responsabilidade do que fez ou não fez, recapitalizando o que descapitalizou e continua a descapitalizar.
Continua, sim, como, por exemplo, quando aumenta de 485 para 505 euros o montante do salário mínimo e põe as receitas da Segurança Social a pagar às entidades patronais a TOTALIDADE da contribuição patronal, se contratarem pessoas por 505 euros. Eloquente.
Neste debate, há muita Matemática e Aritmética, é verdade, mas há também muita informação que está sonegada ao grande público.
Recomendo que se leia os acórdãos do TC mais recentes sobre a convergência de pensões da CGA (19/12/2013), chumbada para as pensões já atribuídas, e sobre a contribuição de sustentabilidade (14/8/2014), chumbada por 10 votos contra e 3 a favor, quanto à "reforma" das pensões com cortes pequeninos, a crescerem ao sabor da tão propalada falta de dinheiro, logo que o governo quisesse...
Numa reforma devemos, se quisermos ser consequentes, falar, primeiro, das causas, em especial, da descapitalização colossal promovida pelo próprio Estado, e, depois, mas só então, abordar o que deve ser feito para tornar mais sustentável e menos arriscado o pagamento de pensões.
Torres da Silva


Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Carlos Sério
Agradeço os seus comentários. Aqui ficam mais umas notas sobre o tema.
As causas da insustentabilidade financeira do sistema público de pensões radicam essencialmente na alteração das variáveis demográficas e económicas, sem esquecer que muitas das medidas introduzidas nas últimas duas décadas pecaram por tardias. Sem sustentabilidade financeira não há como assegurar a equidade entre gerações. Este é um ponto constantemente remetido para segundo plano. Mal, a meu ver, porque põe em causa o contrato social.
O não cumprimento pelo Estado das suas obrigações contributivas para com a CGA, que vem de longe,ou a utilização do FEFSS para apoiar a gestão da dívida pública e as tentações que volta e meia surgem para financiar créditos incobráveis à habitação ou, ainda, o financiamento de prestações sociais do regime não contributivo, durante muitos anos, com receitas do regime contributivo da Segurança Social são más práticas políticas a que acresce a falta de um escrutínio institucional e público de qualidade. São erros, sim, mas que não alteram o rumo da demografia e da economia. É importante que se fale dos erros e que Retiremos as devidas consequências.
Não é com cortes e medidas avulsas, nem prosseguindo um caminho de ajustamentos paramétricos que vamos resolver os problemas. Um sistema de pensões não tem que ser um fardo social e financeiro, pode e deve ser um sistema que promova a contributividade, o mercado de trabalho, o desenvolvimento do capital humano, a poupança, entre outros, ou seja, deve ter efeitos positivos na economia. E deve, sobretudo, assegurar a equidade entre gerações, isto é, a repartição equitativa dos custos e dos benefícios entre gerações. Funções que o actual sistema público de pensões há muito que deixou de cumprir.
Que não haja dúvidas que o actual sistema público de pensões (CGA + Segurança Social) tem uma dívida implícita que não teremos condições para financiar com mais emissão dívida pública, como se tem vindo a verificar. Aumentamos impostos? Cortamos nas pensões? Vamos continuar a prometer o que não podemos pagar? O assunto requer como escrevi no meu texto um debate sério e realista.

Jorge Oliveira disse...

Se a Dra Margarida Correa de Aguiar me permite gostava de lhe colocar uma questão muito específica.

Considere um cidadão que iniciou a sua carreira profissional trabalhando para o Estado, descontando, portanto, para a CGA. Alguns anos depois foi para o sector privado e passou a descontar para a Seg. Social. A poucos anos de entrar na reforma deixa a empresa privada e é contratado pela Caixa Geral de Depósitos. Deve a CGD enviar os descontos para a Seg. Social ou para a CGA ?

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

Caro Jorge Oliveira
A resposta à sua questão não é simples, depende de um conjunto de dados, designadamente data em que a pessoa ingressou na função pública e data de saída para o sector privado e em que regime (rescisão, suspensão com licença sem vencimento), em que data ingressou na CGD ( antes ou após 2016), qual o tempo de descontos e em que período, etc.
De facto, temos um tal novelo de regimes e alterações que são as próprias entidades púbicas que têm dificuldade em responder. Quanto ao cidadão comum nem se fala!
Cumprimentos.

JM Ferreira de Almeida disse...

Temo, Margarida, que os partidos do arco estejam neste momento mais preocupados em descobrir como se impede de falar do assunto...

Margarida Corrêa de Aguiar disse...

José Mário
Pois! Vontade não lhes falta...